Grávida perde bebé alegadamente por falta de obstetras no hospital das Caldas
Uma grávida perdeu o bebé alegadamente por falta de obstetras no hospital das Caldas da Rainha, segundo a RTP, avançando que o hospital determinou a abertura de um inquérito e participou o caso à Inspeção-Geral das Atividades em Saúde.
A RTP refere que o incidente aconteceu na noite de quarta-feira, quando o serviço de urgência em obstetrícia daquela unidade estava encerrado por falta de médicos.
A situação terá atrasado o atendimento à mulher grávida, que acabou por perder a criança.
Questionado sobre a situação, o Conselho de Administração do Centro Hospitalar do Oeste confirmou, em comunicado, que, no passado dia 8 de junho, a urgência obstétrica do hospital das Caldas da Rainha teve constrangimentos no preenchimento da escala médica, o que determinou o encerramento da urgência ao CODU/INEM, após a definição de circuitos de referenciação de doentes com outros hospitais.
"Confirma ainda que se verificou uma ocorrência grave com uma grávida, tendo sido determinada a abertura de um processo de inquérito à Inspeção-Geral de Atividades em Saúde (IGAS), no sentido de apurar o sucedido e eventuais responsabilidades", refere no comunicado citado pela RTP.
A Ordem dos Médicos lamentou, entretanto, a morte de um bebé por alegada falta de obstetras para assistir a mãe no parto, alertando que estes casos podem repetir-se devido ao encerramento de urgências por terem as equipas desfalcadas.
Em declarações à Lusa, o presidente do Conselho Regional do Sul da Ordem dos Médicos, Alexandre Valentim Lourenço, lamentou "a perda de uma vida e uma tragédia familiar", ressalvando que este não é o momento para se falar do caso em concreto, "porque há pessoas em sofrimento".
Segundo o especialista em obstetrícia e ginecologia, é preciso deixar que os inquéritos apurem o que é aconteceu, sublinhando que é importante precaver estas situações e ter "um plano bem estruturado de encaminhamento de informação à população".
"Nós temos que ter a noção de que não se pode ter equipas desfalcadas e encerramentos de urgências sem consequências, e as consequências advêm de uma crise que já se arrasta há mais de três anos e para a qual temos repetidamente chamado a atenção", salientou Alexandre Valentim Lourenço.
Por esta razão, sustentou, é preciso "interrogar quais serão as medidas [a tomar] e porque é que essas medidas não terão sido tomadas, sabendo nós que esta situação é estrutural e afeta múltiplas maternidades na região sul do país".
Alexandre Valentim Lourenço salientou que, nos últimos meses, se têm multiplicado as situações de maternidades sem escalas completas, sem planos de contingência e que tiveram de encerrar as urgências.
"Agora que se aproxima o verão, vamos perceber que isto poderá ser quase uma rotina e não uma exceção", avisou.
Segundo o especialista, enquanto houver equipas que, para terem uma "segurança mínima", deviam ter três, quatro, cinco pessoas, mas têm uma ou duas, "estes casos têm tendência a repetir-se".
Advertiu, ainda, que encerramento de várias urgências em simultâneo também pode colocar em risco a resposta noutras maternidades, sendo por isso essencial ter neste momento "um plano bem estruturado de encaminhamento de informação à população".
Se uma maternidade estiver encerrada, não basta a pessoa chegar lá e ver uma informação na porta, tem que perceber antes onde é que tem que ir, explicou o responsável, alertando para o facto de as outras instituições também estarem sobrecarregadas com as utentes que vêm das outras maternidades.
"Mas isto acontece em todos os hospitais. Vemos o encerramento da maternidade do Hospital Garcia da Orta [em Almada], que é um grande hospital e faz muitos partos", cujas grávidas da Margem Sul têm de ser encaminhadas para "outro lado qualquer que muitas vezes não está preparado para receber essa afluência", elucidou.
No entanto, há dias em que encerram duas ou três maternidades, sendo que os restantes hospitais que já estavam cheios podem nem sequer ter equipamentos para receber estas grávidas, reforçou.
Alexandre Valentim Lourenço apontou, ainda, que há hospitais como o das Caldas, de Évora ou Portalegre que "estão muito longe do hospital mais perto", uma situação que "é importante também precaver".
O Sindicato Independente dos Médicos (SIM) afirmou hoje que a falta de resposta dos serviços de obstetrícia é a "razão de fundo" para o que aconteceu com uma grávida que perdeu o bebé no hospital das Caldas da Rainha.
"Naturalmente que não podemos tirar conclusões antecipadamente, mas há uma razão de fundo" para o que aconteceu, disse à agência Lusa o secretário-geral do SIM, apontando "a falta de resposta" destes serviços como "a principal responsável para que isto possa ter acontecido".
Jorge Roque da Cunha aludia ao caso que foi noticiado pela RTP de uma grávida que perdeu o bebé alegadamente por falta de obstetras no hospital das Caldas da Rainha.
O dirigente sindical, que endereçou os pêsames à família e aguarda agora os resultados do inquérito, disse que tem vindo a fazer, há vários meses, "sucessivos alertas" para este problema.
"Ainda ontem [quinta-feira], no nosso 'site' oficial, fizemos um apelo pungente ao Ministério da Saúde para os problemas que se sentem em hospitais como São Francisco Xavier, Caldas da Rainha, Barreiro, Setúbal, Almada, Amadora-Sintra, onde as escalas de urgências estão abaixo dos mínimos para os serviços de obstetrícia", referiu.
Perante esta situação, defendeu, "a atitude consciente" que tem de ocorrer é o encerramento dessas urgências.
"Os médicos se não estiverem no seu local de trabalho com as condições mínimas para garantir que possam salvar vidas, cumprir as suas obrigações, incorrem em penalizações éticas e deontológicas, para além de criminais", salientou.
Exemplificou como o serviço de urgência do Hospital Garcia de Orta, em Almada, que esteve sem atendimento urgente de ginecologia e obstetrícia durante o dia de quarta-feira e as 08:30 de quinta-feira.
"Naturalmente, quando os problemas ocorrem, dada a dimensão e o volume das pessoas que aí ocorrem, a responsabilidade é dos médicos", afirmando, vincando que "o Ministério da Saúde não pode ignorar este problema".
"Nós termos alertado, os próprios médicos emitem escusas de responsabilidade por dificuldades nessas escalas e os conselhos de administração também farão o seu papel. Por isso, é fundamental que se contratem médicos, que se invista no Serviço Nacional de Saúde e que não tente ocultar o problema com propaganda", apelou.
Para Roque da Cunha, "não é possível" a situação manter-se assim, esperando que haja "um mínimo de consciência" por parte ministra da Saúde e que apresente "soluções em vez de propaganda".
"Por isso, fazemos o apelo para que apresentem medidas e não adiem por mais tempo essas medidas que são tão necessárias", disse, frisando que também não é possível pedir mais trabalho aos médicos do Serviço Nacional de Saúde, muitos dos quais já realizaram "200, 300 horas extraordinárias nos primeiros meses do ano".
O grupo parlamentar do PSD questionou esta sexta-feira a ministra da Saúde, Marta Temido, sobre as circunstâncias da morte de um bebé, após parto por cesariana, no Hospital das Caldas da Rainha.
Em comunicado enviado à agência Lusa, o grupo parlamentar diz pretender, também, que Marta Temido diga "que diligências foram espoletadas pela tutela para apurar todas as responsabilidades" e quais as que foram desenvolvidas pelo Ministério da Saúde para apoiar a família do bebé.
Finalmente, os social-democratas querem saber quando "será reforçado o serviço de obstetrícia do Hospital das Caldas da Rainha, para que não voltem a existir períodos sem assistência médica especializada".
Notícia atualizada às 18:24