PSP retira corpos de velórios. "O nosso luto foi invadido. É desumano"

Neta de Maria da Graça Ribeiro reage com indignação e diz que família pressionará para que funeral seja hoje
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"Quando é que o ministério nos vai dar o corpo da minha avó? O nosso luto foi invadido. Estávamos na nossa dor, a despedir-nos. Queremos ter o nosso tempo de luto." Joana Araújo, neta de uma das vítimas mortais do surto de legionela no Hospital de São Francisco Xavier (HSFX), estava no velório da avó quando viu a PSP entrar para levar para autópsia o corpo de Maria da Graça Ribeiro, de 70 anos. "Não contesto as ordens que têm, mas é desumano. Queriam levar o corpo num saco como se fosse lixo." Perante a indignação da família, recorda Joana, as autoridades usaram a carrinha funerária para transportar o corpo desde o velório, na Igreja de Santo Condestável, em Campo de Ourique, até ao Instituto de Medicina Legal de Lisboa (IMLL).

Ontem, a PSP interrompeu os velórios das duas vítimas do surto de legionela (há mais 36 pessoas infetadas, cinco delas internadas nos cuidados intensivos, segundo um balanço feito esta quarta-feira às 11:00) por ordem do Ministério Público (MP) que decidiu ordenar as autópsias dos corpos, quando estes tinham sido entregues às famílias pelos hospitais de Santa Maria e Lusíadas na segunda-feira. A decisão do MP está relacionada como facto de ter sido aberto um inquérito às mortes provocada pelo surto de legionela no HSFX identificado a 31 de outubro.

Joana Araújo não compreende o que aconteceu. "O corpo esteve mais de 24 horas na morgue do hospital. Disseram-nos que não era preciso fazer autópsia. A causa era conhecida", recorda a jovem, que neste momento só quer saber quando é que o corpo vai ser autopsiado e devolvido à família. "O mínimo que podem fazer é dar-nos o corpo o mais depressa possível", frisa, em conversa telefónica com o DN.

Tudo terá começado na sexta-feira, quando Joana foi com a avó a uma consulta de cardiologia no HSFX. "Terá sido infetada aí", diz ao DN a jovem. Maria da Graça começou por se sentir mal no sábado e terá piorado durante a madrugada, o que levou a família a chamar o Instituto Nacional de Emergência Médica de Portugal. "Como as urgências do HSFX estavam fechadas, foi levada para o Hospital de Santa Maria". Aí, as análises viriam a confirmar uma "pneumonia muito grave" provocada por legionela. "Os órgãos começaram a falhar e tiveram de a induzir em coma."

Na segunda-feira, às 09.15, Maria da Graça teve uma paragem cardiorrespiratória "e não conseguiram reanimá-la. "Fizemos dezenas de questões relativamente à autópsia. Indicaram-nos sempre que não era preciso fazer. Até que libertaram o corpo. Só fizemos o velório hoje [ontem], às 17.00, porque estávamos à espera do meu tio que vinha da Madeira e do meu primo que ia chegar da Suíça". Por volta das 19.00, a PSP entrou no velório "com um mandado" para levar o corpo de Maria da Graça, cujo funeral estava marcado para esta quarta-feira às 15.00.

A família contestou, lembra Joana, mas "não havia nada que pudesse fazer". "Queriam levá-la num saco como se fosse um lixo. Não deixámos e entretanto chamaram uma carrinha funerária para levar o corpo para o IMLL", recorda.

Esta situação foi "desconfortável" para os agentes, como reconheceu fonte do Comando Metropolitano de Lisboa à Lusa. "Dizer que é uma situação muito sensível é pouco e foi difícil de gerir. Foi desconfortável, mas teve de se cumprir. As pessoas estavam desagradadas com a situação, mas não houve problemas de maior", sublinhou.

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Em comunicado, o MP anunciou que ordenou as autópsias das duas vítimas mortais - que considera "essenciais para a investigação em curso" - por não ter "recebido qualquer comunicação de óbito relacionada com esta matéria [legionela]". Por isso, teve "necessidade de recolher elementos que permitissem identificar as vítimas, bem como as circunstâncias que rodearam as mortes, designadamente o local onde ocorreram".

Além da autópsia ao corpo de Maria da Graça, o MP ordenou igualmente a autópsia ao corpo da outra vítima mortal, Simão José Santiago, o que fez que a data das cerimónias fúnebres também tivesse de ser alterada.

O jurista, de 77 anos, terá sido infetado quando foi fazer umas análises de rotina no Hospital de São Francisco Xavier. Deu entrada no Hospital dos Lusíadas durante o fim de semana, com sintomas de pneumonia forte, e acabou por falecer.

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