São 8:30 horas e já há muitas pessoas à espera no Centro de Saúde de Sete Rios, em Lisboa. Logo na entrada, o aviso: "Devido à greve de médicos e enfermeiros poderá haver alguns constrangimentos." E houve. "Vim para a minha filha ser observada, é uma menina de quatro anos e parece-me ser varicela", começa por contar Sofia Figueira, 42 anos, com a criança pela mão..Sofia deslocou-se ao Centro de Saúde de Sete Rios. "Disseram-me que hoje não era possível ela ser vista, nem amanhã. Agora vou para o hospital. Se não me receberem, ligo para a Saúde 24", atalha esta mãe. .Natália Sardeco, 85 anos, descobriu que não tem médico de família depois de a anterior clínica lhe ter mandado marcar consulta nesta altura. "Vim para marcar a consulta e não consegui. Eu tinha médica de família e só hoje, quando aqui cheguei, é que me disseram que se foi embora, não me deram mais explicações", lamenta. "Agora, só a partir de 1 de outubro é que posso marcar consulta", resigna-se..Ainda assim, Natália Sardeco opina: "Sabe, eu acho muito bem que eles façam greve! Porque o que é prometido é para ser cumprido. Se não cumprem com os médicos e os enfermeiros, é assim.".Quem também concorda com a greve é outro utente do mesmo centro de saúde. "No meu caso, consegui falar com o médico, ele não fez greve. Mas estou de acordo com todos os que fazem greve, porque só assim é que se consegue qualquer coisa. E não digo isto por ter conseguido ser atendido: mesmo que o meu médico tivesse feito greve e me causasse transtorno, concordava na mesma", frisa Luís Monteiro, 62 anos..Ana Paula Rodrigues, 57, tinha análises urgentes para mostrar à médica. "Ela não está e há vários médicos que não estão", revela a paciente, no mesmo ponto de Lisboa. "No meio deste caos arranjaram-me uma solução: como as minhas análises são mesmo urgentes, pediram-me que voltasse ainda hoje, mas mais tarde. Quanto à greve, acho bem, eles têm de se defender", resume..O DN falou com diversos utentes deste centro de saúde e apercebeu-se que, apesar da paralisação de enfermeiros e médicos, muitos conseguiram ter acesso às consultas ou tratamentos que tinham marcados..Quem não conseguiu, também, foi Maria Fernanda Freire, 74 anos, que se mostra revoltada: "Somos tratados pior do que os animais. Andamos a descontar anos e anos a fio para depois não termos nada", lamenta a septuagénia. As lágrimas começam a cair-lhe pelo rosto, está nervosa. "Vim aqui no sábado, de urgência, porque tenho nódulos na tiróide e agora tenho um alto no pescoço que me dói muito. Marcaram-me uma ecografia à tiróide mas eu perdi a prescrição. Agora vim cá e disseram que hoje e amanhã não me conseguiam ajudar". .Melhor sorte teve Irene Piçarra, 88 anos. "Vim tomar a vacina do covid e correu tudo dentro da normalidade, até foi rápido", avança a idosa, apoiada pelo filho. O mesmo sucedeu com João Candeias, outro doente, de 80 anos: "Tive consulta, felizmente o meu médico não está de greve". .Dali o DN seguiu para o Hospital de Santa Maria, o maior de Lisboa. Na zona das consultas externas há muito movimento. "Não tem havido grandes constrangimentos", confidencia uma das voluntárias daquele espaço, que prefere não ser identificada. .Manço Baldé, 66 anos, deslocou-se ao hospital para uma consulta de cardiologia. Foi atendido. Ainda assim, realça: "As greves servem para os médicos conseguirem o que precisam. No meu caso, se não tivesse consulta, o principal problema é que necessito de ser avaliado com regularidade", conclui o doente..Artemisa Lopes Correia, 38 anos, chegou numa cadeira de rodas. Partiu a bacia mas, esta manhã, veio para uma consulta de otorrinolaringologia. "O médico não veio. Cheguei ao hospital às 8:00, esperei, mas só por volta das 11:00 é que me foi dito que o médico estava de greve"..A doente, que está em Portugal instalada numa pensão e apoiada pela Segurança Social, ao abrigo do programa de ajuda aos PALOP, revela que não ter esta consulta "foi muito inconveniente". "Vim de longe, tive de pedir ajuda a um amigo para me trazer e agora estou aqui à espera para me vir buscar, ainda por cima de cadeira de rodas. Mas é a vida", finaliza, com um sorriso. "Agora volto cá na sexta-feira, dia 27"..Henrique Costa, 39 anos, tem um tumor na cabeça. "Tive consulta e agora estou à espera da ambulância, para ser transportado para o Vale da Amoreira, onde moro", conta o paciente. "Mas acho bem que eles façam greve, se é para ficar tudo melhor para todos". .O serviço de nefrologia terá sido um dos mais afetados, em Santa Maria. "Em nefrologia quase ninguém teve consulta. Aquilo está cheio e os médicos todos de greve", revela Balkrasnha Shantilal, 70 anos, doente que também ficou sem ser atendido. "Cheguei às 9:00 e fiquei à espera até que soube que o meu médico está de greve". O utente não se mostra desfavorável à greve de médicos e enfermeiros, mas preocupa-o a sua condição de saúde. "Fiz um transplante renal e sou visto de 15 em 15 dias. Agora, remarcaram-me esta consulta para sexta-feira, dia 27, quando já não há greve", conclui.