De protetores auditivos e óculos de proteção colocados, Paulo Costa, intendente que dirige o Departamento de Armas e Explosivos (DAE) da Polícia de Segurança Pública (PSP), dispara para um túnel que, à partida, parece não ter saída. Mas, no extremo oposto ao disparo, há uma ligeira abertura por onde caem os projéteis para dentro de uma caixa, colocada no chão. O objetivo é colecionar as balas e cartuchos para que sejam feitas peritagens no laboratório de balística, uns pisos acima da zona de tiro em que nos encontramos..Este é apenas um dos passos que o DAE faz ao longo de um processo. Quando é recolhido um projétil após um crime, por exemplo, a arma é apreendida e acaba por vir parar aqui. A PSP efetua, então, quatro tiros de teste. Os dois melhores projéteis são colecionados e colocados num sistema, o Ibis, que faz leituras em três dimensões e que, além de dados nacionais, está em coordenação com as bases de dados das autoridades estrangeiras, como a Interpol..“Cada arma tem uma maneira específica de marcar as balas, quando dispara. O Ibis mostra-as e, depois, outro software estabelece correlações entre os projéteis”, explica Paulo Costa..Só este ano já foram feitas 2139 perícias a armas, “no âmbito de atividade contraordenacional e administrativa”. O que significa que os valores estão praticamente no mesmo patamar de todo o ano passado, em que se realizaram 2157 exames a armas. “Há claramente um aumento. Sendo este número de um ano ainda em curso, é até natural que seja ultrapassado”. E prova disso é que “em rastreios no Ibis foram inseridas 307 balas este ano e, em todo o ano passado, 243”..Os invólucros inspecionados também já passaram os valores de há um ano: 649 em 2024, mais 114 do que em todo o ano de 2023 (onde foram inspecionados 535). Resumindo: “Estamos com um aumento claro, os números estão em sentido ascendente.”.A subir está, também, o número de armas apreendidas - que o podem ser por diferentes razões, desde a utilização em crimes à posse sem porte de arma, por exemplo. Desde 2020, a tendência tem sido essa. No ano passado, esse valor atingiu as 5268 - mais 105 do que as 5163 do ano anterior. Em relação a 2020 isto representa um aumento de 392 armas apreendidas num só ano. A única exceção é o ano de 2021, ainda em período pandémico, levou a um ligeiro decréscimo (4360)..Ainda sem números definitivos para 2024, a tendência, estima Paulo Costa, é para que este aumento continue. No entanto, as detenções por posse de arma branca são mais comuns. Segundo os dados da PSP, houve, em 2023, 240 detenções por posse de arma branca, bem longe das 89 por armas de fogo. Alargando a análise até 2020, os números vincam essa diferença: desde esse ano, houve 477 detenções por armas de fogo e 839 por posse de arma branca. Estes dados, diz Paulo Costa, podem explicar-se pela facilidade em esconder estes objetos..No DAE, a conversa com o DN acontece junto a um carrinho de supermercado. Em vez de compras tem, isso sim, armas de maior calibre, como metralhadoras. O trabalho no departamento não para. Um dos agentes vai buscar uma pequena pistola, que desmonta e analisa. O objetivo é ver o número de série da arma. Essa função é, também, uma parte importante daquilo que aqui se faz. Verificar estes números serve para, por exemplo, certificar as armas ou para averiguar se podem ter sido utilizadas em crimes..“Se o número foi apagado de forma propositada, há todo um trabalho a fazer, utilizando ácidos próprios que acabam por revelar alguns dígitos, que se fotografam e registam”, explica o agente. Depois da primeira aplicação de ácidos, o processo repete-se e, se os números iniciais desaparecerem, já há um registo prévio, que pode ser acrescentado aos novos..Impressoras 3D: uma preocupação.Subindo da carreira de tiro e regressando à sala onde funciona o laboratório de balística, Paulo Costa explica que há, agora, uma nova preocupação: as armas feitas em impressoras 3D. “Não se sabe qual é o tipo de código que foi utilizado para produzir aquela arma. Não se sabem quais as intenções de quem criou aquilo e se vai, ou não, disparar em condições de segurança.” Este tipo de armas, realça o intendente, “podem virar-se contra quem as utiliza. Podem, por exemplo, explodir nas mãos da pessoa”. Essa prevenção é, também, parte do trabalho do DAE..Outra componente feita no departamento é a desativação de armas. “Esse trabalho de sensibilização é importante. Há que dizer às pessoas que, depois da vida útil, sobretudo das armas de fogo, as pessoas podem entregá-las aqui. É uma forma segura de garantir que a arma, além de ficar realmente inativada, acaba por não entrar em circuitos paralelos, que possam ter usos menos legais”, acrescenta Paulo Costa. No entanto, as entregas voluntárias têm diminuído: em 2023 houve 9340 armas deixadas na PSP pelos proprietários. Em 2020, houve 23 251. Desde aí, foi sempre a decrescer..Paulo Costa realça outro dado: a utilização de armas em contexto de violência doméstica. Houve, em 2023, 532 casos de violência doméstica reportados à PSP que envolveram armas. Número mais alto só em 2020, ano de pandemia, quando se registaram 653. E aqui, é possível ver que em 268 dos 532 casos foram utilizadas armas de fogo, uma tendência crescente. Em 144, utilizaram-se armas brancas.