Quando se lhes pergunta há quanto tempo se conhecem, riem-se e dizem que há mais de 50 anos. Mas não. Voltam a rir e desfazem o equívoco. "Foi a pandemia que nos uniu", atira Filipe Froes, de 61 anos, médico pneumologista, intensivista e ex-coordenador do Gabinete de Crise para a Covid-19 da Ordem dos Médicos. Patrícia Akester, de 51, jurista especialista em propriedade intelectual, sobretudo na área do direito de autor, inteligência artificial e direitos humanos, complementa: "Conhecemo-nos em outubro de 2020, numa sessão no Grémio Literário sobre a pandemia". Filipe especifica: "Eu fiz uma palestra no Grémio, tinha sido convidado por um antigo cirurgião torácico do meu hospital, o Dr. Pinto Marques, e no final a Patrícia fez-me uma série de perguntas sobre a pandemia". Patrícia ri-se e confessa mesmo: "Eu quase que o 'grelhei' com perguntas"..A conversa, na manhã de sábado, começa assim, informal, em lazer, e sem frases feitas. O objetivo era relatar o outro lado da pandemia, aquele que também os tocou e lhes trouxe, além do conhecimento, satisfação e reconhecimento pessoal. E este lado, para Patrícia Akester e Filipe Froes, foi a viagem pela escrita, em estilo de crónica, nas páginas do Diário de Notícias, com "total liberdade na escolha dos temas e até de prazos - em 18 meses publicámos 33 crónicas, entre dezembro de 2020 e junho de 2022", comenta o médico..Uma viagem na qual embarcaram inesperadamente, sem saber onde iria terminar. "Éramos para escrever só uma crónica, mas depois continuámos e já vamos em 40", destaca Patrícia, que, a solo, já escrevia crónicas sobre o direito e a pandemia no jornal de economia Dinheiro Vivo. "Foi o Filipe que teve a ideia de fazermos uma crónica a quatro mãos", para juntar o saber e a força do Direito ao conhecimento da Saúde..Destaquedestaque"A Pandemia que revelou outras Pandemias: Contributos para o Conhecimento", com prefácio do almirante Gouveia e Melo, é lançado hoje e distribuído gratuitamente amanhã, quarta e quinta-feia com a edição em papel do DN.o almirante Gouveia e Melo e a obra tem ainda a chancela do DN, da Sociedade Portuguesa de Pneumologia, "o que comprova a objetividade e evidência científica com que abordámos os temas", concordam, e o patrocínio do laboratório Bial..Aos poucos, um e outro vão desfiando o percurso feito até ao fim, até ao livro, de quase 100 páginas, que será lançado hoje numa sessão onde tudo começou, o Grémio Literário, em Lisboa, pela 16:00, e com o título A Pandemia que revelou outras Pandemias: Contributos para o Conhecimento. O prefácio é do almirante Gouveia e Melo e a obra tem ainda a chancela do DN, da Sociedade Portuguesa de Pneumologia, "o que comprova a objetividade e evidência científica com que abordámos os temas", concordam, e o patrocínio do laboratório Bial..Uma obra em livro - a ser distribuído gratuitamente com a edição em papel do DN amanhã, quarta e quinta-feira - que acreditam que ficará para memória futura, "como pequeno legado", e porque o objetivo a cada nova crónica foi sempre o de "esclarecer a população - quer fosse sobre a doença, hesitação vacinal ou sobre como as novas ferramentas do combate à covid encaixavam ou não no Direito, e sem violar direitos fundamentais. "Não nos limitámos a esclarecer, fomos mais longe e sugerimos, fizemos recomendações, não pela via da crítica, mas com uma visão construtiva", refere a jurista..Quando olham para trás, não têm dúvidas de que, no meio de tantos inconvenientes que a pandemia trouxe, se houve vencedores estes foram a ciência e os direitos humanos. "A ciência foi a grande vencedora, quer em sede de organização e planeamento, quer na solução pela via da vacina e até pelas medidas de intervenção não farmacológica, que foram determinantes para se ganhar tempo e salvar vidas até haver uma solução", argumenta Filipe Froes..Patrícia Akester considera que no Direito, embora com outra dimensão, também "houve uma vitória no mundo ocidental em termos de privacidade, percebeu-se que havia várias aplicações de foro tecnológico que não poderiam ser implementadas como se antevia, pois levariam à ingerência da privacidade das pessoas, e conseguiu-se trabalhar para que tal não acontecesse - caso do certificado digital. E isto foi uma vitória em termos de direitos fundamentais", acrescentando mesmo que "esta foi das situações mais bem aplicadas em termos jurídicos, que ajudou a controlar a doença"..Do ponto de vista pessoal, ambos concordam que esta viagem pela escrita foi "uma complementaridade do conhecimento". O conhecimento de ambos em áreas tão distintas obrigou-os, no caso de Filipe Froes, "a refletir, a repensar algumas posições e a confrontá-las com a opinião de uma jurista"..No caso de Patrícia, que diz nunca ter sido "um ser passivo, sempre fui espírito crítico, gosto de pensar nas coisas e de questionar. A minha vida é feita na academia e o mais importante na academia não é responder, porque a resposta que se dá hoje pode ser invalidada daqui a dias, meses ou anos. O mais importante é o formular-se questões importantes e acho que foi isso que eu e o Filipe conseguimos neste trabalho, quer com as questões da saúde que colocámos, quer com as do lado mais económico, social e jurídico"..A primeira crónica foi publicada a 26 de dezembro de 2020, o título: "2021 Ano Vacina. Por um punhado de dólares e 13% da população mundial", seguiram-se outras sobre os direitos humanos no acesso à vacinação, como "Para o vírus não existem nem israelitas nem palestinianos, mas apenas fontes de contágio", ou sobre a hesitação vacinal, desinformação, vinda de muitos lados, até por parte de líderes mundiais, danos punitivos ou sobre a politização do discurso da saúde e liberdade de imprensa..Ou seja, como dizem, fizeram uma "interceção pela democracia", pelas próprias preocupações, "no meu caso uma das primeiras foi pensar como se poderia conjugar o direito à propriedade intelectual ao acesso de todos à vacina", sublinha a jurista, para explicar à população com evidência e fundamentação a realidade que se vivia. "Depois de os temas estarem definidos, a escrita era rápida. Chegámos a escrever duas crónicas numa semana", aponta o médico, explicando que o que fez foi "antecipar situações e dúvidas que surgiam com a evolução da doença"..Quando chegou o momento de escolher o autor do prefácio não houve hesitação. Para Patrícia "tinha de ser uma pessoa que admirássemos, com ética e voz isenta, que assumiu um compromisso com a pátria como não se vê há muito tempo". Para Filipe Froes: "Tinha de ser a pessoa que devolveu a honra e o esplendor nacional à vacinação da população portuguesa". A pessoa é o almirante Gouveia e Melo, ex-coordenador da Task Force para a Vacinação, que diz "ter sido uma honra" participar na obra.