O presidente da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (ANEPC) vai deixar o cargo quando cumpriu apenas um dos três anos da sua segunda comissão de serviço. José Manuel Duarte da Costa, 63 anos, brigadeiro-general do Exército, tomou posse em novembro de 2020, nomeado pelo então ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, depois de ter sido dois anos comandante nacional daquela estrutura..Duarte da Costa parte, no início do próximo ano, para Nova Iorque, onde será conselheiro para a Proteção Civil e Catástrofes junto da embaixada portuguesa nas Nações Unidas para integrar uma equipa especial, que o Governo está a criar, de suporte técnico altamente qualificado à candidatura de Portugal a membro não-permanente do Conselho de Segurança da ONU para o biénio 2027-2028..De acordo com fonte governamental, esta decisão será anunciada hoje, juntamente com o nome do novo presidente, uma escolha que recaiu sobre José Manuel Moura, um civil pela primeira vez desde 2006, que já foi comandante Operacional Nacional da Proteção Civil de 2012 a 2016 (ver nota de perfil ao lado), tendo sido afastado pelo então Governo socialista, quando Constança Urbano de Sousa era a ministra da Administração Interna..O ano seguinte seria trágico, com incêndios devastadores em junho e outubro a causarem 115 vítimas mortais. Moura foi um dos peritos que participou no relatório da Comissão Independente sobre Pedrógão e criticou publicamente a atuação da estrutura de Proteção Civil da altura, liderada pelo coronel Joaquim Leitão. .Críticas à coordenação da ANEPC nos fogos de setembro.A saída de Duarte da Costa acontece antes de serem reveladas publicamente as conclusões do relatório da Agência para a Gestão Integrada dos Fogos Rurais (AGIF) sobre a coordenação operacional dos incêndios que ocorreram em setembro passado, causando nove mortos, entre os quais quatro bombeiros, e mais de 150 feridos, e deixaram 135 mil hectares de área ardida. .Conforme o DN já tinha noticiado, a AGIF está a finalizar a sua avaliação e, tendo em conta algumas divergências conhecidas de visões sobre a forma de atuar entre o ainda presidente da ANEPC e Tiago Oliveira, presidente da AGIF, fontes do setor esperam conclusões críticas ao desempenho da Proteção Civil. .Aliás, no recente comunicado de balanço sobre os resultados do Sistema de Gestão Integrada de Fogos Rurais (SGIFR), no 3.º trimestre de 2024 (final de setembro), a AGIF sublinha que “com um aumento da área ardida de 18% face à média no período homólogo de janeiro a setembro de 2001-2023, é crítico superar as debilidades identificadas e concretizar as melhorias já sinalizadas, também no âmbito da supressão e nos processos de tomada de decisão”..Assinala ainda “a importância de uma abordagem integrada, colaborativa e do reforço do investimento na prevenção - que se foque nas causas (educação e gestão da vegetação) em detrimento de respostas focadas apenas no reforço e prontidão de recursos materiais”, fazendo notar que, “apesar de serem soluções mais fáceis e imediatamente visíveis, normalmente muito dispendiosas, têm um baixo impacto operacional e um baixo retorno económico para o país”.Fica clara a chamada de atenção para as reivindicações de mais meios no combate, designadamente os meios aéreos..Por outro lado, Duarte de Costa entrou também em rutura com o presidente da poderosa Liga de Bombeiros Portugueses, António Nunes. Logo a seguir aos incêndios de setembro, Nunes pediu a cabeça do presidente da ANEPC, fazendo várias críticas à coordenação operacional do combate aos fogos..“Quando temos quatro bombeiros falecidos, três dos quais numa frente de combate que morreram a lutar para salvar vidas e os seus bens, tem de haver responsabilidades e nós não somos daqueles que dizemos que é no fim que se procuram responsabilidades, que não é no momento. Já o disse e volto a dizer, se fosse eu que estivesse à frente da Proteção Civil, independentemente do apuramento de responsabilidades que possa haver, não teria convivido com esta situação. Teria ido embora nesse dia”, afirmou na entrevista DN-TSF a 20 de setembro..Ranger, comando e paraquedista.Era a resposta também às declarações de Duarte da Costa, igualmente numa entrevista DN-TSF, em maio passado, discordando de uma das reivindicações que a Liga de António Nunes mais tem defendido, que é a criação de um comando próprio de bombeiros, tal como a GNR e a PSP. Para Duarte da Costa “os bombeiros voluntários, ainda não estão organizados para que haja um comando efetivo de bombeiros”. A resposta da Liga não se fez esperar, com António Nunes a classificar de “desrespeito”..Militar de mão-cheia do Exército, paraquedista, comando e ranger, com o curso feito nos Estados Unidos da América, além do mestrado da Academia Militar, possui o MBA da Universidade Católica Portuguesa e o mestrado em Relações Internacionais e Ciência Política da Uni- versidade Lusíada. Tem cursos de Planeamento de Operações Psicológicas da NATO School e de Contrainsurreição da International Security Assistance Force (ISAF), força da NATO para o Afeganistão, onde comandou a Força Nacional destacada em Cabul. .Passou ainda pelo teatro de operações na Macedónia, foi professor de Estratégia em Angola e, durante três anos, Intel Section chief da Eurofor, em Itália. .Em Portugal, comandou a Brigada Aerotransportada, foi chefe do Estado-Maior da Brigada de Reação Rápida, comandante da Escola de Paraquedistas e das Forças Terrestres. Passou também por Belém, onde, ainda capitão, foi adjunto de Jorge Sampaio, e foi assessor de Augusto Santos Silva quando era ministro da Defesa Nacional..Um ano depois de ter tomado posse como presidente da ANEPC, dizia sobre ele, ao DN, o anterior presidente da Liga, Jaime Marta Soares: “Numa escala de 1 a 20 merece mesmo o 20. É um gentleman. É certo e sabido que a ANEPC tem tido altos e baixos nas suas lideranças, com destaque para a área da presidência. Houve pessoas extraordinárias e houve pessoas intratáveis e intragáveis. O general Duarte Costa, como comandante nacional e agora como presidente, é uma lufada de ar fresco. Uma pessoa de grande dimensão, com uma nova postura, uma grande capacidade de diálogo para a procura de soluções para os problemas.”.José Manuel Moura: de novo um civil à frente da Proteção Civil.A Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (ANEPC) volta a ter um civil na presidência, 18 anos depois do sociólogo Manuel João Ribeiro ter liderado este serviço. José Manuel Moura foi comandante Operacional Nacional entre 2012 e 2016 e é um perito internacional certificado pelo Mecanismo Europeu de Proteção Civil e pelas Nações Unidas..Segundo o seu curriculum oficial da última nomeação em 2016, participou “em várias missões internacionais no âmbito da proteção e socorro, como perito em avaliação e coordenação e como team leader, participou ainda em visitas técnicas, em cursos de certificação internacional como formando, como formador internacional, em exercícios internacionais, em fóruns e programas internacionais, em vários países”..Tinha antes sido comandante Operacional Distrital de Leiria e professor no Instituto Politécnico de Leiria, lecionando no 3.º ano da Licenciatura de Proteção Civil desde 2006 e na Pós-Graduação em Trauma e Emergência da Escola Superior de Saúde do Instituto Politécnico de Leiria. Tem 61 anos.