Ana Paula Martins
Ana Paula Martins Foto: Leonardo Negrão

Ministra da Saúde diz não haver causalidade entre greve do INEM e morte de utente em Bragança

Ana Paula Martins reage ao terceiro relatório da IGAS sobre as mortes ocorridas durante a greve dos técnicos do INEM recusando qualquer causalidade. E afasta também demissões.
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A inspeção-Geral das Atividades em Saúde (IGAS) divulgou na manhã desta terça-feira, dia 22, o terceiro relatório sobre as mortes de utentes durante a greve dos técnicos do INEM que levantaram a suspeita de poderem ter ocorrido por falta de auxílio.

Ao todo, foram abertos 12 inquéritos, tendo sido um já arquivado, outro em que foi concluído que não houve causalidade entre a greve e a morte de um utente em Ansião, e agora este último, relativo a um episódio em Bragança, em que o relatório da IGAS, citou Ana Paula Martins, refere que "o estado clínico da vítima inviabiliza, nestas circunstâncias, o estabelecimento de um nexo de causalidade entre o atraso no atendimento por parte do CODU e a morte ocorrida".

A ministra reagiu assim às notícias divulgadas em que era feita uma associação de causalidade entre a morte do idoso de 86 anos, em Bragança, a 31 de outubro de 2024, devido a um enfarte do miocárdio e a falta de socorro atempado, já que o INEM terá levado 1h20m a chegar ao local.

Ana Paula Martins, que optou por uma declaração sem perguntas, reagiu ao relatório da IGAS para dizer, mais uma vez, que do ponto de vista político, o tirar consequências é resolver os "problemas" sem se "atirar a toalha ao chão", justificando desta forma o facto de não haver demissões, tanto no seu gabinete como na própria direção do INEM. Algo que voltou hoje a ser pedido pelos partidos da oposição e pelo sindicato dos Técnicos de Emergência Pré-Hospitalar em relação ao presidente do INEM.

Ana Paula Martins
IGAS: Utente que morreu em Bragança durante greve do INEM podia ter sobrevivido se socorro fosse imediato

A titular da Saúde, que começou por dizer que “lamentava profundamente cada uma das vidas perdidas”, explicou que o relatório da IGAS afirma que, no caso deste utente de 86 anos, havia "reduzida probabilidade de sobrevivência", mas "devíamos ter conseguido chegar mais depressa", concordando mesmo que esta “é a nossa obrigação” - aliás, sublinhou, “tentar tudo para salvar vidas é a missão do INEM, mesmo quando, como neste caso, a situação estava, e vou voltar a citar o relatório da IGAS, agravada pela condição do doente, que padecia de diversas comorbilidades e antecedentes de patologia cardiovascular significativa”.

Mas, apesar de tudo isto, Ana Paula Martins destaca que "o relatório da IGAS não faz uma ligação direta entre esta morte e a greve ou a prestação de socorro”, acrescentando que esta conclusão não a “descansa”, “nem ao Governo”, e nem poderá “descansar os profissionais da emergência médica”, decidindo assim dizer aos portugueses o que está a ser feito "para garantir a vossa segurança e a vossa saúde”.

E neste balanço, a ministra começou por realçar que quando chegou ao Governo havia no INEM “uma frota automóvel à espera de ser renovada desde 2015, uma execução do orçamento abaixo dos 10%, saltos cativados e um mapa de recursos humanos congelado”, para terminar dizendo que depois de ouvidas “as reivindicações justas dos trabalhadores, valorizámos as suas carreiras. Contratámos mais técnicos de emergência pré-hospitalar e já abrimos um novo concurso para mais 200 técnicos. Contratámos mais enfermeiros. Aumentámos o número de postos de emergência médica em articulação com a Liga de Bombeiros e a Cruz Vermelha Portuguesa”.

Quanto à frota de ambulâncias, "está a ser renovada com a aquisição de mais 312 viaturas. Estamos à espera dos relatórios da Auditoria que a Inspeção Geral das Finanças e a Comissão Técnica Independente do INEM estão a realizar. São passos importantes para concluirmos a nossa proposta de refundação da emergência médica em Portugal”.

No entanto, recorde-se que no caso da falta de meios no INEM, o próprio Instituto de Emergência tem justificado a falta de ativos com a reprovação de um em cada quatro técnicos de emergência pré-hospitalar. As 11 desistências e as 39 não aprovações diminuíram a capacidade de aquisição de novos profissionais, o que leva, nesta fase, a uma reformulação desses mesmos exames para os futuros técnicos a concurso. A necessidade de novos profissionais é apontada como uma das grandes razões para o estado do atendimento prioritário, além da escassez de ambulâncias.

Segundo dados do Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM), durante o período experimental verificaram-se 11 desistências e 39 não aprovações, o que significa que chegam ao fim do período experimental com aprovação 150 candidatos.

Oito meses depois da greve, que decorreu entre 30 de outubro e 4 de novembro de 2024, a ministra assume que "sobre o que se passou naqueles dias, mesmo sem nexo de causalidade, o circuito de informação dos anúncios da greve não funcionou bem". Por isso, "já o mudámos e posso garantir-vos que esse mau funcionamento não se voltará a repetir”. lembrando que a “emergência médica, tal como o Serviço Nacional de Saúde, salva todos os dias milhares de pessoas. Quando tal não é possível, quando ocorre uma morte, mesmo que inevitável, não só lamentamos como aprendemos com isso. E é isso que estamos a fazer.”

Recorde-se que Ana Paula Martins tem estado debaixo de fogo no caso dos concursos dos helicópteros do INEM, cujo socorro deste tipo está agora entregue à Força Área, e pelas condições nos serviços de urgência sobretudo na área da Ginecolo-Obstetrícia na Península de Setúbal em que, pelo menos, neste último mês, já se registaram três mortes de bebés de mães desta área que estavam a ser levadas para outras unidades.

Greve no INEM: PS, Livre e PAN querem demissão da ministra da Saúde

Na Assembleia da República, nesta terça-feira de manhã, a deputada do PS, Mariana Vieira da Silva, afirmou que ainda há “cerca de oito relatórios em falta”. “Mas desde Fevereiro — desde que a IGAS confirmou que mais de metade das chamadas ficou por atender — que, para o Partido Socialista, as responsabilidades políticas deviam ser tiradas por parte da senhora ministra da Saúde”, disse à Antena 1 a ex-ministra socialista.

Filipa Pinto, do Livre, defende não ser “suficiente lamentar uma morte”. “Acho lamentável que depois de tantos episódios em que as falhas são claras, em que o INEM não funciona e o problema não está a ser tratado com a devida preocupação, a senhora ministra ainda continue a achar que tem condições para continuar.” Ao pedido de demissão associou-se o PAN pedindo “consequências políticas”, vincando ter proposto a admissão de 400 técnicos para o INEM.  A líder parlamentar do PCP, Paula Santos corrobora: “É preciso mudar a política.”

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