A febre catarral, vulgarmente conhecida como doença da língua azul, já fez mais de 36 mil mortes (incluindo abortos) em Portugal. Os números, enviados ao DN pela Direção-Geral de Veterinária (DGAV) mostram que, no entanto, houve, até à passada terça-feira, 89 415 animais afetados. .Os impactos calculados pela Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP), no entanto, são maiores. Num comunicado datado de 11 de novembro, a CAP apontava para, pelo menos, 40 mil animais mortos desde setembro. Os prejuízos poderiam, segundo a confederação, chegar aos seis milhões de euros..No entanto, apesar dos números altos, a DGAV refere que o surto já “mostra alguns sinais de abrandamento”, ainda que tenha sido detetado a circular “pela primeira vez” um novo serótipo (ou seja, uma nova categoria em que se subdividem os microrganismos) do vírus da febre catarral. Segundo o ministro da Agricultura, José Manuel Fernandes, esta nova variante da língua azul, chamada “serótipo 8”, foi detetada “numa exploração de bovinos” que tinha “um animal positivo”. O local em causa tem 48 animais. Ainda de acordo com o governante, foi definida uma “zona de restrição” para este caso, que José Manuel Fernandes não especificou em que zona do país fica..Esta é, no entanto, a exceção: a maioria dos casos, diz a DGAV, são do serótipo 3 e, em menor escala, do serótipo 4..De acordo com o balanço feito pela Direção-Geral de Alimentação e Veterinária, os distritos de Beja (com 33 684 mortes), Évora (28 528), Portalegre (11 242) e Setúbal (8330) são os que mais impactos da doença têm sofrido, quer em ovinos, como em bovinos..Ouvido pelo DN, Tiago Perloiro, secretário-técnico da Associação Nacional de Criadores de Ovinos da Raça Merina (Ancorme), afirma que os impactos são grandes, mas que não é possível quantificá-los ainda..“Estamos a acabar de fazer a ronda pelos associados, pelo que os números que temos são de há três semanas, só depois poderemos perceber isso”, explica..No entanto, comparando com outros anos, Tiago Perloiro diz que “este surto tem sido bastante grande e gravoso”. Mas, agora, “não é altura de chorar sobre leite derramado”. “Há que fazer contas aos prejuízos e, depois, certamente que haverá lugar a indemnizações. Tem de haver”, refere..De acordo com o secretário-técnico - que também é produtor de animais da raça merina (e que teve a sua exploração afetada) -, o caminho a seguir deve ser o da vacinação. “Enviámos, até, uma carta aberta ao senhor secretário de Estado [João Moura], em que identificámos algumas prioridades”, entre as quais a questão da vacinação..“A altura da primavera é, para nós, muito preocupante. Este surto acontece numa altura em que o número de mosquitos está a baixar e, com isso, o vetor começa a parar. Como é que vai ser na altura da primavera? Se não houver uma vacinação [que é preventiva] a sério, a situação ficará ainda pior. Essa questão preocupa-me muito”, confessa o produtor..Numa reação a este surto, 13 associações representativas dos agricultores e produtores pecuários de todo o país enviaram uma carta a José Manuel Fernandes queixando-se da reação tardia na aplicação de medidas de controlo que deviam ser implementadas, bem como da descoordenação entre serviços e a escassez de apoios no financiamento das vacinas. E estes apoios estarão a tardar em chegar..Mais 30 milhões para a recolha de animais.Uma outra queixa dos produtores é a dificuldade na recolha dos cadáveres dos animais, devido ao elevado volume de pedidos que chegam ao Sistema de Recolha de Cadáveres de Animais mortos na exploração (SIRCA)..Para reforçar esta estrutura, que se insere na DGAV, o Governo aprovou, em Conselho de Ministros, no passado dia 22 de novembro, um aumento de despesa de 30 milhões de euros em 2025 e 2026. “Isto é especialmente importante, e a sua celeridade, por causa, como sabem, da pressão adicional no Sistema de Recolha de Animais Mortos com o fenómeno da língua azul”, referiu o ministro da Presidência, António Leitão Amaro..Além disso, o Governo já adquiriu também vacinas para distribuir pelos produtores, de modo a tentar controlar o surto..P&R: O que é a doença da língua azul?.O que provoca e o que é a doença?A febre catarral, ou doença da língua azul, é transmitida pela picada de um mosquito. Até agora, já foram detetados quatro serótipos diferentes em Portugal. Apesar de afetar sobretudo ovelhas, as vacas e cabras também podem adoecer com língua azul - ainda que numa escala mais reduzida. Quando um animal está infetado, pode ter febre e ficar com um inchaço na língua, bem como úlceras. Isto faz com que deixem de comer e acabem por morrer. Pode também provocar abortos nas ovelhas e, nos borregos, dificuldades em mamar..É transmissível a humanos?Não. A língua azul não se transmite a humanos. Ainda assim, depois de morrerem, os animais não são consumidos pelos humanos, sendo enterrados ou recolhidos pelas instituições responsáveis por essa atividade..Que tipo de tratamento se pode fazer?Há, atualmente, vacinas meramente preventivas para a língua azul. Por norma da DGAV, é obrigatória para os serótipos 1 e 4 do vírus para o “efetivo ovino reprodutor adulto” e para os “jovens destinados à reprodução”, bem como para gado bovino. Já para o serótipo 3, foi autorizado a vacina - mas não é obrigatória..O Governo já adquiriu vacinas?Sim. O Executivo, através do Ministério da Agricultura, já adquiriu pelo menos três milhões de vacinas contra a língua azul, sobretudo focadas nos serótipos 1 e 4 (que ainda circula). Só tendo sido detetado em setembro, a imunização contra o serótipo 3 ainda não ocorreu na totalidade, “causando assim a doença”. Foram vacinados contra o serótipo 3 “mais de 240 mil animais (ovinos e bovinos)”.