"Machu Picchu é um marco mundial, mas o Peru é muito mais do que Machu Picchu"
Está em Portugal para desafiar os operadores turísticos a apostar mais no Peru. Dos quatro milhões de turistas que visitaram no ano passado o seu país, tem ideia de quantos seriam portugueses?
Sim. Oito mil em 2018. E tem havido um crescimento de 20% nos últimos três anos.
E que buscam sobretudo os portugueses no Peru? Os vestígios arqueológicos dos Incas?
Sim, procuram cultura, história, arqueologia. Vão a Machu Picchu, claro.
Isso significa que chegam com um objetivo muito claro...
Sim, fazem em regra um percurso pelo Sul do Peru que demora duas semanas.
E um turista, português ou não, que faça esse percurso marcadamente arqueológico consegue ter também uma imersão na cultura peruana, ficar a conhecer o povo peruano e as suas tradições?
Bem, ir a Machu Picchu é algo único. É visitar um marco da história mundial. É ir a uma das maravilhas culturais do mundo. Isso é feito no tal percurso Sul em que vão a Lima, vão às linhas de Nazca, outra maravilha, vão a Cusco e claro a Machu Picchu. Depois antes do regresso a Lima, visitam ainda Arequipa. Ao longo destes 15 dias veem um pouco do Peru mas o Peru é muito mais do que Machu Picchu e o Sul. O Peru não é só os Incas. Tem culturas com mais de cinco mil anos. Perto de Lima, a cerca de duas horas e meio da capital, está Caral, que tem cinco mil anos e é a cultura mais antiga de todas as Américas.
Os Incas são a última dessa sucessão de culturas peruanas desde a Caral, certo?
Surgem por volta do ano 1000, os Incas. Antes há outras culturas, pré-Incas. Mas são os Incas que os espanhóis vão encontrar no século XVI.
Além da antiguidade das suas civilizações, o Peru é também conhecido pela diversidade natural...
Basta pensar que dois terços do país são Amazónia. E se pensamos na costa, são 2500 quilómetros de praias. Temos também os Andes, que são três cadeias de montanhas, com o pico mais alto a rondar os sete mil metros. E a selva divide-se em selva alta e selva baixa, que é onde nasce o rio Amazonas que desagua no Brasil. A origem do rio Amazonas é no Peru, até que em Iquitos se começa a dirigir para o Atlântico, muito através do teritório brasileiro.
Então, visitar Machu Picchu, por memorável que seja, será só uma primeira visita ao Peru, há muito mais para descobrir?
Exatamente. Por isso dizemos que o Peru é uma lenda que agora se está a descobrir. É como ter um tesouro, guardado num cofre, e só agora estar a ser revelado. Porque o Peru é um tesouro não só do ponto de vista arqueológico, mas também do ponto de vista da natureza. Temos das maiores quantidades de orquídeas e de aves do mundo. Há mais aves do que em qualquer lugar da Europa ou de África. Só nos ganha a Colômbia.
Isso tem que ver sobretudo com a diversidade climática?
Exatamente. O Peru não é um país andino, o Peru é um país amazónico. Que tem uma biodiversidade que gerou essas maravilhas. Temos um deserto completamente árido, irrigado por vales, onde correm rios. Porquê? Porque toda a humidade que vem do mar, ao chegar aos Andes, que são muito atos, essa humidade regressa e faz com que não haja chuva. É uma questão de condensação, por isso existe o deserto. Temos um deserto enorme, o Sechura, que é o segundo maior da América do Sul.
Então o Peru tem Amazónia, Montanha, deserto e litoral?
Costa, serra, selva. Oito regiões naturais. Culturas do norte, culturas da selva, culturas do sul, culturas do centro. E isso pode ver-se nos 30 mil quilómetros do Caminho Inca, que existem em território peruano. Nasce no Peru e ao todo tem 60 mil quilómetros, vai até à Colômbia e também até à Argentina.
As pessoas conhecem a civilização Inca, o tempo do vice-reinado espanhol, mas crê que essa mistura enorme que é hoje o Peru moderno, com gente vinda de África, da Ásia e da Europa, é também sabida?
O Peru é um mosaico de raças. Onde sempre houve mestiçagem cultural. Primeiro entre os espanhóis e os nativos peruanos, depois no tempo do vice-reino, na era colonial, com a chegada dos africanos. E depois da independência da república, a migração italiana, a chinesa, a japonesa, a alemã. É uma época de um Peru grande potência comercial. O ouro de há 150 anos era o guano e o salitre, depois foi a borracha, agora é o ouro mesmo, e hoje em dia o Peru é o sexto exportador de ouro do mundo. Somos o segundo país exportador de prata. Somos o terceiro exportador de cobre do mundo. O Peru é um país mineiro, também resultado da sua geografia.
Tanta riqueza...
Sim. E temos um mar extraordinário, que pode abastecer o mundo. Temos uma Amazónia que está virgem. Onde a flora e a fauna convivem numa natureza que não foi ainda violada.
Há muita gente que não conhece o Peru, mas percebe a sua riqueza através da gastronomia que é muito o reflexo dessa diversidade natural e humana. A gastronomia funciona hoje como soft-power peruano?
A gastronomia é um íman muito importante, que atrai visitantes ao país, pois a cozinha peruana já tem uma identidade global. Vais a Pequim, a Tóquio, a Londres ou a Nova Iorque e vais ter bons restaurantes de cozinha peruana. O ceviche, o lomo saltado, o aji de galinha, tornaram-se pratos consagrados. Mas o mais importante é ajudar a atrair ainda mais visitantes a um país que tem um património monumental que tens ver antes de morrer nem que seja uma só vez. E isso é Machu Picchu, o rio Amazonas, as Linhas de Nazca. Mas além de veres essas maravilhas vais comer muito bem. A gastronomia é a nossa cereja no bolo.
E há quem viaje já ao Peru só, ou sobretudo, pela gastronomia?
Poucos, porque estamos muito longe da Europa e do Oriente. Na América Latina, está consolidada a gastronomia peruana, e no resto do mundo também. E isso é bom. Mas queremos que a força turística do Peru seja os seus vestígios arqueológicos.
Imaginemos então um turista que vá a Machu Picchu, depois também tenha conhecido a Amazónia peruana, é em Lima que vai no final saborear o melhor da tal gastronomia que resulta do mosaico de povos e da abundância da natureza?
Em Lima, existem hoje oito dos 50 restaurantes mais importantes do mundo segundo a San Pellegrino. De qualidade. Restaurantes gourmetque nem todos são de gastronomia típica peruana. A cozinha peruana fundiu-se com as do mundo e permite que seja a autenticidade dos ingredientes peruanos que faz a diferença. Por isso Lima tem a melhor oferta, isto numa cidade excelente para o turismo, onde nunca chove, onde o dia mais frio é de 13 graus e o dia mais quente não passa dos 28. Tem na própria cidade ruínas com milhares de anos. Entre parques e edifícios, o visitante vai encontrar santuários em forma de pirâmide, e pode sentar-se a comer enquanto observa um local com mais de mil anos.