Vacina da AstraZeneca volta hoje a ser usada no continente
Nos Açores e na Madeira a vacina da AstraZeneca já começou a ser administrada. Hoje começará no continente, iniciando-se a recuperação de um atraso de cerca de uma semana (cerca de 120 mil doses ficaram por inocular). O primeiro-ministro, ele próprio, fez saber que recebeu a sua primeira dose de vacinação desta marca.
Em 15 de março, a DGS e o Infarmed anunciaram a suspensão do uso desta vacina pós relatos de casos graves de coágulos sanguíneos em pessoas a quem fora inoculada.
Nessa altura, já vários outros países tinham decidido o mesmo, pelas mesmas razões: Espanha, Itália, Alemanha, França, Noruega, Áustria, Estónia, Lituânia, Letónia, Luxemburgo, Dinamarca, Suécia e Finlândia, por exemplo. Três dias depois, a 18 de março, as autoridades sanitárias portuguesas tomaram a decisão oposta: "O plano de vacinação sofreu uma pausa no que concerne à vacina da AstraZeneca e vai ser posto em marcha outra vez a partir de segunda-feira [hoje]. Vamos retomar o plano, acelerando-o e recuperando o atraso destes quatro ou cinco dias parados sem vacinação da AstraZeneca", afirmou o coordenador da task force para a vacinação contra a covid-19, vice-almirante Henrique Gouveia e Melo, numa conferência de imprensa em que esteve também presente o presidente do Infarmed, Rui Ivo, e a diretora-geral da Saúde, Graça Freitas.
O processo é retomado mas por ora não é claro o que acontecerá a quem recusar esta vacina. Aparentemente, irão para o fim da lista, mas na verdade nem Gouveia e Melo nem Graça Freitas foram categóricos a afirmá-lo. Numa declaração há dias ao jornal público, Gouveia e Melo limitava-se a afirmar que "o princípio no processo de vacinação é a não escolha da vacina, porque as vacinas aprovadas são igualmente boas e seguras."
Uma eventual decisão de passar quem recusa a vacina para o fim da lista está longe, porém, de ser pacífica (como de resto tudo o que rodeia a AstraZeneca desde o início).
A Sociedade Portuguesa de Pneumologia (SPP) manifestou-se absolutamente contrária a qualquer medida "de coação e de chantagem" exercida sobre pessoas que recusem a vacina. Para a SPP, a suspensão da administração desta vacina foi uma decisão precipitada de alguns Estados, nomeadamente Portugal, e as dúvidas da população têm de ser entendidas, depois de um processo em que foram colocadas questões sobre a segurança "induzidas pelas autoridades competentes que agora pretendem efetuar essa coação sobre os cidadãos".
Defendendo a sensibilização da população para a importância da campanha de vacinação, aquela sociedade científica afirmou, em comunicado, que acompanhava "com preocupação" a interrupção do processo de vacinação, devido às situações de distúrbios de coagulação ocorridas em pessoas previamente vacinadas com vacinas da AstraZeneca. "Efetivamente, nunca foi emitida qualquer orientação nesse sentido por parte da organização reguladora europeia (EMA), responsável pela aprovação das vacinas no espaço europeu", defendeu a SPP, acrescentando que a Organização Mundial da Saúde manteve sempre "a opinião de não haver informações suficientes" sobre a associação das alterações da coagulação sanguínea com a administração daquelas vacinas. "Num processo profundamente escrutinado e de administração maciça de vacinas é natural que ocorram situações duvidosas, que têm necessariamente de ser avaliadas e abordadas de forma sensata pelos órgãos decisores", escreveu a SPP no documento.
Subscrevendo o conceito emitido pela Task Force de que "o princípio no processo de vacinação é a não escolha da vacina, porque as vacinas aprovadas são igualmente boas e seguras", mas não concorda com penalizações no âmbito deste processo. "Os indivíduos a vacinar nesta primeira fase são aqueles que tem maior risco de, ao serem infetados, desenvolverem doença grave e de maior associação à mortalidade, o que torna esta decisão ainda mais grave e desajustada", sustentou a SPP.
Entretanto, no plano internacional, aumenta a tensão entre a Comissão Europeia e a AstraZeneca pelo facto desta marca alegadamente estar a fazer entregas à UE significativamente abaixo do que que estava comprometido.
"Temos a opção de proibir quaisquer exportações planeadas. Esta é a mensagem que estamos a enviar à AstraZeneca: respeitem o vosso contrato com a Europa antes de começarem a entregar a outros países", disse, numa entrevista, a presidente da Comissão Europeia, a alemã Ursula von der Leyen.
O Governo britânico reagiu através do ministro da Defesa. Ben Wallace disse que se a UE cumprisse a ameaça isso seria "contraprodutivo". "Se os contratos e os compromissos são rompidos, seria muito prejudicial para um bloco comercial que se orgulha de [respeitar] a lei."