Um estudo recente da Universidade Lusófona, que inquiriu 368 profissionais de emergência, sobretudo bombeiros, veio demonstrar que cerca de 23% registavam sintomas de stress pós-traumático, podendo estes implicar com a sua atividade diária. Para o vice-presidente do Sindicato dos Técnicos de Emergência Pré-Hospitalar (STEPH), que representa a classe no Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM), os dados não surpreendem quem anda no terreno. Para o STEPH, basta olhar para as baixas por esgotamento ou por burnout nos serviços ou até mesmo para o abandono da profissão..Rui Cruz dá mais dados e traça um retrato: “Em dez anos, perderam-se cerca de 500 técnicos. E sabemos que um em cada quatro técnicos abandona a profissão. Isto quer dizer alguma coisa”. Ao sindicato “todos os dias chegam situações e apelos de colegas que querem sair. Procuramos sempre encaminhá-los para o apoio psicológico, mas à quantidade de casos internos de resgate psicológico, o que fazia sentido era um Departamento de Psicologia Ocupacional dentro do INEM”. .A psicóloga clínica e da Saúde Dulce Pires, que em tempos esteve no INEM, diz mesmo que deve ser algo que a estrutura deve refletir face às necessidades dos profissionais, porque, e como destaca, de uma coisa não há dúvidas: “Mais acompanhamento psicológico melhoria significativamente o seu bem-estar, aumentaria a produtividade e poderia prevenir as situações de desgaste”. .Rui Cruz explica que no INEM “o acompanhamento psicológico está disponível para os técnicos que o solicitarem. É feito pelos psicólogos do instituto. Agora, se este é eficaz ao ponto de os técnicos sentirem que têm o apoio de que necessitam, duvido”, justificando ainda que “os que os psicólogos têm de dar resposta às situações mais difíceis do dia-a-dia, uma morte trágica de uma criança, a morte dos pais em que as crianças assistem, e são poucos a nível nacional”. Dulce Pires corrobora que, “embora exista disponibilidade para esse apoio, a verdade é que os psicólogos do INEM têm que se subdividir em tarefas. Portanto, existe aqui uma crescente necessidade de mais apoio psicológico. Até porque as situações vão sendo cada vez mais exigentes, estamos num mundo mais exigente”..A psicóloga salienta que o processo de seleção para técnicos de emergência já insere avaliação dos profissionais, que têm de passar por testes psicológicos, sendo “as suas características individuais avaliadas, porque logo aqui poderiam surgir algumas vulnerabilidades relativamente ao trabalho em si, pois é um trabalho de grande pressão psicológica”. “Tal como é o de outros profissionais de saúde, mas estes têm a característica da emergência, estando os técnicos mais suscetíveis a desenvolverem quadros de stress agudo ou de burnout e, eventualmente, até de stress pós-traumático pelas situações a que estão expostos. Por isto é uma profissão de risco”. .Ao DN, técnicos do INEM confessaram que muitas vezes não pedem logo apoio psicológico, porque acham que “têm de cumprir até ao fim”, desvalorizando as situações. A psicóloga clínica e da Saúde considera que “não é tanto desvalorizar a situação, mas o confundir o que são os seus limites, achando sempre que até estão a conseguir lidar com as situações”. Só que, explica, “se a dada altura as situações ultrapassarem as suas próprias estratégias de gestão de stress, os seus mecanismos, nesta altura, devem recorrer ao apoio dos psicólogos”..Dulce Pires defende que ao longo do tempo deveria ser possível aos técnicos do INEM “promover o autoconhecimento, até para compreenderem efetivamente se neste ou naquele caso concreto precisam de mais apoio ou se até num dia em que as chamadas foram muito exigentes também têm essa necessidade”..Autarquias poderiam ajudar a fixar técnicos no INEM se apoiassem habitação.O vice-presidente do STEPH salienta que ao stress das situações e da atividade juntam-se as condições de trabalho, porque uma das razões para o abandono do INEM, além dos baixos ordenados, é o facto de os técnicos estarem deslocados. Nestes casos, “procuramos muitas vezes encontrar soluções junto das estruturas do INEM, dos Recursos Humanos, do Conselho Diretivo, para tentar garantir que os colegas não se despedem, tentando que lhes seja permitido, por exemplo, aproximarem-se de casa”..Mas nem sempre é assim, garante. “O processo de mobilidade está basicamente parado, o número de colegas mobilizados para junto das suas casas é muito reduzido. Pode não chegar a dez por ano”. Para o dirigente sindical cabe “ao instituto perceber a importância de fazer com que estes colegas não se despeçam, aproximando-os da sua área, uma vez que todo o país está carenciado. Nós fazemos o nosso papel de mediação nas situações, mas depois não há resposta”..Por outro lado, argumenta, “outros até poderiam aceitar deslocarem-se para zonas mais carenciadas, como Lisboa e Algarve, mas com o que ganham e sem acesso à habitação isso é impensável”. “Chegámos a ter uma colega a dormir no carro do parque do hospital onde estava a sua base, por não poder alugar um quarto ou uma casa porque já tinha um crédito à habitação onde estava a família. Levámos meses para conseguir ajudar esta colega”, recorda. E defende: “As autarquias se calhar não sabem, mas se apoiassem os técnicos com habitação acessível se calhar conseguiriam fixar alguns colegas nas zonas em que são mais precisos”..Quando questionado se o sindicato já apresentou propostas neste sentido, Rui Cruz afirma que “tem estado sempre nos alertas ao ministério e à própria direção do instituto, mas consideramos que devem ser estas entidades a fazê-lo”. Esta é uma das medidas que integra o caderno reivindicativo apresentado a várias tutelas no item em que exigem medidas que permitam maior equilíbrio entre a vida profissional e pessoal.