Greve estudantil: "Esta é a tomada de consciência da nossa geração"
Quando a coluna de estudantes entra no Largo do Calhariz, vinda do Camões, ao ritmo de batuques e entoando a palavra de ordem: "Mudar, porquê? Não há planeta B", não há turista, lojista, transeunte ou pensionista que não esteja perfilado à sua espera, de câmaras apontadas e sorriso de satisfação estampado o rosto.
Maria Odete, 75 anos, é uma das mais entusiasmadas. Vai incentivando, uma a uma, as crianças e adolescentes que passam por si. "Vocês são extraordinários, parabéns!", repete vezes sem conta. "Fazem muito bem em estar aqui", diz ao DN. "Os nossos governantes estão todos muito preocupados com coisas "muito importantes", o dinheiro, e não ligam ao que verdadeiramente importa".
A marcha de jovens traz-lhe à memória a sua própria juventude: "Nós também protestávamos no meu tempo", garante. "Estou a lembrar-me do protesto dos isqueiros, quando proibiram a venda sem licença. Sabe o que os alunos fizeram? Andavam de telhas na cabeça".
De carrinho de mão, a transportar a coluna que amplifica as palavras de ordem, Ana Sofia avança com um ar cansado, mas decidido. "Voluntariei-me na boa. Queria era ajudar. Temos todos de ajudar. Isto começou com uma rapariga [Greta Thunberg, na Suécia] e veja onde estamos nós".
À passagem pela Rua do Século, o mote muda para o ministro do Ambiente: "Senhor ministro, explique por favor, porque é que no Inverno, ainda faz calor".
A organização e coordenação são de fazer inveja a muitas centrais sindicais, sobretudo considerando que os manifestantes vão dos dez aos 20 e poucos anos. Mas há mais liberdade criativa nos protestos. Nomeadamente nos cartazes. Aos recados para os políticos - "Marcelo, abraça o ambiente", "Senhor António Costa: queremos ter um planeta para viver em 2050" - junta-se a pura irreverência juvenil: "I want a hot date, not a hot planet" ("Quero um encontro escaldante, não um planeta a escaldar"), "plantem erva. É para o planeta".
A polícia (já agora não é comum, mas é bom, ver um agente de sorriso de orelha num protesto a tirar fotos com o telemóvel) aponta para 400, depois para mais de 500. Os alunos acreditam serem mais de 2000. Mas não estão preocupados. Sabem que fazem parte de um movimento muito maior, que se repete por todo o lado.
"Não sei se os políticos nos têm ouvido mas estamos todos aqui mesmo para mudar isso", garante Ana Filipa, aluna do 11.º ano da escola Daniel Sampaio. "Fiquei surpreendida por estarmos aqui tantos", confessa a colega Beatriz. "Mas somos muitos, muitos mais, no mundo inteiro".
"Isto é que caracteriza este protesto", defende Vítor, aluno da Faculdade de Belas-Artes. " Este é um protesto do mundo inteiro porque o planeta e os seus problemas são de todos".
Para este aluno, o movimento que começou já não vai parar. E graças às atuais ou às futuras gerações no poder, as coisas vão mesmo mudar: "Prova disso é esta manifestação. Esta é a tomada de consciência da nossa geração. Começa agora e é permanente".