A ministra da Saúde vai esta sexta-feira, 31 de outubro, à tarde ao Parlamento para explicar aos deputados da Comissão da Saúde, e no âmbito da discussão na especialidade, o Orçamento do Estado para 2026 (OE2026) aprovado na generalidade para o setor. Precisamente dois dias depois de a polémica sobre cortes na Saúde estar ao rubro, após a divulgação de uma notícia do jornal Público, onde era referido que o próprio diretor executivo do Serviço Nacional de Saúde (DE-SNS) terá pedido às administrações hospitalares para reduzirem a despesa, nem que fosse em consultas e cirurgias. Para atenuar o impacto das declarações, no próprio dia, o primeiro-ministro Luís Montenegro veio dizer que o Governo não quer “cortar nada”, quer é “gerir melhor e lutar contra o desperdício”. O DN sabe que Ana Paula Martins vai ao Parlamento anunciar mais medidas, além daquelas que já foram aprovadas em Conselho de Ministros no dia 22, com vista "à otimização dos recursos existentes, através do incremento de aquisição centralizada de compras, nomeadamente gás, energia, dispositivos médicos e medicamentos". Mas não só. A ministra prepara-se também para anunciar novas regras concursais para o transporte de doentes não urgentes - que hoje em dia está entregue a empresas privadas e a associações de bombeiros - e novas regras também para que seja instituído nas unidade mais uso dos medicamentos genéricos e biosimilares. Segundo foi explicado ao DN, a ministra acredita que com estas medidas haverá “maior eficiência no SNS”, que resultarão “na redução de despesa”. Sobre cortes na atividade assistencial, Ana Paula Martins irá dizer aos deputados que até "está previsto um aumento no número de consultas médicas e no número de cirurgias", estimando-se "uma melhoria significativa da percentagem de cirurgias realizadas em regime de ambulatório, assim como da percentagem de doentes em regime de hospitalização domiciliária". No caso da lista dos utentes inscritos para cirurgia fora dos Tempos Máximos de Resposta Garantidos (TMRG), o ministério prevê "uma melhoria". Segundo foi explicado ao DN, as medidas que a ministra vai anunciar no Parlamento serão associadas às já conhecidas sobre a regulação do trabalho tarefeiro e criação de uma unidade de combate à fraude - recorde-se que só neste último ponto a ministra anunciou que seria possível uma redução de 800 milhões de euros na despesa. E é precisamente este montante que o Governo quer poupar. Pelo menos, é o montante correspondente à redução de 10% prevista na rubrica da aquisição de bens e serviços. .Montenegro nega cortes no SNS: "Não queremos cortar nada. Implica gerir melhor e lutar contra o desperdício".Administradores apreensivos querem medidas detalhadasO presidente da Associação Portuguesa dos Administradores Hospitalares (APAH), Xavier Barreto, espera mesmo que Ana Paula Martins explique agora “detalhadamente” as medidas previstas para reduzir a despesa de 10% na área da aquisição de bens e serviços e que não foram explicadas no momento da entrega do documento no Parlamento. O administrador recorda que o OE2026 prevê para a Saúde um montante de 17,3 mil milhões de euros, um aumento de cerca 1,5% em relação a 2025, 16,8 mil milhões, mas que tal só foi possível à custa do aumento previsto para o investimento, que é da ordem dos 5,2% (passando dos 600 milhões para os 899 milhões, devido aos fundos do PRR). Mas sobre a redução na despesa não há qualquer detalhe e esta “é uma das apreensões do setor”, confessa. Para a discussão na especialidade, “esperamos que a ministra leve o detalhe que nos falta e que nos possa dizer, em primeiro lugar, qual é o plano do Governo para garantir o acesso aos cuidados de saúde, porque as listas de espera estão a aumentar, quer para consultas como para cirurgias, o que quer dizer que continuamos a ter problemas no acesso a cuidados programados como aos serviços de urgência”.E apesar de o ministério e de o próprio primeiro-ministro virem dizer que o Programa de Emergência e Transformação da Saúde (PETS) está a ser cumprido, para Xavier Barreto “está visto que não está a surtir os efeitos desejados”, reforçando: “Passou mais de um ano e “as listas de espera não param de aumentar com mais doentes fora do tempo máximo garantido. E o acesso aos cuidados é o tema que mais importa aos portugueses”..Cortes na Saúde "são possíveis, mas têm de ser cirúrgicos”, avisa Ana Jorge. E dá exemplos de tarefeiros, exames e combate à fraude . Questionado pelo DN sobre se a redução na despesa pode chegar através da regulação dos tarefeiros, Xavier Barreto considera que não. “Repare, a redução que nos está a ser pedida é de 800 milhões de euros, a despesa com os tarefeiros ascendeu em 2024 aos 231 milhões de euros. Portanto, mesmo que reduzíssemos nesta área, não seria suficiente”. Considerando que “o que é preciso saber são as medidas que o Governo tem para se obter uma redução na despesa”, questionando: “Será pela comparticipação de medicamentos ou pelo combate à fraude? Estas dúvidas geram muita apreensão no setor”.Para a APAH, há um pressuposto muito importante: “Não nos peçam nenhuma redução na atividade. O primeiro-ministro já assumiu isso e esperemos que assim seja. O importante é explicarem como vamos garantir o acesso e a qualidade nos cuidados, que é o que não estamos a conseguir melhorar. Pelo contrário, estão a agravar-se.” O administrador hospitalar considera ainda que seria benéfico que a discussão na especialidade do OE2026 focasse também o “modelo de gestão do SNS e, em concreto, o modelo de governação das Unidades Locais de Saúde (ULS) - se é para manter ou não os hospitais universitários ou se vai haver alteração neste modelo de funcionamento”. Uma situação que quase ao fim de um ano de as ULS estarem a funcionar ainda não está definida e “quando se pede mais eficiência e mais produtividade no SNS também passa por estas questões que afetam o nosso trabalho”. Mais uma vez, a ida de Ana Paula Martins ao Parlamento está a ser marcada por pedidos para a sua demissão, tal como fez o PS esta semana seguido por outros partidos.