Opus Dei em Portugal com um "empurrão" da irmã Lúcia

Opus Dei comemora 75 anos de presença em Portugal e vai preparar a participação na Jornada Mundial da Juventude, que vai decorrer em Lisboa, entre 1 e 6 de agosto de 2023.
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A comemorar os 75 anos de presença em Portugal, a história do Opus Dei no país começou em fevereiro de 1945, quando o fundador da Obra, Josemaria Escrivá, visitou Braga, Porto, Coimbra, Leiria e Lisboa.

A irmã Lúcia, vidente de Fátima, terá sido a responsável por esta viagem de Escrivá.

Na sua página na Internet, o Opus Dei dá conta de que Lúcia se encontrava num convento em Tui, quando o bispo local quis que Josemaria Escrivá a conhecesse.

"A conversa foi providencial, uma vez que a irmã Lúcia pediu insistentemente ao fundador que fosse a Portugal, para poder assim apressar os começos do trabalho do Opus Dei em terras portuguesas. A viagem está nos seus planos apostólicos, mas não naquele momento, entre outras coisas porque não tinha passaporte. Mas isso não foi um obstáculo, pois, com um telefonema para Lisboa", Lúcia obteve para Josemaria e para os que o acompanhavam a autorização necessária.

Ainda segundo o Opus Dei, "um ano depois chegavam a Coimbra vários membros do Opus Dei em estudos de pós-graduação, montando uma residência universitária nessa cidade. Posteriormente seria a vez do Porto (1948) e Lisboa (1951)".

Até 1972, Josemaria Escrivá (que João Paulo II beatificou em 1992 e canonizou em 2002) "voltaria com frequência a Portugal, que também o atraía particularmente por Fátima".

Hoje, em Portugal, a Prelatura conta com 1625 fiéis, distribuídos por todas as zonas do continente, Madeira e Açores, e existem centros em Braga, Porto, Miramar, Viseu, Coimbra, Lisboa, Montemor-o-Novo e Ponta Delgada.

Os 75 anos estão a ser assinalados por diversas dioceses do país com uma exposição itinerante, que já passou por Lisboa, Cascais, Viseu, Braga e Porto, e passará ainda pelo Montijo (novembro), Algarve e Açores (dezembro), Évora (janeiro de 2022) e Fátima e Lisboa (fevereiro de 2022).

A mostra, segundo o Opus Dei, visa dar a conhecer "a história de fé e entrega, trabalho e alegria (...) que se desenrolou até aos dias de hoje, e se abre ao futuro".

A exposição consta de 14 painéis e de alguns objetos através dos quais se contam os principais momentos da história desta instituição da Igreja Católica.

A Prelatura, que conta com uma única paróquia em Portugal -- Paróquia de Nossa Senhora da Porta do Céu, em Telheiras, Lisboa -- viu ainda o aniversário ser assinalado com a edição do livro "O fundador do Opus Dei em Portugal", de monsenhor Hugo de Azevedo, e com a reedição de "Amigos de Deus", de Josemaria Escrivá. Há também a perspetiva de, até fevereiro de 2022, serem reeditados o "Caminho", o "Sulco" e a "Forja".

Olhada frequentemente como uma das organizações com maior influência na sociedade portuguesa, nomeadamente entre a elite católica, o Opus Dei tinha, no início deste ano, apenas 1.625 membros em Portugal, 75 anos depois de ter chegado ao país.

Aparente ou real, a influência propalada parece não influir na gestão da "Obra de Deus" por parte do vigário regional, monsenhor José Rafael Espírito Santo, engenheiro civil que se deixou conquistar pelo serviço à Igreja.

"A realidade é outra. O Opus Dei é mais uma entre todas as realidades da Igreja Católica e como todas elas quer ter uma influência religiosa para bem da sociedade", diz José Rafael em entrevista por escrito à Lusa, acrescentando que "a fé influencia tudo" e "só as pessoas mais influenciadas por Deus -- os santos -- é que foram verdadeiramente transmissores desta influência".

O vigário regional do Opus Dei rejeita, por outro lado, qualquer influência além da religiosa: "À parte essa influência da fé, para a Igreja é hoje fundamental, no exato sentido de que 'constitui um fundamento', o respeito pela liberdade de opinião e pela autonomia de atuação dos cristãos em tudo o que não é de fé. É muito de saudar que haja pluralismo de convicções e opções. E é muito de censurar servir-se do pretexto religioso para fins não religiosos. Este aspeto é intrínseco ao modo de ser e de atuar do Opus Dei".

"Sei que há quem faça (...) leituras (...) contrárias ao que acabo de dizer. Continuaremos a tentar esclarecer", diz, lamentando que "em Portugal, muito mais que na maioria dos países", o Opus Dei seja "muitas vezes referido em público por pessoas sem qualquer relação direta com a instituição, criando um problema de comunicação pouco habitual que se caracteriza por uma notoriedade da instituição muito maior do que seria natural para a dimensão que tem".

Destaquedestaque"O Opus Dei é uma mensagem dirigida a todos, e é, além da mensagem, uma instituição que reúne as pessoas que sentem, por parte de Deus, o apelo a viver esta mensagem"

Dos 1.625 membros, segundo dados disponibilizados pelo próprio vigário, a maioria são mulheres -- quase o dobro do número de homens -- e mais de 1.100 são casados ou solteiros sem compromisso de celibato. O Opus Dei conta também com 89 padres em Portugal. Existem ainda cerca de 3000 cooperadores, que não pertencem ao Opus Dei, e podem não ser católicos, nem crentes, mais apoiam o serviço que o Opus Dei presta.

"O Opus Dei é uma mensagem dirigida a todos, e é, além da mensagem, uma instituição que reúne as pessoas que sentem, por parte de Deus, o apelo a viver esta mensagem. Por se dirigir a todos, as atividades de formação católica que o Opus Dei organiza são abertas e não estão reservadas aos membros, nem carecem de convite prévio", explica o padre José Rafael Espírito Santo, contrariando a imagem de algum secretismo que, habitualmente se "cola" à Prelatura.

Quando há 75 anos, o farmacêutico espanhol Francisco Martinez, de 24 anos, chegou a Portugal para iniciar o caminho do Opus Dei no país, o objetivo era o mesmo que a instituição tem hoje, ou seja, "tornar presente a Igreja Católica pela difusão da mensagem de que aos olhos de (...) Deus a vida do cristão comum, talvez rotineira, tem muito valor".

"Vejo três notas nestes 75 anos: o amadurecimento, feito de acertos e desacertos; a contínua atualidade da mensagem da santificação do trabalho e da vida corrente, tanto mais urgente e necessária quanto maior vem sendo o esquecimento de Deus nesta sociedade apressada; e a crescente perceção do contributo desta instituição no contexto da Igreja Católica", afirma o vigário, para quem faz todo o sentido, face ao frenesim quotidiano, apostar na "santificação do trabalho".

"Sabendo que (...) Jesus trabalhou, viveu a sua condição de cidadão servindo os outros com o seu trabalho, e necessariamente trabalhou bem, teremos cada vez mais, e só, razões para fazer as coisas do melhor modo possível, com desejos de servir os outros e o bem comum. E podemos oferecê-las a Deus, que é mais ou menos o mesmo que faz quem dedica um livro, um feito, um golo, ou uma vitória", explica.

Uma das imagens frequentemente associada ao Opus Dei prende-se com as mortificações corporais, como o uso do cilício.

"Para o cristão comum, cumprir os deveres diários, manter a boa qualidade das relações familiares, e até o simples sorriso habitual, são as formas mais importantes que encontra todos os dias -- e que não deve desperdiçar - para mostrar um amor disposto a sacrificar-se, a ir para além do interesse próprio", afirma, explicando que "as expressões de penitência corporal (...) embora pertençam à vida da Igreja e são por ela aceites (o Papa Francisco em 2017 afirmou ter feito a experiência e referiu o seu sentido positivo), não são de todo essenciais, e a maioria das pessoas do Opus Dei não as vive".

Quem as vive na Igreja, "e em concreto as pessoas do Opus Dei que o fazem, vive-as sempre voluntariamente, dando-lhes o sentido positivo de união à paixão de Cristo, portanto como manifestação do amor pelos que se afastam de Deus e assim da sua verdadeira felicidade", sublinha, advertindo que "isto não se entende sem uma lógica de vida de fé".

Com atividade visível na educação, presente em vários colégios e na formação de quadros, o vigário do Opus Dei rejeita a ideia de que a ação da "Obra" esteja voltada para os mais favorecidos.

As coisas não são assim. Ao prelado do Opus Dei, o Papa Francisco disse que queria que o Opus Dei divulgasse a mensagem do Evangelho na periferia que hoje encontramos na classe média da sociedade, referindo-se àqueles ambientes onde já não há lugar para Deus, e onde escasseiam valores e ideais", diz o padre José Rafael Espírito Santo.

As escolas "estão claramente situadas nesse contexto. O Opus Dei deseja ter uma parceria com esses projetos formativos e educacionais para, sempre com respeito pela liberdade religiosa das pessoas que aí trabalham ou beneficiam dos seus serviços, abrir mais uma possibilidade de aproximação à fé católica, pois a experiência de Deus permite o maior conhecimento da realidade".

"Além disso, muitos fiéis do Opus Dei intervêm estavelmente, por sua iniciativa, em ações e organismos de apoio a desfavorecidos, e algumas pessoas do Opus Dei são pessoas desfavorecidas e em dificuldade. Um exemplo é a iniciativa a propósito dos 75 anos da presença em Portugal, dos 75 cabazes para 75 famílias, que, em Lisboa, Porto e Braga, procura ajudar em cada cidade 75 famílias que agora sofrem mais pela pandemia, conseguindo um cabaz cada mês e ajudando a assumir uma meta de melhoria", refere o sacerdote.

Aos 62 anos de idade, José Rafael Espírito Santo, natural de Lisboa, que diz ser "padre com tudo o que isso implica (...) sem deixar de ser uma pessoa limitada e com muitos defeitos", admite que a sua formação em engenharia civil "marca muito" o seu serviço à Igreja e "o modo de enfrentar as questões", enquanto "a formação filosófica facilita uma proteção para não cair na superficialidade".

Com rotinas definidas, abrindo o dia com tempo de oração e missa, a que se segue o "estudo dos vários assuntos" durante a manhã, o vigário regional do Opus Dei dedica algumas tardes "a trabalho sacerdotal como o acompanhamento espiritual pessoal e o sacramento da confissão". Porém, este padre que chegou, em Roma, a tocar Eagles para o Papa João Paulo II, confessa que continua a ter interesse pela música quando tem tempos livres.

"Ultimamente tenho-me interessado pelos 'Quatro e meia', do ponto de vista da música portuguesa", diz, adiantando que também a literatura ocupa algum do seu tempo: "tenho a intenção de ir lendo as obras de Sándor Márai, traduzidas para português", que ainda não leu.

Entretanto, e até 2023, o Opus Dei vai preparar a participação na Jornada Mundial da Juventude (JMJ Lisboa 2023), que se realizará em Lisboa, entre 1 e 6 de agosto desse ano.

"Vivemos com muito entusiasmo o anúncio, e estamos a acompanhar com atenção e disponibilidade os preparativos. A JMJ vai ser uma ótima ocasião para ajudar muitos jovens portugueses a terem nova confiança em Deus e desejarem ser tocados por Deus, e, por essa via, tornarem-se uma presença refrescante na sociedade", diz o vigário regional do Opus Dei em Portugal.

De acordo com o padre José Rafael Espírito Santo, "nos encontros de formação católica para jovens, o Opus Dei vai desafiá-los a renovarem a sua relação com Deus, a aprenderem a arte da oração, a darem a sua ajuda na organização, e a mobilizarem o máximo número de colegas, familiares e amigos a estarem presentes" na Jornada de Lisboa.

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