A ministra Margarida Blasco no encerramento do I Congresso da Associação Sindical dos Profissionais da Polícia.
A ministra Margarida Blasco no encerramento do I Congresso da Associação Sindical dos Profissionais da Polícia.FOTO: Tiago Petinga / Lusa

Governo confirma que vai discutir direito à greve de polícias

A revelação foi feita pela ministra da Administração Interna no final do primeiro congresso da Associação Sindical dos Profissionais da Polícia (ASPP/PSP), em Lisboa.
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A ministra da Administração Interna, Margarida Blasco, abriu este domingo a porta à discussão sobre o direito à greve nas polícias, com o tema reclamado pelos sindicatos a figurar entre os pontos em discussão nas negociações previstas para janeiro.

"Vamos começar no dia 6 de janeiro um conjunto de revisões e é um ponto que pode estar e estará, com certeza, em cima da mesa. Neste momento não vou dizer se sim ou se não, porque vai ter de ser submetido a um estudo", afirmou a governante, em declarações a jornalistas no final do primeiro congresso da Associação Sindical dos Profissionais da Polícia (ASPP/PSP).

O direito à greve foi o tema segundo dia de evento, com intervenções nesta matéria. Um deles foi o constitucionalista Jorge Bacelar Gouveia, disse que "não há impossibilidade constitucional" de discutir o tema e defendeu que exista uma discussão sobre o assunto em Portugal. "Se há países mais avançados do que nós, mais democráticos do que nós e mais seguros do que nós e tem direito à greve, porque não havemos nós de atribuir esse direito?", questionou o constitucionalista ao terminar a intervenção, aclamado com fortes aplausos dos presentes.

O jurista Jorge Machado, ex deputado, também argumentou no mesmo sentido. "Ao agente policial deve ser reconhecido o direito à greve, pese embora restrições constitucionalmente asseguradas", disse. Nas intervenções do público, foi destacada que outras categorias na área de segurança pública possuem esse direito, como os guardas prisionais. 

Também em declarações aos jornalistas ao final do evento, Paulo Santos, presidente da ASPP/PSP, afirmou que o congresso lançou a discussão. "Vamos naturalmente aproveitar esta ideia que foi lançada para que possa promover uma discussão", afirmou. Para o dirigente, não há uma barreira na Constituição sobre a realização de greves nas polícias, mas sim, "uma interpretação que na nossa opinião é errada".

Modelo de policiamento será revisto

Na mesma declaração aos jornalistas hoje, a ministra da Administração Interna, Margarida Blasco, afirmou que modelo de policiamento de proximidade pela PSP vai ser revisto e defendeu a sua importância junto das comunidades e prometeu também um maior investimento do Governo.

"A PSP tem um programa há muitos anos que tem de ser revisitado e que é a polícia de proximidade. Isso passa por ter mais quadros formados e um diálogo que tem de ser feito com as autarquias, com a segurança social, com as associações dos bairros. Estou crente que esse trabalho vai ser feito", afirmou Margarida Blasco, sublinhando: "É muito importante que o cidadão confie na sua polícia. O Governo confia na polícia".

A governante explicou que há 500 futuros agentes a serem formados neste momento e que essa revisão passa também por um reforço das condições dos polícias. "Vamos fazer um investimento na formação e, para isso, precisamos de abrir concursos para agentes, para chefes, para oficiais. Estamos atentos e neste constante diálogo que temos com os sindicatos e os polícias, um dos programas que vamos reavivar é o policiamento de proximidade", reforçou.

Entre os equipamentos que serão alvo de investimento estão bodycams, tasers e novas viaturas para a Polícia de Segurança Pública (PSP), mas Margarida Blasco lembrou que estas questões têm de passar por concursos públicos até poderem chegar aos agentes no terreno.

"Os concursos públicos são morosos e temos de cumprir a lei. Agora, há a nossa intenção de fazer um investimento em bodycams, tasers e no material que é necessário para a atuação da polícia. Obviamente que está inscrito e estamos à espera que os concursos terminem", vincou, esclarecendo sobre os dois concursos públicos já impugnados relativamente às bodycams que a decisão está nos tribunais e que o Governo aguarda por esse desfecho.

Margarida Blasco manifestou também a expetativa de que "brevemente" haverá conclusões sobre o inquérito que ordenou à Inspeção-Geral da Administração Interna (IGAI) sobre as circunstâncias da morte do cidadão cabo-verdiano Odair Moniz, após ser baleado por um agente da PSP na Cova da Moura (Amadora).

A ministra criticou ainda os desacatos na sequência desse caso e lembrou o motorista da Carris que ficou gravemente ferido dias depois, ao ser atingido num autocarro com um cocktail-molotov.

"Os tumultos que ocorreram durante a semana passada foram provocados por pessoas que só estão a praticar crimes, não podemos dizer isto com outras palavras. Há um motorista da Carris ferido, um autocarro que estava a servir a comunidade... Tenho a certeza de que a comunidade está com a sua polícia, porque sabe que a defende quando chama", disse.

Já sobre a relação da polícia com as comunidades de alguns bairros, como o Bairro do Zambujal ou a Cova da Moura, ambos no concelho da Amadora, Margarida Blasco reiterou que as pessoas dessas comunidades "conhecem a polícia" e que não se deve generalizar que estão contra os agentes.

Odair Moniz, cidadão cabo-verdiano de 43 anos e morador no Bairro do Zambujal, na Amadora, foi baleado por um agente da PSP na madrugada de 21 de outubro, no Bairro da Cova da Moura, no mesmo concelho, e morreu pouco depois, no hospital.

Segundo a PSP, o homem pôs-se "em fuga" de carro depois de ver uma viatura policial e despistou-se na Cova da Moura, onde, ao ser abordado pelos agentes, "terá resistido à detenção e tentado agredi-los com recurso a arma branca".

Nessa semana registaram-se tumultos no Zambujal e noutros bairros da Área Metropolitana de Lisboa, onde foram queimados e vandalizados autocarros, automóveis e caixotes do lixo, somando-se cerca de duas dezenas de detidos e outros tantos suspeitos identificados. Sete pessoas ficaram feridas, uma das quais com gravidade.

*com Lusa

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