"A nossa intenção é conseguir identificar situações de discriminação na classe médica e criar um espaço onde os profissionais se sintam à vontade para expressar as suas preocupações.” É desta forma que o médico Rafic Nordin, coordenador da Comissão para a Igualdade da Ordem dos Médicos (CIOM), explica ao DN o objetivo deste órgão recentemente criado. “Vamos ser 14 médicos, de norte a sul do país, que, acima de tudo, querem defender e sensibilizar os profissionais e a própria população para um dos valores intrínsecos da prática médica que é, a igualdade”. E como sublinha: “Um valor que vem reforçar políticas que proíbem a discriminação, seja qual for, de género, raça, económica, cultural, de incapacidades, orientação sexual, identidade e até de nacionalidade.”O regulamento da CIOM foi aprovado pelo Conselho Nacional da Ordem no dia 18 de novembro e o objetivo é que esta comece a funcionar o mais breve possível, com a apresentação de um plano de ação bianual. Segundo refere o documento a que o DN teve acesso, à CIOM caberá “elaborar recomendações sobre boas-práticas em matéria de igualdade e inclusão, emitir pareceres técnicos perante exposições de casos concretos, em colaboração com o Gabinete Nacional de Apoio ao Médico e ainda elaborar e colaborar em estudos e documentos de planeamento de suporte à decisão política, na área da identificação e erradicação de formas de discriminação”.De acordo com o documento, a CIOM funcionará como “órgão consultivo do bastonário, visando a promoção da igualdade e não-discriminação no exercício da profissão médica e de uma cultura institucional de respeito, de equidade e de inclusão, assumida como imperativo ético-deontológico e uma exigência civilizacional”.Quanto ao sentido da sua missão, Rafic Nordin específica ainda que, nos tempos que se vivem hoje, “é um dever da ordem promover a igualdade entre os profissionais no contexto da prestação de cuidados de saúde”, sobretudo porque “o exercício da profissão médica está alicerçada nos valores da promoção da cidadania e da igualdade e não da discriminação, da intolerância e da exclusão. É preciso eliminar todas estas formas de discriminação”.Sobre o porquê da criação desta comissão nesta altura, e se tal tem a ver com situações que têm chegado à Ordem, o coordenador da CIOM explica: “Surge porque a Ordem, neste momento, não tem um estudo ou análise detalhada sobre discriminação na profissão e é isso que queremos saber, ouvindo os profissionais e vendo o que podemos fazer para minimizar tais situações.” Por exemplo, destaca Rafic Nordin, “temos médicos estrangeiros a exercerem no nosso país e não podemos deixar que sejam discriminados.”.Assédio laboral na classe médica. Do silêncio à denúncia existem "anos de sofrimento".Mas não é só: os números oficiais indicam que há também cada vez mais profissionais de saúde, como médicos, vítimas de violência no exercício da sua atividade. “Isto é muito preocupante, temos de estar atentos e fazer algo para ajudar a resolver estes problemas.” Até porque, alerta, “dada a situação que vivemos na área da Saúde, pela falta de médicos, não nos podemos dar ao luxo de que profissionais comecem a sair do país para irem exercer a sua atividade noutros locais onde consideram que o podem fazer com mais liberdade e sem discriminação. Esta é uma das situações pelas quais esta comissão tem de zelar”.Rafic Nordin chama ainda a atenção para o facto de hoje poderem ser possíveis “situações de discriminação multifatoriais” e que tanto a classe como as instituições têm de estar preparadas para lidar com elas. “Imagine um médico/médica com uma orientação sexual LGBT, sendo já uma pessoa de outra raça (que não a caucasiana) e já com uma deficiência física ou outra incapacidade. Há uma variedade de fatores que podem levar à discriminação e daí ser obrigação da ordem apoiar e educar para a cidadania entre profissionais e a população”.Por isso mesmo, recorda o médico, algumas das atribuições da CIOM visam “promover e apoiar políticas de cidadania, especificamente de inclusão, na área da saúde; promover e apoiar a educação para a cidadania, relativamente à identificação das situações de discriminação e das suas formas de erradicação e propor medidas e desenvolver ações de intervenção contra todas as formas de discriminação.”Mas a criação desta comissão é também uma forma de a Ordem estar em linha com “os objetivos da Estratégia Nacional para a Igualdade e a Não Discriminação - que integra os Planos Nacionais de Igualdade entre Mulheres e Homens, da Prevenção e Combate à Violência Contra as Mulheres e a Violência Doméstica, de Combate à Discriminação em razão da Orientação Sexual, Identidade e Expressão de Género, e Características Sexuais -- e da Estratégia Nacional para a Inclusão das Pessoas com Deficiência e do Plano Nacional de Combate ao Racismo e à Discriminação".Para o coordenador da CIOM "o mais importante é estarmos atentos ao que se passa nos dias de hoje”, até para “propomos parcerias com instituições e organizações que contribuam para o avanço das políticas de igualdade no setor da saúde, bem como apoiar medidas, projetos ou ações que promovam objetivos coincidentes com os nossos”.