Fogo-de-artifício

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No são as razões por que a Globo decidiu testar um beijo gay em Viver a Vida, transmitida entre nós pela SIC, que me despertam curiosidade. Quem leu a pequena entrevista ontem concedida ao Diário de Notícias por Eduardo Figueira, director do Centro Globo de Produções, já o percebeu: a produtora quer ser sobretudo uma "fábrica de emoções" (sic), mais até do que uma empresa rentável - e, se lhe parecer que será um beijo entre dois homens a dar-lhe "mais um pontinho de audiência" (sic também), não hesitará. De qualquer forma, não deixa de ser sinal do conservadorismo da TV em língua portuguesa que ainda estejamos hoje, quase 30 anos depois de O Beijo da Mulher-Aranha, a debater o tema. É mais do que altura de quebrar esse tabu.

O que me desperta curiosidade é, na verdade, o verdadeiro motivo por detrás da excitação dos homossexuais brasileiros e portugueses em torno da actual ponderação da Globo sobre se emitirá ou não o beijo. Porque Osmar, a personagem de Marcello Vale na dita Viver a Vida, não é homossexual: é bissexual (o que não deixa de ser uma interessante opção dos guionistas no sentido de fintar o atraso no tratamento da homossexualidade, diga-se). Ora, eu não vejo, por esta altura, pior propaganda para a causa homossexual do que a sua confusão com a bissexualidade. Se se trata apenas da exibição da diferença, tudo bem. Mas o mais provável é que a urgência já esteja, hoje em dia, muito mais na igualdade, caminho em que os bissexuais estão seguramente bastante mais atrasados.

Será fogo-de-artifício, o que move os homossexuais? Fazem mal: arriscam perder, com o tempo, algumas das jardas entretanto conquistadas.

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