Marbella
Juan Antonio Roca é um nome desconhecido para os portugueses e mes-mo para os espanhóis até há cerca de um mês. Roca, 53 anos, é a quarta fortuna de Espanha, apesar de só apresentar como rendimento o salário de assessor para o urbanismo do município de Marbella. Em seis anos, tempo em que exerceu aquele cargo e também o de gerente em várias sociedades municipais, bem como a direcção do plano geral de urbanismo, Roca acumulou uma gigantesca fortuna distribuída por sociedades tituladas por testas-de-ferro, em particular advogados.
E quem era Roca antes desses tempos de fortuna? Simplesmente um desconhecido empresário que faliu as suas empresas acedendo depois aos corredores políticos da Costa do Sol pelas mãos de Jesús Gil. Discreto, foi consolidando a sua influência como número dois de Gil e depois dos sucessores deste. Roca foi o grande "desenhador" da criminosa política urbanística de Gil, que não é assim tão diferente do que vemos em algumas regiões de Portugal.
Os resultados de uma investigação dirigida por um juiz de 30 anos são impressionantes: mais de duas dezenas de presos; apreensão de dinheiro e bens que superam os 2,4 milhões de euros, traduzidos em centenas de obras de arte, quilos de jóias, cavalos de raça, quintas, prédios, palácios, carros de luxo, antiguidades, etc.
O valor metafórico desta operação, para nós, portugueses, é grande porque ela representa em matéria de eficácia policial e judicial um patamar que jamais atingiremos nas próximas décadas. Ela evidencia uma realidade que não nos é estranha - branqueamento de dinheiro, corrupção, evasão fiscal, tráfico de influências, manipulação de concursos públicos e adjudicações de obras, tudo ligado à construção civil e especulação imobiliá- ria -, mas que as nossas estruturas judiciais, por falta de capacidade e de investimento político em meios técnicos e humanos, jamais atacarão.
Andamos há vinte anos numa luta entre governos e justiça, com uns e outros a afundarem-se na falta de respostas aos mecanismos criminais que crescem nos centros fácticos de poderes diversos. De cada vez que um interesse poderoso é tocado há um sismo nos meandros mais obscuros da vida interna dos partidos que arquitectaram o regime político que somos hoje. Por isso vivemos num pântano. Por isso, Marbella, paraíso do sol e da vida "glamourosa" do Sul de Espanha, transformou-se também no símbolo da nossa vergonha.