A história repete-se. O PSD insiste no argumento de que “sem Orçamento [na verdade continua em vigor o atual, depois do chumbo da proposta na semana passada] todas as obras vão parar” e avisa para “graves consequências para a vida de todos os madeirenses e porto-santenses”, incluindo, por exemplo, “a atualização do complemento para os idosos”. Os avisos surgem na antecâmara da votação desta terça-feira, no parlamento Regional, de uma moção de censura apresentada pelo Chega e que, salvo uma surpresa de última hora, deverá fazer cair o Governo liderado por Miguel Albuquerque..Victor Freitas, anterior líder parlamentar do PS-M, contrariando a tese repetida por Miguel Albuquerque, pergunta, então, entre outros exemplos, como é que “em 2024 gastou mais 158,6 milhões de euros sem Orçamento que em 2023, com Orçamento?” - argumento também usado por Paulo Cafôfo, presidente dos socialistas da Madeira, que acusa Albuquerque de usar de “chantagem” de forma “inadmissível e desprezível” para se “manter no poleiro”. .Nuno Morna, deputado da IL, que sobre os argumentos do líder social-democrata madeirense usa esta frase: “É mentira e quem o diz é mentiroso”, e “relembra” a Lei de Execução Orçamental, em particular, o art.º 58. No ponto 4, está especificado que “a execução mensal dos programas em curso não pode exceder o duodécimo da despesa total da missão de base orgânica”, mas logo de seguida é estabelecido: “Com exceção das despesas referentes a prestações sociais devidas a beneficiários dos sistemas de proteção social, a direitos dos trabalhadores, a aplicações financeiras e encargos da dívida, a despesas associadas à execução de fundos europeus, bem como a despesas destinadas ao pagamento de compromissos já assumidos e autorizados relativos a projetos de investimento não cofinanciados ou a despesas associadas a outros compromissos assumidos cujo perfil de pagamento não seja compatível com o regime duodecimal”. .Em relação ao PRR, o antigo ministro das Finanças, João Leão, que definiu o enquadramento financeiro do Plano de Recuperação e Resiliência, já garantiu, por diversas vezes, que “um orçamento por duodécimos não coloca em causa a execução do PRR” e que até estão previstos “instrumentos que preveem que os orçamentos dos projetos possam ser alterados sem necessidade de uma autorização, de uma aprovação de um novo Orçamento”. .Élvio Sousa, líder parlamentar do JPP, já recordou que “ainda este ano estivemos, por decisão de Albuquerque, quase oito meses sem Orçamento [devido à queda do executivo e à realização de eleições antecipadas] e a economia regional continuou a crescer”. Ou seja, diz, “não é a catástrofe e a desgraça que Albuquerque anda a semear”. E o JPP também vota a favor da queda do Governo PSD/CDS por “falta confiança e credibilidade na gestão financeira da Região ensombrada pelos casos de corrupção”, disse ao DN Élvio Sousa. .Miguel Albuquerque, no entanto, insiste na narrativa contrária argumentando que o Orçamento Regional, chumbado na passada segunda-feira, “contemplava todo um conjunto de obras, (…) atualizações salariais, mobilidade de carreiras” e até, diz, a construção do novo hospital da Madeira que “no próximo ano vai parar”. Outro cenário que se repete é o das suspeições. Nas últimas Regionais havia um arguido “por suspeitas de corrupção, abuso de poder e prevaricação”: Miguel Albuquerque. Agora, há cinco. Ao presidente do Governo Regional juntaram-se os secretários regionais das Finanças, Rogério Gouveia; Saúde e Proteção Civil, Pedro Ramos; Equipamentos e Infraestruturas, Pedro Fino - constituídos arguidos por suspeitas de criminalidade económica e financeira -; e ainda o secretário da Economia, Turismo e Cultura, Eduardo Jesus..Ao DN, Albuquerque já garantiu que sendo aprovada esta terça-feira a moção de censura será “naturalmente” candidato a novo mandato e até a líder do PSD se houver eleições internas. .No PSD, apurou o DN, há “várias movimentações” para que Miguel Albuquerque seja “afastado” e nomes como Manuel António Correia, antigo secretário Regional, Pedro Coelho, atual deputado no parlamento, e Jorge Carvalho, secretário Regional da Educação, estão em cima da mesa. .José Manuel Rodrigues já disse, em declarações ao DN, que o Representante da República “deve encarar a hipótese de encontrar um outro presidente do Governo que ofereça uma maioria de 24 deputados”. Apesar disso, nos últimos dias, o líder do CDS (e parceiro do PSD na governação) tem pedido ao Chega que “retire a moção de censura” e “possibilite a aprovação rápida de um Orçamento para 2025”..José Manuel Rodrigues “apela mais uma vez ao sentido de Estado de todas as forças políticas e, em particular, do Chega que apresentou a moção de censura”..Miguel Castro, líder do Chega Madeira, garante ao DN que “só se Albuquerque e os secretários visados saírem do Governo” é que pondera a possibilidade de retirar a moção de censura. .Paulo Cafôfo, que falhou a tentativa de uma “convergência” pré-eleitoral com JPP, BE, PAN e IL [todos recusaram o convite] e que à semelhança de Albuquerque também enfrenta adversários internos, assegura o voto “favorável” para a queda do Governo argumentado que o líder do PSD- M “é um empecilho para a Madeira” que “está agarrado ao poder porque não quer responder à Justiça e quer estar com a garantia da imunidade enquanto estiver no Conselho de Estado”. Ao DN, Cafôfo acrescenta ainda que “um presidente do Governo que garantiu estabilidade e governabilidade e não cumpriu e os casos de Justiça que o implicam (está indiciado em 8 crimes, entre os quais corrupção ativa e passiva, além de mais de metade dos membros do governo estarem constituídos como arguidos)” são razões essenciais para o voto socialista..Internamente, Paulo Cafôfo, para além da oposição do grupo de Carlos Pereira (ex-líder) - que o desafiou para eleições primárias - e de Miguel Gouveia (vereador na câmara do Funchal), tem criado, apurou o DN, “desconfortos sérios” junto de “muitas” das atuais estruturas do partido. A “falta de estratégia”, “erros” como os do convite público a JPP, BE, PAN e IL ou o “adiamento” da moção de censura para depois da votação do orçamento, como pretendia o PSD, são apontados, entre outros, como exemplos de “fragilidades”. .A questão dos “crimes” é também razão invocada por Mónica Freitas, do PAN, que sublinha que “não temos só o Presidente do Governo constituído arguido como temos 4 dos 7 secretários envolvidos em processos de corrupção”. “Não é benéfico andarmos sempre em eleições mas também não podemos continuar a permitir que não haja responsabilização política pelos atos”, acrescenta. .Gonçalo Camelo, coordenador da IL, que também confirma o voto para a queda de Albuquerque, explica que “um Governo com cinco arguidos, incluindo o respetivo presidente, é um embaraço para a democracia e autonomia (…) algo intolerável numa sociedade, numa democracia ocidental”.