Uma mulher, de 37 anos, perdeu o filho pouco depois do nascimento, no Hospital Santa Maria, e depois de ter percorrido cinco hospitais (Setúbal, Barreiro, Garcia de Orta, Cascais e, por fim, Santa Maria) durante 13 dias, já com mais de 40 semanas de gestação, e queixando-se de “dores intensas”. O parto, por cesariana, aconteceu no dia 21 de junho na última unidade, mas o caso só foi noticiado neste domingo, dia 29, pelo jornal Correio da Manhã. O que pode ter acontecido nesta situação? Sabendo-se que, e como noticiou o CM, que a mulher recorreu cinco vezes à Linha SNS24, foi sempre encaminhada para hospitais diferentes, mas que fez exames para se saber se estava bem? Ao DN, o presidente da Sociedade Portuguesa de Obstetrícia e Saúde Materno-Fetal, Nuno Clode, explica que "muitas vezes, há mulheres que têm uma latência prolongada, têm contrações, mas não entram em trabalho de parto. Pode acontecer a qualquer mulher. Tem dores vai a um serviço, provavelmente, fizeram-lhe CTG, estava tudo normal e não tinha indicação para internamento". Agora, também refere, "é preciso saber o que aconteceu, de facto, porque só isto não é explicação". A Inspeção-Geral das Atividades em Saúde também confirmou ao DN ter pedido explicações às várias unidades, depois de ter conhecimento das notícias que vieram a público, explicando que "as entidades hospitalares envolvidas na assistência prestada à grávida estão a avaliar a situação, no âmbito das competências dos respetivos órgãos de gestão" e que a IGAS "acompanhará essa avaliação, até à sua conclusão, embora sem proceder à instauração de uma ação inspetiva". Ou seja, só depois desta conclusão é que decidirá se atua com uma ação inspetiva ou não, tendo a IGAS disponibilizado já "a essas entidades hospitalares o apoio que venha a ser necessário na realização das avaliações internas, conduzidas pelos serviços competentes."A Ordem dos Médicos, por seu lado, e como confirmou ao DN o próprio bastonário, já pediu explicações ao Hospital Santa Maria, onde a mulher acabou por ter realizado o parto, no dia 21 de junho, depois de ter passado em mais quatro urgências, durante 13 dias, e onde o bebé acabou por falecer após nascimento por cesariana. Carlos Cortes afirmou ainda que também foram pedidas explicações à Direção Executiva do SNS (DE-SNS) sobre o facto de a mulher ter tido de passar por cinco urgências. Recorde-se que, no domingo, dia e após se ter sabido da situação pelo CM, a Direção Executiva anunciou à RR, estar "a averiguar a situação para apurar todos os factos". O mesmo fez o gabinete da ministra da Saúde que informou os jornalistas que só atuará depois da avaliação de todos os factos. Por sua vez, o hospital Santa Maria, através do Departamento de Ginecologia-Obstetrícia, esclareceu no mesmo dia o seguinte: “Durante a cesariana foi constatada a existência de um hematoma grande do ligamento largo do útero, o qual dificultou a incisão no útero e atrasou substancialmente a extração do feto. O recém-nascido pesava 4525g, mostrava sinais de vida, mas não resistiu ao episódio de baixa oxigenação sofrido nos momentos que antecederam o nascimento.”. A Unidade Local de Saúde Santa Maria (ULSSM), que já expressou “pesar ao casal e familiares nesta hora de profunda tristeza, garantindo-lhes todo o apoio necessário” em comunicado explica que, “após averiguações internas que foram de imediato levadas a cabo”, esclarece, em primeiro lugar, que a grávida não foi acompanhada durante a gravidez naquela unidade, tendo ali dado entrada no dia 21 junho, “com uma gestação de 40 semanas e 6 dias, para indução do trabalho de parto. As ecografias realizadas durante a gravidez indicavam um feto com crescimento normal e a cardiotocografia realizada à entrada era normal”, acrescentando que, no passado, a utente tinha tido dois partos vaginais, um dos quais com um recém-nascido de 3900g. A equipa começou por propor “à senhora uma indução do trabalho de parto, devido à idade gestacional”, que foi “iniciada no mesmo dia e o trabalho de parto decorreu sem intercorrências de relevo”. Mas, na altura do período expulsivo, explica ainda o hospital, “foi tentado um parto instrumentado, porque o feto não descia espontaneamente e apresentava desacelerações da frequência cardíaca, mas este não teve sucesso, razão pela qual se partiu logo de seguida para uma cesariana. Durante a cesariana foi constatada a existência de um hematoma grande do ligamento largo do útero, o qual dificultou a incisão no útero e atrasou substancialmente a extração do feto. O recém-nascido pesava 4525g, mostrava sinais de vida, mas não resistiu ao episódio de baixa oxigenação sofrido nos momentos que antecederam o nascimento.” .Direção Executiva reúne com hospitais da Margem Sul para resolver fechos das urgências de obstetrícia .Na mesma nota, o hospital salvaguarda que, “embora os progressos do conhecimento científico nas últimas décadas tenham levado a uma redução grande dos desfechos adversos relacionados com o parto, não é ainda possível garantir que todas as grávidas e todos os bebés tenham um desfecho positivo. Continuam a existir situações em que a rapidez e a imprevisibilidade da evolução clínica não permitem uma intervenção atempada. São situações de grande sofrimento para os pais, para os familiares e amigos, bem como para toda a equipa de saúde, que sente a frustração de não conseguir corresponder às expectativas das famílias”.Segundo relatou a utente ao CM, a primeira vez que ligou para a Linha SNS24, queixando-se de “dores intensas e peso abdominal” foi a 10 de junho, altura em que foi encaminhada para o Hospital de Setúbal, onde diz ter feito um CTG para avaliar o bem-estar do feto. Este terá indicado estar tudo bem. A 16 de junho contactou de novo a SNS24, pelas mesmas razões e foi reencaminhada para o hospital do Barreiro, onde voltou a realizar exames, que também indicaram não haver problemas. No dia 19, entrou na urgência de ginecologia e obstetrícia do Hospital Garcia de Orta, com 40 semanas e 3 dias de gestação, onde realizou novo CTG sem alterações. Mais de dez dias depois, foi encaminhada pela SNS24, já com 41 semanas, foi encaminhada para as urgências de Cascais, e não havendo vaga para internamento foi transportada, então, para o Hospital de Santa Maria.Ao DN, o obstetra Nuno Clode explica ainda que "só há razões para internamento no final da gestão quando há sinais de que o bebé não está bem ou de que a mãe não está bem, mas em casos em que a mulher não tem contratações regulares e alterações alterações no colo do útero não há razão para internamento", embora reconheça que "a mulher com dores é um problema ter de andar de um lado para o outro para ser vista".