Dia Internacional do Riso: "Devemos rir dez minutos continuados por dia"

Sabrina Tacconi, terapeuta do riso, destaca a importância do riso na vida das pessoas e os seus benefícios, que não são só emocionais e mentais, mas também físicos. Melhora a oxigenação, o sistema cardiovascular e ajuda à libertação de serotina, um antidepressivo natural, e de endorfinas, responsáveis pelo bem-estar
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A gargalhada sonora de Sabrina Tacconi ecoa numa das salas de um prédio no centro de Lisboa onde ajuda pessoas através do riso. É lá que recebe o DN, de sorriso largo no rosto. Mas ao contrário do que se possa pensar o assunto é sério. Afinal, são muitos os benefícios do riso, não só a nível emocional e mental, mas também físico, realça a terapeuta do riso. Uma espanhola que vive em Portugal há mais de 20 anos e há 12 que ajuda a melhorar vidas através do riso depois de trabalhar na área do restauro. E bastam 10 minutos contínuos de riso por dia, recomenda a formadora internacional de líderes do riso, para sentir a diferença.

Comemora-se esta sexta-feira, 18, o Dia Internacional do Riso. Qual é a importância que o riso deve ter?

O riso é muito importante na vida das pessoas sobretudo em termos de expressão emocional. Hoje em dia vivemos numa sociedade em que estamos imersos em muita informação. Funcionamos muito com o raciocínio e com a lógica, ou seja, o hemisfério esquerdo do cérebro. Estamos sempre atentos, sempre despertos: como tenho de agir, de reagir. Quando rimos, nós ativamos o hemisfério direito do cérebro, que tem a ver com a nossa parte mais criativa, mais instintiva, intuitiva e relaxada. Dessa forma conseguimos criar na pessoa uma espécie de libertação emocional. A pessoa acaba por encontrar novamente o equilíbrio, entre outros benefícios na saúde.

O número de vezes que rimos é importante? Devemos rir quanto por dia?

Dez minutos continuados por dia. É o que eu recomendo.

Porquê?

O organismo precisa de 10 minutos para que o cérebro se ative, através da gargalhada, e comece a libertar substâncias químicas positivas para nós, como por exemplo a serotonina, um antidepressivo natural, as endorfinas, que nos fazem sentir bem, as hormonas do bem-estar. Depois também faz descer o cortisol, que é a hormona do stress. Então, a partir dessa prática diária, de 10 minutos, conseguimos por o cérebro num estado mais positivo e o nosso organismo também funciona melhor, limpamos os pulmões [através da oxigenação], melhoramos o sistema cardiovascular e fazemos massagem interna. Portanto o riso, que parece uma coisa muito simples, e é, aporta inúmeros benefícios a todos os níveis, físico, mental e emocional, que é superimportante.

"Isto do muito riso pouco siso não é verdade. É ao contrário. É muito riso muito siso"

Ao rir estamos a melhorar aos níveis de oxigenação...

O riso é a respiração mais profunda que temos. O riso vai buscar todo o oxigénio possível para entrar no corpo que fica oxigenado, as células, o cérebro... Às vezes sentimo-nos cansados e é só por causa da falta de oxigénio no organismo. Simplesmente, parar um bocadinho e rir, dar uma gargalhada e já se começa a oxigenar e o cansaço começa a diminuir.

Há, por vezes, a ideia de que a pessoa que está sempre a rir é pouco séria.

Temos de dar cabo desse estigma. Isto do muito riso pouco siso é muito complicado porque não é verdade. É ao contrário. É muito riso muito siso. Eu sou um exemplo disso. Vou editar um livro no Congresso Rir é Saúde - nos dias 4 e 5 de maio no Fórum Lisboa -, que é uma pequena autobiografia de como o riso ajudou-me a dar a volta. Na altura em que as coisas me aconteceram, não tinha muito siso e hoje em dia - trabalho no riso há 12 anos -, considero que nunca na vida fui tão equilibrada. Claro que também me cuido, não é só rir. Todos nós precisamos também dos nossos momentos de tristeza.

Deve então existir alguma moderação?

Moderação, não, mas o respeito pelo que o nosso corpo pede. Mas não se deve prolongar muito a tristeza. Depende da pessoa saber até onde quer levar a tristeza, onde decide inclui a alegria e como a conquista através do riso.

"O riso tem de fazer parte de uma procura saudável"

Mas há momentos em que não há vontade nenhuma de rir, seja só porque não nos apetece ou por alguma circunstância da vida. Nestes momentos pede-se à pessoa para rir?

Aqui a vantagem dos líderes de riso é que nós somos procurados. Normalmente a pessoa que vem à nossa procura está preparada para dar esse salto, para mudar. A pessoa decidiu antes de se inscrever no curso que quer mesmo mudar o registo de vida. Tomou uma decisão. Decidiu ter o riso na sua vida. Mas há que respeitar o nosso processo pessoal, se não estar sempre com as emoções lá no alto porque isso também pode não ser bom, pode ser cansativo para a pessoa e para os outros. Tem de haver equilíbrio. O riso tem de fazer parte de uma procura saudável.

Mas quando se fala em terapia do riso estamos a falar de um riso fingido.

É induzido.

É um riso falso.

Começa por ser, mas depois é contagiante. O grupo acaba por ser contagiado. O contágio é o princípio, mas o mais importante é que o nosso cérebro não distingue o riso induzido do verdadeiro e começa a libertar substâncias químicas positivas. Nós podemos enganar o cérebro. Aliás, o objetivo do desenvolvimento pessoal é que nós é que comandamos, que mandamos. Só que não é fácil, dá trabalhinho.

Às vezes não temos com quem rir. Faz bem rir sozinho?

Muito bem. Conseguimos arranjar sempre uma forma. Depois há coisas básicas, olhar-me ao espelho de manhã e começar a rir ou estarmos a rir quando estamos a tomar banho. Rir sozinho é muito saudável.

Quando recomenda 10 minutos de riso contínuo está a referir-se a um determinado período do dia?

É a qualquer hora. Mas convém acordar e rir, é como meditar. Há muitas pessoas que acordam meia hora antes para meditar pois aqui acordamos 10 minutos antes para rir. 10 minutos de riso equivalem a duas horas de meditação. É muito cansativo, mas depois a pessoas habitua-se.

"Portugal não é um país sisudo e carrancudo"

Está há 22 anos a viver em Portugal. Os portugueses riem muito ou pouco?

Eu venho de uma terra onde se ri muito. Em Espanha há muito riso e muita vida social, mas acho que os portugueses riem bastante. Têm um sentido de humor próprio. Nós aqui na terapia do riso somos muito procurados, há uma grande curiosidade. O ioga do riso em Portugal está a ser um sucesso e em Espanha não há a adesão.

Acha que rimos na medida certa?

Penso que sim.

Apesar da ideia de que somos um povo mais introspetivo e pouco expansivo ...

São mais introspetivos.

Então precisamos de rir mais?

Não sei se precisam de rir mais. Penso que tudo chega no momento certo, à medida que as pessoas sintam a necessidade de rir mais e de se encontrarem melhor, acho que naturalmente encontram esta terapia. Mas não acho que Portugal seja um país sisudo e carrancudo. Não é. Sou emigrante e sempre muito acarinhada. Vim para cá aos 25 anos e fui sempre bem tratada por toda a gente, com cordialidade, com simpatia. Houve uma vez que perguntei onde era uma rua e a senhora pegou em mim e levou-me à rua. Isto não acontece em lado nenhum do mundo ocidental.

Quem quiser praticar ioga do riso o que pode esperar?

O ioga do riso tem tudo. Psicologia positiva, porque mistura mensagens também positivas como por exemplo quando fazemos o riso da gratidão [junta as mãos e inclina a cabeça em sinal de agradecimento] e é logo uma boa energia, trabalhamos programação neurolinguística, porque mudamos registos de pensamentos, trabalhamos meditação ativa, porque no fundo quando estamos a rir estamos a meditar. Portanto, o método é muito completo, trabalha muita coisa ao mesmo tempo. Todas estas técnicas fazem parte da minha formação - sou formada em formadora de líderes do riso. Ganha-se uma nova gestão da tua vida no dia-a-dia, mais fácil através do riso.

Tem a ver com o que falava há pouco sobre a decisão de mudar de registo

Sim. E não é uma reação, é agir, criar movimento. Sentar-me comigo e pensar: o que me está a perturbar? O que está a tirar-me do meu eixo? E daí ver que através do riso podemos começar a dar a volta.

O riso ajuda à aproximação das pessoas, liga, conecta, cria cumplicidade.

Qual é a diferença entre ioga do riso e terapia do riso?

Procuram-me pelos três caminhos, a risoterapia, a terapia do riso e o ioga do riso. A base é induzir o riso para atingir o riso verdadeiro através de exercícios que o líder do riso diz para fazer. A pequena diferença que há com o ioga do riso é como está ligado à Índia falamos de alguns valores como a gratidão, o perdão, a compaixão, a paz e a harmonia.

É terapeuta do riso e formadora de líderes do riso. Na prática o que significa?

O diploma que tenho é de formadora de líderes do riso, dou formação a líderes que depois vão gerir sessões em todos os contextos: sociais, culturais e empresariais.

Trabalha muito com empresas...

Gosto muito de trabalhar com empresas. Há tanto trabalho que se pode desenvolver com eles.

Mas quem é que a procura mais?

A nível de cursos, os particulares. Depois temos o contexto empresarial, em que cada vez há mais procura, porque são cada vez mais inteligentes [risos] e preocupam-se com a felicidade e o bem-estar dos seus trabalhadores, colaboradores.

Vai às empresas. Como é a reação dos trabalhadores? Não há desconfiança?

Há alguns no grupo que ficam desconfiados porque este tipo de discurso é muito novo e nem todo o grupo entra facilmente no jogo, que é muito direto, é rir com os colegas, olhos nos olhos, tens de rir. Há sempre cerca de 80% de adesão. Eu concentro-me nos 80%. Os que não querem participar eu respeito.

Quais as razões pelas quais as pessoas procuram a terapeuta do riso?

Há todo o tipo de situações, pessoais, profissionais, mudanças de vida, doenças, separações, luto, procura de bem-estar. Às vezes não está associado a uma situação problemática, apenas querem estar melhor, ter uma vida mais saudável, saber mais sobre técnicas que as possam ajudar a estar melhor, por exemplo, para que sejam mais completas nos seus trabalhos. O riso ajuda à aproximação das pessoas, liga, conecta, cria cumplicidade.

"Comecei a trabalhar em Portugal como restauradora de antiguidades"

Porque deixou Espanha e veio para Portugal há 22 anos?

Em Córdoba eu estava num negócio familiar, o que significa pouca perspetiva. Eu e o meu pai tínhamos uma loja de antiguidades. Entretanto uma amiga minha veio para Portugal e ela sabia que eu queria outro tipo de desafios e escreveu-me uma carta a dizer: "porque é que não vens para cá, já estou instalada e posso ajudar-te nos primeiros tempos". Isto foi em janeiro e em abril de 1996 decidi. Juntei o dinheiro e no dia 18 de junho de 1996 entrei pelo Marquês de Pombal no autocarro que vinha de Sevilha até Lisboa. E sempre fui bem acolhida.

Começou a trabalhar em quê?

Como restauradora de antiguidades. Tive uma grande sorte por entrar na área do restauro, que é muito hermética, de muita responsabilidade. Estive a trabalhar no restauro durante nove anos. É um trabalho exaustivo, muito introspetivo, tem de se estar ali com a peça, quase que não se pode respirar porque o ouro [folhas] começa a voar. E eu tenho esta personalidade, muito mais expansiva, mais divertida, e senti que tinha de mudar. Saltei para o desenvolvimento pessoal como uma necessidade vital. E a mudança para o riso foi: "é isto que eu quero, é este o meu sonho e tenho que o realizar porque se a mim me ajudou eu tenho de ajudar as pessoas e inspirar". Cada vez que dava uma gargalhada no sítio onde trabalhava no restauro, diziam-me sempre para ir tirar o curso [de terapia do riso].

Mas também foi professora de espanhol.

Isso já foi quando fazia atividade paralela com o riso.

"Todas as sessões de riso foram momentos de entrega"

Qual foi o problema que teve e que o riso ajudou a ultrapassar?

Ajudou-me a ultrapassar um acidente, que me podia ter custado a vida. A minha sorte foi ter o riso para tirar importância e ver que se calhar o acidente foi mesmo para tirar o que já não fazia falta e pôr novas coisas na minha vida. Para outra pessoa podia ter sido um drama, porque eu perdi tudo, casa, todo o trabalho que tinha feito no riso, tive que me ir embora nove meses para recuperar em Espanha. Tive um acidente, perdi o equilíbrio e parti a perna, fiquei um mês hospitalizada. Vinha da formação e quando acordei no hospital estava bem-disposta. Nunca mais perdi a boa disposição, claro que fiz muito trabalho de recuperar autoestima, autoconfiança, mas claro que o riso ajuda-me imenso.

O que mais gosta do que faz?

Dá-me prazer o trabalho. Eu trabalho para levar o riso às pessoas, não é para mim. É o prazer que tenho de entregar este método a um grupo quando muitos deles nunca experimentaram. Consegui mesmo superar muitos desafios porque tenho esta ferramenta, o riso. E o meu próprio processo terapêutico é muito mais fácil porque rio bastante e puxo por mim para rir. A pessoa tem que se ajudar a si própria no seu próprio processo terapêutico. O riso é um motor para dar a volta à situação.

Há 12 anos que trabalha na área. Não se torna cansativo ter uma sala cheia de gente a rir?

Adoro. Não me importo nada. Nunca me cansei. Nunca vou a uma sessão de riso a menos de 100%. Adoro o som, as pessoas, os olhares. É mágico ver quem está a divertir-se, quem não está a divertir-se nada [risos], mas depois é bom ver a transformação, ver como ficam depois, calmos, relaxados. E ver quem não se estava a divertir e como se vai transformando e entra no jogo. Todas as sessões de riso foram para mim momentos de entrega e de prazer em estar lá com eles, a rir.

"Costa e Marcelo são muito bem dispostos"

Há casos que a tenham marcado?

Um senhor de 70 anos que depois de uma sessão de riso veio ter comigo e disse-me que tinha rido mais naquela hora do que nos últimos 30 anos de vida. Depois o caso mais forte de todos foi de uma senhora que tinha conhecido há pouco tempo e que tinha perdido um filho. É a pior dor de todas.

E como se lida com uma dor destas numa sessão de terapia do riso?

Ela tirou o curso básico e agora quer tirar o de líder de riso. A situação aconteceu há três anos e através de formação e de formas mais subtis fui dizendo-lhe que a vida continua. No dia em que ela falou na sessão, estávamos a dizer: "fiquei chateada porque perdi o comboio, o metro nunca mais chegava e atrasei-me". De repente, ela diz: "eu perdi uma filha há três anos". Eu já sabia, mas todos ficaram para morrer. Mas ela é que se está a ajudar a si própria, ela decidiu continuar com a vida dela.

Quais são os benefícios do riso nos mais velhos e nas crianças?

Nos seniores, somos bastante procurados por eles, o beneficio principal é trazê-los novamente ao momento presente porque há muita tendência a evadir-se por causa da solidão e, portanto, é uma boa forma de lutar contra a solidão e de ter atividades que estimulem toda a parte cognitiva. E claro que depois as melhorias na saúde vão-se ver muito rapidamente. No lado das crianças, o bom que acontece através da prática do riso é que libertam muita energia e, por isso, ficam mais equilibrados. Ajuda muito a que a criança esteja mais focada e não tão dispersa, que esteja mais concentrada, mais equilibrada.

Mas o riso pode desconcentrar?

O riso não desconcentra quando bem aplicado, não é rir com os colegas da turma quando a professora está a falar. Esse riso não é saudável. Mas se praticas o riso antes das aulas provavelmente a capacidade de concentração dos alunos vai ser maior.

Se pudesse escolher uma figura pública para uma sessão de terapia do riso quem é que escolheria?

Se me perguntasse com quem gostaria de fazer uma sessão de riso, eu dizia que era com o António Costa [primeiro-ministro] e o Marcelo Rebelo de Sousa [Presidente da República]. Porque são muito bem-dispostos. Adorava. E adorava que me levassem ao Parlamento para fazer uma sessão. Vamos fazer um exercício de riso, este é do orçamento de estado [gargalhadas]. E todos a rir. Toda a Assembleia da República. Pô-los a rir cinco minutos, não peço mais. Um líder tem que sorrir. Olhe o Obama. Já uma pessoa que não se ri o suficiente e que eu gostava de fazer rir era a Angela Merkel [chanceler alemã]. E adorava fazer risoterapia com a Madonna, ela iria delirar.

Informações úteis

2 e 3 de fevereiro - Curso internacional de líder ioga o riso, no Porto

16 de fevereiro - Curso de risoterapia, em Vila Nova de Gaia

23 e 24 de fevereiro - Curso internacional de líder ioga o riso, em Lisboa.

16 de março - Curso de risoterapia, em Lisboa

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