O Programa Nacional para as Infeções Sexualmente Transmissíveis e VIH/Sida (PNISTVIH) está sem diretor há dois anos, mais precisamente desde que a anterior diretora, Margarida Tavares, assumiu funções como Secretária de Estado para a Promoção da Saúde na equipa do ministro Manuel Pizarro, em setembro de 2022. Para quem é ativista e doente, como Luís Mendão, tal “não é aceitável”. “Um problema desta dimensão tem de ter uma liderança. Sem esta é absolutamente impossível saber-se para onde estamos a ir e que caminho nos falta percorrer”, defendeu ao DN. Luís Mendão, presidente do GAT (Grupo de Ativistas em Tratamento), alerta mesmo para o facto de “haver ainda tanto fazer em relação ao HIV/Sida”, e que se continuarmos sem nada fazer para aumentar a prevenção da incidência, o país não conseguirá atingir as metas definidas pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 2030, altura em que poderemos ter também “mais de 75 mil doentes em tratamento”..O DN questionou a Direção-Geral da Saúde (DGS) para saber porque é que, neste entretanto, ainda não foi nomeado um diretor para o programa nacional e que implicações teve a situação na concretização do programa e a resposta foi: “Está a ser preparada a entrada de uma nova direção em funções dentro em breve”, sem especificar datas. Mas que “enquanto se aguarda pela nova direção, o programa e os seus elementos continuam a desenvolver um amplo trabalho, não saindo prejudicadas ou condicionadas as suas competências”, referindo o relatório de 2023, publicado esta semana, como um dos trabalhos deste último ano. Embora, este seja o documento, que está a ser criticado por quem está no terreno, por ter escolhido destacar “os indicadores positivos” e não mostrar que “o país vive uma situação séria e complexa”, argumenta o presidente do GAT..A ex-diretora do programa e ex-secretária de Estado, Margarida Tavares, explica ao DN, salvaguardando não quer desenvolver polémicas, que teve “uma razão para não nomear logo alguém de seguida”, pois “estava nos nossos planos fazer uma grande remodelação dos programas prioritários da Saúde, mas isso exigia que existisse um novo diretor-geral da Saúde, e o processo de substituição da dr.ª Graça Freitas foi longo, e quando finalmente a nova diretora-geral tomou posse, o governo caiu e passámos a estar em gestão, pelo que já não houve oportunidade de fazer a dita remodelação dos programas”. .Mas concorda que “um programa precisa de liderança”, embora, sublinhe também, que “mais importante do que um diretor é o próprio programa ter um a estrutura com meios e com capacidade de ação, o que não acontece. E é muito frustrante para um diretor, como o foi para mim. Sei que me deram as condições que podiam dar, mas, por exemplo, não podia sequer contratar pessoas só dedicadas ao programa”. No fundo, assume, eram estas situações que “gostaria de ter alterado”..A médica é de opinião que existem “muitos programas prioritários para a Saúde” e a ideia era, de facto, “reduzi-los em número. Não quer dizer que os outros não fossem programas de saúde, são, mas não eram prioritários. Portanto, reduzir o número e dar-lhes mais meios para uma atuação muito mais efetiva, porque se há necessidade de priorizar aquele problema, é porque há ali coisas para resolver de forma particular e mais intensiva, era o que se pretendia”. Mas não houve tempo para o fazer..Do lado dos doentes, e apesar de a DGS dizer que os trabalhos não têm sido prejudicados, Luís Mendão, que é um dos doentes mais antigos do país em tratamento, foi diagnosticado em 1996, é urgente avançar-se com medidas de prevenção, que já estão definidas em portaria e que ainda não saíram do papel, como a profilaxia de prevenção (PrEP) chegar a mais pessoas. “A infeção está a tingir sobretudo os grupos mais jovens de Homens que fazem Sexo com Homens, entre os 25 e os 29 anos e o grupo de homens heterossexuais com mais de 50 anos”, segundo o relatório da DGS. Ora, é preciso reduzir a incidência, portanto “é preciso um compromisso político para resolver os problemas do VIH/Sida”. É preciso “uma estratégia e isso implica haver um programa nacional e um diretor que o concretize”, defende. .Como ex-diretora e como médica especialista na área das IST e VIH/Sida, Margarida Tavares concorda que, neste momento, o principal é conseguirmos reduzir a incidência da doença e para isto é fundamental uma liderança, mas, recorda, no tempo em que esteve como secretária de Estado, e sem ninguém oficialmente à frente do programa, fez-se “algo muito importante”, que foi legislar de forma “a permitir que as organizações de base comunitária, que são parceiros fundamentais no terreno porque conhecem de forma particular as populações-chave, entre as quais os homens que têm sexo com homens, mas não só, também os trabalhadores de sexo, os migrantes, pudessem ter meios para fazer a PrEP nas suas instalações, com os seus médicos e no seu ambiente. E isto ficou resolvido, apenas não está implementado e já poderia estar”..Ou seja, neste momento, o que falta “é apenas dizer, faça-se, porque a lei está e foi tudo parametrizado”. Para a médica, a profilaxia de prevenção, a PrEP, “é uma ferramenta poderosíssima, mas, neste momento, estamos com problemas gravíssimos relativamente ao seu acesso por parte dos utentes”. O mesmo alerta é lançado pelo presidente do GAT, que defende que “o VIH/Sida tem de ser um desafio para a DGS e para a política de Saúde”, porque o país vive uma situação séria e complexa”..Neste dia, e 41 anos depois da descoberta do vírus Portugal soma 68 627 casos de VIH, dos quais 23 955 atingiram o estadio de sida. Neste período, o país perdeu 15 918 pessoas. Em 2023, houve 924 infeções, menos 65 do que no ano anterior, morreram 111 pessoas da doença. Mas se o acesso à prevenção não for aumentado, daqui a cinco anos poderemos ter muitos mais doentes em tratamento, alerta quem está no terreno .