1.ª consulta das gémeas foi pedida pela secretaria de Estado da Saúde

A revelação foi de Ana Paula Martins, presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar Lisboa Norte, que já foi notificada pelo DIAP para ser ouvida no inquérito ao caso das gémeas. Santa Maria gastou 16M€ com 10 doentes.
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A auditoria do Hospital Santa Maria confirmou que a primeira consulta das gémeas luso-brasileiras foi pedida pela secretaria de Estado de Saúde por telefone. A revelação foi feita pela presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar Lisboa Norte (CHLN), Ana Paula Martins, que esta quarta-feira está a ser ouvida na Comissão de Saúde, no Parlamento.

Aos deputados, Ana Paula Martins adiantou que já foi notificada pelo Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) para ser ouvida no inquérito ao caso das gémeas luso-brasileiras tratadas no Santa Maria.

A marcação de uma primeira consulta no hospital de Santa Maria pela secretaria de Estado da Saúde foi a única exceção ao cumprimento das regras, conclui a auditoria interna ao caso das gémeas luso-brasileiras ali tratadas.

Segundo o relatório da auditoria interna pedida pelo Conselho de Administração do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte (CHULN), os controlos internos de admissão, tratamento e monitorização dos tratamentos a crianças com atrofia muscular espinhal entre 2019 e 2023 foram respeitados, à exceção da "referenciação de dois doentes para a primeira consulta de neuropediatria".

Segundo disse a presidente do CA do CHULN, que está a ser ouvida na Comissão Parlamentar de Saúde, sobre o "alegado favorecimento de duas bebés gémeas, que sofrem de Atrofia Muscular Espinhal, no acesso ao tratamento com o medicamento Zolgensma", a exceção envolve dois doentes que foram referenciados ao departamento de pediatria pela secretaria de estado da Saúde, "segundo registo clínico", com uma consulta marcada pelo telefone.

Sobre as 10 crianças tratadas desde 2019 pelo Hospital Santa Maria, Ana Paula Martins explicou que oito foram enviadas (referenciadas) por unidades funcionais do respetivo Agrupamento de Centros de Saúde ou por outras instituições do Serviço Nacional de Saúde e duas pela Secretaria de Estado da Saúde.

Segundo disse, todas têm nacionalidade portuguesa e residência em Portugal, o que na altura da administração do medicamento é condição para que possam ser monitorizadas.

Esclareceu ainda que, a partir do momento em que entram para uma consulta, toda a avaliação é médica e que a prescrição de andarilhos, cadeiras e todos os necessários sistemas ventilatórios especiais que o SNS custeia é "tudo foi feito de acordo com a melhor arte médica".

"O hospital fez o mesmo para todas, de acordo com o que os médicos prescreveram", disse.

Já quanto ao tratamento das gémeas, Ana Paula Martins disse que o Conselho de Administração "quer crer que não ocorrem no CHULN tratamentos que não seja objetivo de validação favorável clínica".

A presidente do CA do CHULN alertou para a necessidade de ser a tutela a definir quais os medicamentos que os hospitais podem e devem dar a todos os portugueses.

Questionada sobre quem fez a marcação da primeira consulta das gémeas luso-brasileiras via telefone por parte da Secretaria de Estado da Saúde, Ana Paula Martins disse que a auditoria apenas apurou o que consta de documentos e esclareceu: "O que não está escrito nós não sabemos".

"Admito que outras auditorias e outras avaliações possam ter esse tipo de informação, por conterem declarações", acrescentou.

Sobre a forma de pagamento do medicamento inovador Zolgensma, disse que é através de um "acordo de risco partilhado" entre o Infarmed e o laboratório, "baseado em resultados de vida real, monitorizados (...) e com pagamentos faseados durante os primeiros quatro anos a contar do início do tratamento, variando "consoante os resultados do tratamento".

"É em função disto que as crianças são monitorizadas. Se houver resultados positivos é paga a tranche, se não houver, não é paga e a empresa que acarreta com o custo", explicou.

Numa resposta enviada à Lusa, o Infarmed explicou igualmente, em relação ao preço do medicamento Zolgensma, que "após o processo de financiamento (negociação com o laboratório de forma a garantir as melhores condições para o SNS, permitindo o acesso a todos os cidadãos que necessitem do medicamento), o preço ficou substancialmente mais baixo do que o indicado nas recentes notícias".

"O valor negociado e aprovado com a decisão de financiamento foi aplicado aos doentes que já tinham utilizado o medicamento até esse momento", acrescentou.

Segundo disse, o pagamento é feito "através de um contrato de partilha de risco assente no tipo de doente e no resultado clínico, e é feito num prazo de quatro anos".

"Ou seja, após o pagamento de uma primeira percentagem (anual), se a criança não apresentar as melhorias expectáveis, não existirá lugar à continuação do pagamento do medicamento por parte das unidades hospitalares", clarificou.

O Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte tratou 10 crianças com atrofia muscular espinhal desde 2019, com um custo total superior a 16,4 milhões de euros, revelou o Conselho de Administração (CA).

Segundo André Trindade, do CA do CHULN, que falava numa audição na Comissão Parlamentar de Saúde, todos os casos passaram pelo processo normal da comissão de farmácia e terapêutica e Infarmed.

Questionado sobre de onde vinham os casos recebidos, o responsável disse que as referenciações variam desde o Hospital São Francisco Xavier, CUF, Hospital Espírito Santo (Açores), Hospital São Francisco Xavier, Garcia de Orta, USF da Póvoa do Varzim, Hospital Fernando da Fonseca e Instituto Nacional de Saúde Professor Doutor Ricardo Jorge (INSA), além dos dois casos das gémeas cuja primeira consulta foi pedida pela Secretaria de Estado da Saúde, via telefone, segundo a auditoria interna do CHULN.

Sobre os valores pagos, com IVA, o responsável disse que os 10 doentes representam um custo total 16,4 milhões de euros do orçamento do Hospital de Santa Maria.

Desse total, 12,4 milhões de euros já estão pagos e cerca de quatro milhões estão a pagamento.

O antigo secretário de Estado da Saúde, Lacerda Sales, terá reunido mais do que uma vez no Ministério da Saúde com Nuno Rebelo de Sousa, filho do Presidente da República, antes do tratamento das gémeas, numa altura em que o processo decorria no hospital de Santa Maria, segundo noticiou a TVI.

Porém, Lacerda Sales diz que não se recorda das reuniões nem de ter pedido a primeira consulta para as gémeas naquela unidade hospitalar.

O caso está a ser investigado pela Inspeção-Geral das Atividades em Saúde.

O caso envolve duas crianças gémeas residentes no Brasil que entretanto adquiriram nacionalidade portuguesa e vieram a Portugal em 2019 receber o medicamento Zolgensma para a atrofia muscular espinhal, com um custo total de quatro milhões de euros, e foi divulgado pela TVI, em novembro, que denunciava uma alegada interferência do Presidente da República.

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