A Encefalomielite Miálgica (EM), também conhecida como Síndrome da Fadiga Crónica (SFC), é uma doença invisível que faz com que que as atividades mais simples do dia a dia, como ir trabalhar ou subir umas escadas, se tornem num fardo. O covid longo tem sintomas semelhantes a esta síndrome e o seu surgimento pode trazer um novo fôlego para investigação. Nuno Sepúlveda é epidemiologista e professor na Universidade Técnica de Varsóvia e no Centro de Estatística e Aplicações da Universidade de Lisboa, e foi durante o pós-doutoramento que conheceu um grupo que se dedicava ao estudo da Encefalomielite Miálgica..A Síndrome da Fadiga Crónica não tem uma causa conhecida e não é detetável em exames laboratoriais e de diagnóstico e, por isso, o diagnóstico é feito por exclusão de outras doenças com sintomas semelhantes. “O que é mais característico nesta síndrome é que as pessoas são intolerantes ao esforço, tanto físico como mental. Atividades que são rotineiras como subir umas escadas, ler um livro ou estar numa reunião de trabalho passam a ser muito complicadas para estas pessoas”, diz ao DN Nuno Sepúlveda, que esteve recentemente em Lisboa para a primeira conferência internacional sobre covid longo..Segundo a Myos, a Associação Nacional contra a Fibromialgia e Fadiga Crónica, os sintomas da Encefalomielite Miálgica/Síndrome da Fadiga Crónica variam de pessoa para pessoa e, na mesma pessoa, variam de intensidade ao longo do tempo. Os principais sintomas são fadiga, mal-estar pós-esforço problemas cognitivos e de memória, gânglios linfáticos dolorosos e dor de garganta, dificuldade em estar de pé ou sentado, mesmo que por pequenos períodos de tempo, dor de cabeça, dor muscular ou articular, sono não-reparador ou hipersensibilidade..Outros sintomas podem incluir dificuldade em engolir, febre baixa, distúrbios intestinais, ansiedade e depressão, alergias, tremores e suores noturnos. Nesta síndrome, a fadiga varia e, segundo o epidemiologista, este acaba por se tornar num dos grandes problemas. “Na Síndrome de Fadiga Crónica, as pessoas sentem-se com energia, sentem que o cansaço passou, passam a querer ter uma vida normal e aí têm o chamado crash.”.Após esta quebra, a pessoa volta a ter níveis de energia muito baixos e tem de voltar para casa. “Isto causa um problema de dinâmica, principalmente em termos profissionais, em que as pessoas regressam ao trabalho passado um tempo de baixa e quando regressam a casa estão novamente de rastos. E isto passa a ser um ciclo vicioso. O que acontece é que, depois, as próprias empresas têm dificuldade em manter essas pessoas nos quadros.”.Como se relacionam a SFC e o covid longo?.Pessoas que são e foram infetadas pelo SARS-CoV-2 afirmam que continuam com alguns sintomas semanas após a infeção, incluindo fadiga, falta de ar, cansaço excessivo para esforços ou alterações cognitivas ou do sono. Estes sintomas têm depois um forte impacto na forma como conseguem viver a sua vida, tal como com a Síndrome da Fadiga Crónica..A SFC pode ser provocada por infeções virais ou bacterianas e o covid longo surge também após uma infeção, neste caso por SARS-CoV-2. “Em ambos os casos, à partida, o organismo resolveu a infeção, mas as pessoas continuam a sofrer os sintomas. Em termos de mecanismo da doença em si, poderá em parte estar relacionado com as doenças autoimunes. Ou seja, o covid longo e o SFC têm uma componente em que o sistema imunitário está extremamente ativo, provocado por uma resposta que primeiro foi para o agente infeccioso e que depois passou para as componentes do nosso próprio corpo, tornando-se num ciclo crónico persistente nesse aspeto”, explica o professor..Atualmente não existe um tratamento para estas condições pelo facto de os sintomas variarem de pessoa para pessoa. “O que a comunidade médica faz é mais ou menos gestão de sintomas. Atualmente está a fazer-se investigação de ponta para verificar se medicamentos que são mais indicados para cancro ou doenças autoimunes, podem ser aplicados neste contexto. Mas ainda estamos em fase de testes.”.O epidemiologista considera que o desconhecimento de critérios de diagnóstico faz com que as pessoas que surjam com estes sintomas possam ter diagnósticos errados..Nuno Sepúlveda considera que a preocupação da comunidade médica e científica com o covid longo trouxe mais reflexão sobre o SFC..“A Síndrome de Fadiga Crónica surgiu muitas vezes em contextos de epidemias e surtos e, por isso, foi mais ou menos natural o surgimento do covid longo. Muito recentemente, em 2015, houve um surto de ébola em África e nos estudos de seguimento desse surto detetou-se que muitos profissionais de saúde continuaram com muitos sintomas mesmo depois de terem combatido a infeção”, diz o Nuno Sepúlveda..O epidemiologista conclui lembrando que nestes casos, em termos de política de saúde, não há proteção do trabalhador, o que impede a pessoa de ter uma baixa incapacitante ou uma reforma antecipada..sara.a.santos@dn.pt