Em pouco tempo, mais de mil médicos que prestam serviço à tarefa no Serviço Nacional de Saúde (SNS) criaram um grupo de WhastApp para abordarem as mudanças que podem vir aí com o novo diploma de regulação para a sua atividade e discutirem posições. Na quarta-feira, o jornal Público avançou que este grupo estaria disponível para parar as urgências, bastando para tal não indicarem as suas disponibilidades aos hospitais que deles necessitam. Na tarde desta quinta-feira, vários elementos do grupo disseram ao DN que se iriam remeter ao silêncio enquanto não tivessem conhecimento do mesmo diploma. "Vamos remeter-nos ao silêncio. Sem sabermos o que diz o documento não vale a pena estar a falar ou definir outras posições”. Segundo nos foi transmitido, esta tinha sido a posição acordada durante uma reunião que decorreu na tarde de quarta-feira, dia 5, após a notícia que dava conta das intenções do grupo.Mas, poucas horas depois, o grupo acabou por divulgar um comunicado onde esclarece que "todo o enredo mediático, sobre uma hipotética paralisação dos Médicos Prestadores de Serviço, assentou numa ata de uma primeira reunião que vazou do grupo e que foi publicada, em primeira mão, pelo Jornal "Público", de forma descontextualizada e sem ter havido a preocupação de ouvir as fontes". Acrescenta que manifestam "repúdio, sobretudo porque, à data da publicação da notícia (05.11.2025), tais fundamentos já nem sequer estavam em cima da mesa, da forma como foram publicitados".Segundo refere a direção deste grupo, encabeçada pelo médico Nuno Figueiredo e Sousa, "há muito ficou decidido, como é normal, que qualquer avaliação às medidas vertidas no alegado novo Decreto - Lei (DL), só aconteceria após se conhecer efetivamente o DL, pelo que a notícia de que as urgências iriam parar após saída do DL, além de constituir uma mentira, já à data de ontem, demonstra uma total falta de bom senso de informar bem, causando o pânico generalizado e infundado". No mesmo texto, o grupo, que já reúne mais de mil médicos com a atividade de prestação de serviços, explica que a própria "direção foi criada espontaneamente e os seus representantes eleitos por vontade dos colegas, para que fossem mandatados a perceber efetivamente a situação, tendo em conta as notícias das alterações, também elas apenas conhecidas através dos "Media". O comunicado serviu ainda para assumirem que solicitaram "ao Ministério da Saúde uma reunião para avaliação do DL, para discussão da situação, na tentativa de percebermos as medidas que pretende implementar e darmos a nossa visão do terreno, sobre a possibilidade ou não de elas serem aplicáveis".O grupo de médicos destaca no comunicado que "nenhuma urgência está fechada por falta de médicos prestadores de serviços, neste momento, pela ética, profissionalismo e dedicação que estes profissionais têm demonstrando ao longo de vários anos, muitas e muitas vezes com grande sacrifício pessoal e familiar, situação que é extensível a todos os Médicos do SNS". Os médicos criticam ainda algumas informações que têm vindo para a praça pública sobre o valor/hora que lhes é pago, argumentando que são informações "sensacionalistas" para passarem a ideia que "todos e todas ganham >100€/h, quando isso é factualmente errado". E sublinham que estas informações não indicam também que "o valor auferido é o custo total para a instituição tendo em conta que aos prestadores de serviço não lhes é dado qualquer direito laboral, em comparação com os profissionais com vínculo, pelo que qualquer comparação de valor terá sempre de ter em conta este "pormenor".Depois disto referem que nada mais "têm a informar sobre o assunto, aguardando serenamente reunião com a tutela, que já foi solicitada, altura em que poderemos demonstrar e discutir, se for do seu interesse, em local apropriado, todos os nossos fundamentos sobre a nossa atividade dentro do SNS". Petição pública para legitimar movimento Ao início da tarde desta quinta-feira, o mesmo grupo lançou uma petição pública. O objetivo é legitimar o próprio movimento para conseguirem força de negociação com o Ministério da Saúde. Nesta altura, o gabinete de Ana Paula Martins referiu ao DN que "o Ministério da Saúde ainda não recebeu qualquer pedido de reunião". A petição, já online, indica que serve para a “Legitimação da Direção do Movimento de Prestadores de Serviço do SNS”, de modo a “representar os médicos prestadores de serviço numa reunião com o Ministério da Saúde, a fim de discutir a situação destes profissionais no seio do Serviço Nacional de Saúde”. .Diploma sobre médicos tarefeiros estava previsto ir, de novo, a Conselho de Ministros, mas afinal não foi. Ao DN, alguns dos médicos envolvidos esclarecem ainda que a posição que podem vir a assumir "não é um protesto". "O que estamos a dizer "é que não temos disponibilidade para trabalhar pelo preço que querem". Se vai ser um problema? "Vai. A diretora do meu serviço anda aflita porque tem buracos nas escalas das urgências durante mais de três dias e ninguém para os assegurar", comenta um destes. Outro médico conta que há sentimento generalizado de "indignação" após algumas informações que têm sido veiculadas por dirigentes sindicais e até pela Ordem, as quais consideram falsas. "Não é verdade que ganhemos mais do que especialistas ou até do que os médicos dos quadros que trabalham ao nosso lado", comenta um dos médicos, explicando: "Um médico especialista dos quadros custa ao Estado entre 35 a 39 euros/hora, e é isso o que um médico prestador de serviço recebe numa urgência. Temos é uma fiscalidade diferente [descontam menos]". Mas, de acordo com o que tem sido noticiado, um médico especialista à tarefa, sobretudo se for contratado por empresas, pode receber entre 50 a 100 euros, nomeadamente em áreas como a da ginecologia-obstetrícia, onde a escassez destes profissionais é grande. Na ata da reunião realizada na semana passada, estes grupo de médicos já se queixava de serem “ostracizados” e “excluídos das decisões” que regulamentam a sua atividade, esperam que a tutela os possa contactar para os informar do que foi aprovado e ouvi-los, pelo menos, uma vez que a versão final do diploma ainda não regressou a Conselho de Ministros para ser aprovada. Uma das dimensões do diploma tem a ver precisamente com o corte no valor/hora pago aos tarefeiros, podendo este, segundo tem sido referido, passar para metade. Conforme o DN noticiou nesta quinta-feira, estava previsto que este diploma tivesse ido a aprovação na reunião de ontem, mas a ameaça destes médicos levou a que este fosse suspenso para “não criar mais crises na Saúde”.De acordo com a composição anunciada no texto da petição, o grupo integra profissionais do norte a sul do país e, por isso mesmo, tanto o bastonário dos médicos como o presidente da Associação Portuguesa dos Administradores Hospitalares já vieram dar conta das suas preocupações em relação a um protesto desta dimensão e a como ele pode afetar os serviços de urgência.O ministro da Presidência, Leitão Amaro, na tarde de quarta-feira, também veio apelar ao “espírito de serviço e de cuidados aos utentes”, embora reafirme que o Governo vai manter as alterações aprovadas. O DN sabe ainda que desde que este diploma foi aprovado, sob reserva, na reunião de 22 de outubro e tem vindo a ser alterado várias vezes, quando a versão final deveria ter ido ontem a CM. Neste momento, e de acordo com o que foi dito ao nosso jornal, ainda não há nova data para que o diploma regresse a CM para que seja aprovada a sua versão final.Recorde-se que o número de tarefeiros aumentou nos últimos anos, são já quatro mil e custam anualmente, segundo dados oficiais, 250 milhões de euros ao SNS. O que faz alguns destes médicos relembrar: "O Orçamento da Saúde vai ser no próximo ano de 17,3 mil milhões de euros. É reduzir para metade o preço do valor/hora que vai permitir poupanças?". Notícia atualizada às 18:00