"Daqui resulta que nem a GNR, nem a PSP desenvolveram, até à data, estratégias de combate à corrupção, dedicada, nem apresentaram um projecto de documento estratégico com uma visão de longo prazo das medidas anticorrupção necessárias”. Com esta frase os elementos que integram o Grupo de Estados Contra a Corrupção (GRECO) do Conselho da Europa, deixam o alerta para uma das questões mais relevantes enumeradas nas 28 recomendações efetuadas após a quinta ronda de avaliação desta entidade, tornadas públicas em 10 de janeiro de 2024, e que, no seu entender, não sofreram qualquer evolução.O Relatório de Conformidade divulgado ontem incidiu sobre a “Prevenção da corrupção e promoção da integridade nos governos centrais (funções executivas de topo) e nas agências de aplicação da lei” e Portugal tem agora até 30 de setembro de 2026 para seguir as recomendações, altura em que terá de submeter um novo relatório a esta estrutura do Conselho da Europa que irá analisar se o país alterou algumas das questões agora destacadas.Das 28 advertências, nenhuma foi aplicada na totalidade. Dezoito foram aplicadas “parcialmente” - a maioria na parte relacionada com a prevenção da corrupção e promoção da integridade nos governos centrais - e dez não foram de todo seguidas.A maioria das recomendações não implementadas relaciona-se com o que o GRECO denomina “agências de aplicação da lei”. Da corrupção à igualdade de géneroA prevenção de “riscos de corrupção e crimes conexos” é um dos pontos em que o GRECO considerou que as suas recomendações seguidas. É por isso que apesar de ter sido notificado pela GNR que esta força está “neste momento a desenvolver a sua Estratégia Geral para 2026-2030, que incluirá a estratégia de prevenção da corrupção” e pela PSP que esta força adotou “recentemente um novo Código de Conduta e incluiu conteúdos sobre estratégias anticorrupção no seu programa de formação. A PSP está agora a trabalhar no desenvolvimento da sua estratégia anticorrupção para 2024-2028”, esta entidade considera que a recomendação “não foi implementada” frisando que das respostas recebidas “resulta que nem a GNR, nem a PSP desenvolveram, até à data, estratégias de combate à corrupção dedicadas, nem apresentaram um projeto de documento estratégico com uma visão de longo prazo das medidas anticorrupção necessárias”.Outro ponto referido no documento é a ainda pouca representação feminina nas forças de segurança ao ponto de ser recomendado que fossem “tomadas medidas para reforçar” a sua presença tanto na PSP com na GNR. Perante este alerta, as informações que o grupo recebeu e incluiu no relatório frisam que o número de mulheres está a crescer tanto na PSP como na GNR. É, igualmente destacado o facto de a GNR ter uma “Comissão para a Igualdade de Género em funcionamento e proporciona condições de trabalho iguais para homens e mulheres ao nível de quartéis, sanitários e balneários”. Facto este que não é totalmente confirmado por César Nogueira, presidente da APG - Associação dos Profissionais da Guarda.De acordo com este dirigente as instalações são mesmo uma das dificuldades sentidas pela instituição. “Muitas das instalações não têm condições. É uma desigualdade que a Guarda está a tentar resolver”, diz.Comentando o relatório do Grupo de Estados Contra a Corrupção, César Nogueira destaca a questão dos conflitos de interesse, o código de conduta que é referido mas em relação ao qual a “associação não foi ouvida”. Na questão das doações às forças de segurança - o GRECO recomenda que seja criadas salvaguardas contra conflitos de interesse -, a APG defende que tal não deveria ser possível. “É uma questão melindrosa e no nosso entender não deveria haver qualquer doação, vinda de onde for”, sublinha.Corrupção é uma questão que preocupa bastanteUm dos pontos chave do relatório é a questão da corrupção.“Haver indícios de corrupção numa força de segurança é uma questão que nos preocupa bastante. Por isso esses pontos deviam ser clarificados”, começa por dizer César Nogueira que acrescenta um tema que não é referido nesta questão, mas que devia ser tido em conta: os salários.“Não falam das questões remuneratórias, mas é aí que a corrupção pode surgir. É mais fácil corromper alguém que tem um vencimento baixo do que quem ganhe melhor “.Já a Associação Sindical dos Profissional da Polícia (ASPP-PSP) tem uma visão mais alargada do documento. Para o seu presidente “temos de olhar para estes relatórios numa perspetiva macro”. Paulo Jorge Santos frisa que “algumas vezes as entidades que fazem estes relatórios não levam em conta a falta de efetivos, as condições de trabalho e a PSP está a trabalhar num quadro muito difícil”. Todavia, reconhece que a ASPP-PSP se “identifica com algumas das coisas” que estão no documento, como a questão da disciplina ser “um ciclo vicioso pois quem decide sobre um processo é que o instaurou”, já quanto ao código de conduta garante que “os representantes dos profissionais não terem sido chamados a falar sobre a matéria”. O que houve foi uma “reunião com a equipa de avaliação do GRECO, em 2022”.Elogios e chamadas de atenção para a transparênciaNas cerca de 30 páginas do relatório nem tudo são destaques pela negativa. O documento faz publicamente elogios como a adoção de um “código de Conduta da PSP e os trabalhos em curso para finalizar o novo Código de Conduta da GNR”. Pode ler-se no documento que “os códigos de conduta de ambas as forças devem ser complementados pelas orientações práticas necessárias. É uma conquista positiva o facto de tanto a GNR como a PSP disporem agora de canais internos de denúncia, cujo funcionamento deve agora ser promovido através de atividades específicas de sensibilização”.Por outro lado é pedido que seja estabelecido nas forças de segurança um “mecanismo de aconselhamento confidencial e um sistema de controlo regular”, a revisão do “ regime disciplinar, s atuais procedimentos de nomeação e promoção para cargos superiores e aplicar salvaguardas em matéria de conflitos de interesses, bem como a transparência nos donativos e patrocínios”.Em relação à análise às 14 recomendações relacionadas com a integridade nos governos centrais, o relatório refere “alguns progressos numa série de domínios fundamentais. Uma conquista importante é que o MENAC e a Entidade para a Transparência se tornaram operacionais. O Código de Conduta do novo Governo foi adotado, introduzindo uma série de inovações úteis, mas continua a haver um trabalho importante para consolidar todas as normas de integridade e fornecer as orientações práticas necessárias”. Como ponto negativo destaca que “a nova Estratégia Nacional Anticorrupção e o respetivo Plano de Ação para o período 2025-2028, bem como um plano de prevenção do risco de corrupção específico para os PTEF, ainda não foram adotados. São necessários esforços adicionais para tornar todo o processo de acesso à informação mais eficiente, para rever o atual procedimento de consulta pública sobre decretos-leis, para regular o lobbying e aumentar a sua transparência”. .Recomendações e a sua implementaçãoPrevenir corrupção nos governos centrais- Regras sobre a verificação de integridade se apliquem a todas as pessoas com funções executivas de topo, antes da sua nomeação. Parcialmente implementada.- Estratégia Nacional Anticorrupção devia ser acompanhada de um plano de ação específico para a sua implementação na prática. Parcialmente implementada.- O GRECO recomendou que, prioritariamente, o Mecanismo Nacional Anticorrupção se tornasse plenamente operacional, na prática, dotando-o de medidas e recursos adequados (financeiros, humanos, administrativos, jurídicos, etc.). Parcialmente implementada- O Grupo recomendou que fosse estabelecido e publicado online um plano de prevenção de riscos de corrupção específico para pessoas com funções executivas de topo, incluindo a identificação de riscos relacionados com a integridade e medidas corretivas adequadas, e (ii) que o plano fosse sujeito a monitorização regular pelo Mecanismo Nacional Anticorrupção, tornando públicas as suas conclusões e recomendações, bem como as respostas das autoridades. Parcialmente implementada.- O GRECO recomendou que o Código de Conduta para pessoas com funções executivas de topo (i) fosse revisto e complementado com disposições adicionais contendo orientações claras sobre conflitos de interesses e outras questões relacionadas com a integridade. Parcialmente implementada- Foi recomendado que (i) fosse ministrada formação formal sobre normas de integridade a todas as pessoas com funções executivas de topo aquando da sua tomada de posse e a intervalos regulares, e (ii) lhes fosse disponibilizado aconselhamento confidencial sobre questões éticas e que as estatísticas conexas sobre esse aconselhamento confidencial fossem devidamente mantidas. Parcialmente implementada- Recomendado que o acesso do público à informação fosse melhorado, tomando medidas adicionais para limitar o uso de restrições ao abrigo da legislação aplicável que rege o acesso à informação e aos documentos administrativos e tornar todo o processo de acesso à informação mais eficiente. Parcialmente implementada- O GRECO recomendou que o procedimento de consulta pública relativo aos decretos-leis seja revisto de modo a garantir que os decretos-leis sejam, em regra, submetidos a consulta pública. Não foi implementada- O GRECO recomendou que (i) fossem introduzidas regras detalhadas sobre a forma como as pessoas encarregadas de funções executivas de topo estabelecem contactos com lobistas e outros terceiros que procuram influenciar o trabalho legislativo governamental e outros. Parcialmente implementada- As informações sobre o recebimento de presentes, ofertas, hospitalidade, convites e outros benefícios por pessoas com funções executivas de alto nível sejam registradas em um registro central e disponibilizadas em tempo hábil ao público. Parcialmente implementada- O GRECO recomendou que (i) restrições pós-emprego semelhantes aplicáveis aos membros do Governo fossem alargadas a todas as pessoas com funções executivas de topo e (ii) fosse estabelecido um mecanismo de execução eficaz. Parcialmente implementada- Foi recomendado a Portugal que requisitos semelhantes de divulgação de rendimentos, património, interesses, incompatibilidades e inabilitações aplicáveis aos membros do Governo fossem alargados a todas as pessoas com funções executivas de topo. Não foi implementada- O GRECO recomendou que (i) a plataforma eletrónica para a apresentação de declarações eletrónicas únicas fosse criada e tornada operacional o mais rapidamente possível. Parcialmente implementada- O GRECO recomendou que, (i) prioritariamente, o funcionamento efetivo da Entidade para a Transparência seja plenamente assegurado, tomando as medidas regulamentares, institucionais e operacionais adequadas e atribuindo os recursos necessários a este órgão, e (ii) as declarações únicas das pessoas com funções executivas de topo sejam sujeitas a verificações substantivas regulares, estabelecendo uma cooperação/interação sólida e eficaz com todos os organismos/bases de dados de controlo relevantes e impondo medidas proporcionadas sanções em caso de violação. Parcialmente implementada .Prevenir a corrupção e promover a integridade nas agências de aplicação da lei- O GRECO recomendou que fossem tomadas novas medidas para reforçar a representação das mulheres a todos os níveis na Polícia de Segurança Pública e na Guarda Nacional Republicana. Parcialmente implementada- O Grupo recomendou que o quadro sobre o acesso à informação policial fosse revisto para tornar a informação mais facilmente disponível, preservando a confidencialidade das investigações em curso pela Guarda Nacional Republicana e pela Polícia de Segurança Pública. Parcialmente implementada- Portugal deve proporcionar uma perspetiva a mais longo prazo sobre medidas institucionais sob a forma de estratégias anticorrupção específicas no âmbito da Polícia de Segurança Pública e da Guarda Nacional Republicana, como complemento aos Planos de Prevenção de Riscos de Corrupção e Crimes Conexos. Não foi implementada- O Código de Ética do Serviço de Polícia fosse atualizado ou que documentos semelhantes fossem adotados para enfrentar os desafios atuais relacionados à prevenção da corrupção e questões de integridade (por exemplo, conflitos de interesse, presentes, informações confidenciais, uso de recursos públicos, atividades acessórias, etc.) e (ii) que tais documentos fossem complementados com orientações práticas e exemplos concretos. Parcialmente implementada- Recomendada a introdução de um mecanismo de aconselhamento confidencial sobre questões éticas e de integridade para o pessoal da Polícia de Segurança Pública e da Guarda Nacional Republicana. Não foi implementada- O GRECO recomendou o reforço dos atuais processos de verificação na Polícia de Segurança Pública e na Guarda Nacional Republicana e a introdução do controlo a intervalos regulares durante as carreiras dos seus funcionários. Não foi implementada- Recomendado que a Polícia de Segurança Pública e a Guarda Nacional Republicana revejam os seus atuais processos de nomeação e promoção de cargos de gestão, com vista a melhorar a objetividade e a transparência desses processos e decisões. Não foi implementada- O GRECO recomendou que a Polícia de Segurança Pública estabeleça regras claras sobre as atividades externas e que tais atividades sejam devidamente registradas e sujeitas a verificações regulares posteriormente. Não foi implementada- O GRECO recomendou que o sistema de doações e patrocínios à Polícia de Segurança Pública e à Guarda Nacional Republicana fosse revisto a fim de (i) criar salvaguardas contra conflitos de interesses reais, potenciais ou percebidos; e (ii) publicar doações e patrocínios on-line regularmente, indicando o valor, a identidade do doador e como os bens doados foram gastos ou usados. Não foi implementada- O GRECO recomendou a realização de um estudo sobre as atividades do pessoal da Polícia de Segurança Pública e da Guarda Nacional Republicana após a sua saída da força e que, se necessário, à luz das conclusões desse estudo, sejam estabelecidas regras para garantir a transparência e mitigar os riscos de potenciais conflitos de interesses a este respeito. Não foi implementada- O GRECO recomendou que o nível de pessoal da Inspeção-geral dos Assuntos Internos fosse aumentado. Não foi implementada- Recomendado que as queixas contra funcionários da Polícia de Segurança Pública e da Guarda Nacional Republicana e as medidas tomadas a este respeito se reflitam em estatísticas centralizadas acessíveis ao público, respeitando o anonimato das pessoas em causa. Parcialmente implementada- Foi recomendado (i) o reforço da proteção dos denunciantes no âmbito da Polícia de Segurança Pública e da Guarda Nacional Republicana, nomeadamente através da criação de canais de denúncia interna; e ii) a realização de atividades específicas de formação e sensibilização sobre as medidas de proteção dos denunciantes a todos os níveis hierárquicos e cadeias de comando. Parcialmente implementada- Recomendada a revisão do regime disciplinar da Polícia de Segurança Pública e da Guarda Nacional Republicana, com vista a excluir qualquer possibilidade de um superior hierárquico decidir sozinho sobre questões disciplinares. Não foi implementada- .“Plano de prevenção de riscos de corrupção" do governo ficou na gaveta