A Polícia Judiciária (PJ) deteve, para cumprimento de pena, a agente de execução Aurora Boaventura, acusada de desviar indevidamente uma quantia superior a 170 mil euros. Esta não é, no entanto, a primeira vez que lhe são aplicadas medidas de coação: em 2016 já tinha sido condenada a prisão domiciliária por suspeitas de desvio de cerca de 2,5 milhões de euros..Agora, a solicitadora foi condenada pelos crimes de peculato e branqueamento de capitais, com uma pena de sete anos e meio de prisão efetiva. Os crimes foram “praticados em 2015” e a condenação transitou em julgado em 2023. Desde então, Aurora Boaventura estava “em parte incerta”, segundo a PJ..De acordo com a acusação feita pelo Ministério Público (MP), a que o DN teve acesso, a solicitadora chegou a ter mais de oito mil processos de execução atribuídos. A condenação diz respeito a 132, mas, segundo apurou o DN junto de fonte da Polícia Judiciária, tal não significa que a pena não possa ser agravada - isto porque pode não ter sido possível apurar, ainda, os montantes dos outros casos..Naqueles que o MP invoca na acusação, o modus operandi era simples: a solicitadora manipulava o Sistema Informático de Suporte à Atividade dos Agentes de Execução (SISAAE), “ficcionando a conciliação de movimentos a débito e a crédito”, conseguindo até contornar o Identificador Único de Pagamento (IUP), que consiste numa ordem de pagamento que possibilita ao agente de execução o movimento a crédito das contas-clientes de que é titular..Mesmo “ciente destas regras”, indica o MP, Aurora Boaventura decidiu apoderar-se de parte das quantias “em proveito próprio, como efetivamente fez e conseguiu”. Tê-lo-á feito desde 2005 até fevereiro de 2016, aponta a acusação..Aurora Boaventura, aponta o MP, “agiu com a intenção de fazer seus e/ou de terceiros” um total de 170 096,02 euros, violando deveres “que sobre si impendiam, nomeadamente de legalidade”..À data dos factos, a arguida era titular de cinco contas bancárias profissionais, destinadas ao depósito de verbas para pagar aos credores dos executados e cobrir os encargos processuais. Foi destas contas que Aurora Boaventura desviou os montantes, ao decidir não associar “parte significativa dos mesmos a processos de execução e, de seguida, transferi-los para contas tituladas por si ou por terceiros”, fazendo isso através da alteração dos Números de Identificação Bancária (NIB)..A investigação, que resultou na detenção da solicitadora, foi complemento de uma outra, sobre o ex-presidente da Câmara de Solicitadores, Gomes da Cunha, que também já tinha sido condenado por se apropriar indevidamente de mais de meio milhão de euros de clientes, alegadamente, “para saciar o seu vício do jogo em casinos”..Depois da detenção, em 2016, o DN noticiava que, já nessa altura, havia suspeitas “mais fortes” que recaíam sobre Aurora Boaventura. Aí havia suspeitas também do crime de falsidade informática, pelo qual a agente de execução não foi agora condenada..CGD levantou suspeitas sobre movimentos.A investigação sobre o caso, que resultou nestas duas condenações, começou no último trimestre de 2015. E foi graças à Caixa Geral de Depósitos que tudo começou, com o banco a detetar movimentos suspeitos feitos por Aurora Boaventura..Em 2016, foi então condenada a prisão domiciliária e teve imóveis arrestados por ordem do Ministério Público e saldos bancários apreendidos para tentar cobrir parte da verba de que se apropriara. Estes são apenas dois casos numa lista que, já então, tinha levado a Ordem dos Solicitadores a expulsar vários membros..Com Valentina Marcelino