Ministério da Justiça ordena nove processos disciplinares a diretor e guardas pela fuga de Vale de Judeus
Paulo Spranger / Global Imagens

Ministério da Justiça ordena nove processos disciplinares a diretor e guardas pela fuga de Vale de Judeus

Processos disciplinares visam o ex-diretor, o chefe da guarda e sete guardas prisionais. Relatório aponta responsabilidades individuais em falhas de segurança na fuga de cinco reclusos da cadeia de Vale de Judeus.
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O Ministério da Justiça decidiu avançar com a instauração de nove processos disciplinares na sequência da fuga de cinco reclusos da prisão de Vale de Judeus, em setembro, visando o ex-diretor, o chefe da guarda e sete guardas prisionais.

De acordo com o comunicado divulgado esta segunda-feira pelo Ministério da Justiça, a instauração dos processos disciplinares foi recomendada pelo relatório elaborado pelo Serviço de Auditoria e Inspeção (SAI) da Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais (DGRSP), que foi entregue ao ministério liderado por Rita Alarcão Júdice no dia 17 de outubro.

Na nota é referido que o processo disciplinar ao ex-diretor do estabelecimento prisional de Vale de Judeus deve-se à "violação dos deveres gerais de prossecução do interesse público, zelo e lealdade".

"O diretor (em substituição) não zelou pelo cumprimento das orientações em matéria de vigilância e segurança, nomeadamente, na homologação das escalas", lê-se no comunicado. 

Sobre o chefe da guarda prisional, a instauração de procedimento disciplinar surge devido à "violação dos deveres gerais de prossecução do interesse público, zelo e lealdade e por violação de certos deveres especiais". "Como responsável máximo pela vigilância e segurança, em funções no EP de Vale de Judeus, a 7 de setembro, cabia-lhe a determinação da escala da vigilância (física e por vídeo) aos pátios interiores", considerou o relatório. 

No que diz respeito aos sete guardas prisionais, entre os quais um chefe de ala, "não cumpriram várias instruções, incluindo instruções escritas". "Esses incumprimentos resultaram na falta de escrupulosa vigilância presencial e videovigilância, o que facilitou a fuga dos reclusos e impediu a sua deteção atempada", concluiu-se.

A nota do Ministério da Justiça destacou ainda a abertura de dois inquéritos autónomos: um relativamente ao comissário do estabelecimento prisional, pela "falta de concretização de uma medida de segurança e sobre uma situação de absentismo prolongado"; e outro à Direção dos Serviços de Segurança "para avaliar o seu funcionamento e a capacidade de resposta a situações desta natureza".

O Ministério da Justiça remeteu ainda às entidades competentes certidão para apurar responsabilidades disciplinares em relação a militares da GNR sobre "as condições em que foram cedidas, sem autorização, as imagens de acontecimentos no estabelecimento prisional de Vale de Judeus à Comunicação Social".

"O silêncio de muitos dos envolvidos, embora não os tenha desfavorecido, não permitiu deslindar alguns dos factos que ajudariam a delimitar a intervenção individual", refere o relatório do SAI, citado no comunicado.

Desta forma, considerou o Ministério da justiça, "os processos disciplinares abrirão oportunidade para que tal apuramento seja feito".

O comunicado indica ainda que as decisões, agora conhecidas, foram tomadas na sequência de uma reunião entre a ministra da Justiça Rita Alarcão Júdice, a secretária de Estado Adjunta e da Justiça, Maria Clara Figueiredo, e a diretora-geral da DGRSP, Isabel Leitão. 

A fuga de Vale de Judeus levou a ministra da Justiça a ordenar uma auditoria à segurança das cadeias portuguesas e motivou também o afastamento do então diretor-geral da DGRSP, Rui Abrunhosa e Gonçalves, que foi substituído por Isabel Leitão.

A fuga deu ainda origem a uma averiguação de natureza disciplinar que incide sobre os guardas que estavam de serviço na videovigilância no momento da fuga e também a um inquérito do Ministério Público para apurar eventuais responsabilidades de cariz criminal.

Fábio Loureiro está condenado pelos crimes de rapto, tráfico de estupefacientes, associação criminosa, roubo à mão armada e evasão.

O grupo de cinco evadidos, com idades entre os 33 e 61 anos, incluía ainda o cidadão português Fernando Ribeiro Ferreira, o georgiano Shergili Farjiani, o argentino Rodolf José Lohrmann e o britânico Mark Cameron Roscaleer.

Os evadidos estavam a cumprir penas entre os sete e os 25 anos de prisão, por vários crimes graves, entre os quais tráfico de droga, associação criminosa, roubo, sequestro e branqueamento de capitais. 

A ministra da Justiça, Rita Alarcão Júdice, justificou os processos disciplinares com as conclusões constantes de um relatório sobre o incidente. "Foi feito um inquérito aturado, cuidadoso, que levou o seu tempo (...), foi analisado por nós, portanto se a nossa decisão foi nesse sentido é porque concordámos com as conclusões que foram obtidas nesse relatório, é apenas isso que posso dizer", disse, garantindo que o relatório veio trazer "mais detalhe e mais clareza".

"Claro que este relatório que agora recebi vem trazer-nos mais detalhe e mais clareza em alguns aspetos que para nós eram já indiciários quando olhámos para o primeiro relatório. Temas como a falta de comando, o desleixo, alguma falta de cuidado, tudo isso foi evidenciado neste relatório e nessa medida tomámos as decisões que achámos que eram as corretas", acrescentou.

Advogado de sete guardas promete "responder em conformidade"

O advogado dos sete guardas prisionais alvo de processos disciplinares na sequência da fuga da prisão de Vale de Judeus, prometeu que vai "apreciar e responder em conformidade" às imputações de violação do dever de zelo.

Em declarações à agência Lusa, Pedro Proença confirmou que os sete guardas prisionais que representa enfrentam agora processos disciplinares por violação do dever de zelo, pelo que "vai haver uma nota de culpa", a qual será "apreciada e respondida em conformidade".

O advogado considerou que se está perante um "procedimento normal" e valorizou o facto de no relatório que serviu de base aos processos disciplinares instaurados pelo Ministério da Justiça "nada apontar para qualquer espécie de comparticipação" dos guardas prisionais na fuga de cinco reclusos de Vale de Judeus, em setembro passado.

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