Gouveia e Melo: "Não dei nenhum raspanete em público"

"A disciplina é a cola básica de quaisquer Forças Armadas do mundo", reiterou Gouveia e Melo referindo-se à polémica que envolve 13 militares que se recusaram a embarcar no navio Mondego, alegando razões de segurança.

O chefe de Estado-Maior da Armada disse esta sexta-feira que não optou "por nenhuma forma de raspanete" aos 13 militares que se recusaram a embarcar no NRP (Navio da República Portuguesa) Mondego, alegando razões de segurança, falhando assim uma missão de acompanhamento de um navio russo. Henrique Gouveia e Melo reagiu assim, em entrevista à SIC, às críticas de que foi alvo sobre a gestão que tem feito desta polémica.

"Falei à guarnição toda, sem individualizar nenhum grupo ou subgrupo, e, através deles, falei para a Marinha toda, porque um ato de indisciplina é um ato muito grave, que, tendo-se tornado público, tem de ter também uma resposta pública minha", justificou Gouveia e Melo o momento em que se dirigiu aos militares do navio Mondego.

"Não dei nenhum raspanete em público, falei com emoção sobre o que pensava de um ato de indisciplina nas Forças Armadas, em especial na Marinha, que é o ramo que eu sirvo", disse o chefe de Estado-Maior da Armada, acrescentando que "lamentava imenso" o ato de indisciplina "e que estava entristecido".

Gouveia e Melo disse que antes de se recusaram a embarcar no navio, os militares "tinham a possibilidade de tentarem por todos os meios comunicar", eventualmente até através do seu gabinete.

Voltou a referir que os "os atos de indisciplina nas Forças Armadas têm um significado profundo". "A disciplina é a cola básica de quaisquer Forças Armadas do mundo, a disciplina não tem ses, é uma necessidade", sublinhou, justificando que as Forças Armadas operam em "ambientes complexos, com urgência sempre e com risco de vida".

O valor da disciplina "tem um significado muito profundo para todos os militares", repetiu Gouveia e Melo na mesma entrevista.

Referiu, no entanto, que uma coisa são indícios, outra coisa é ter a certeza absoluta, "apesar dos indícios serem muito fortes", sobre ato levado a cabo pelo grupo de 13 militares. "Isso é que os processos que estão em curso vão fazer", determinar o que aconteceu, declarou Gouveia e Melo, indicando, porém, que "não quer julgar ninguém".

Confrontado com a posição das famílias dos militares que o acusam de estar a condicionar o processo de justiça que ainda não começou, Gouveia e Melo refuta a acusação. "Não estou a condicionar nada, porque o que aconteceu, de forma muito concreta, foi um ato de indisciplina, de acordo com o código de justiça militar e o regulamento de disciplina militar", disse.

Contou que "o comandante deu ordem à guarnição para se preparar para ir para o mar, que tinha uma missão para cumprir. Parte dessa guarnição disse que não ia cumprir a missão e saiu do navio e formou no cais, impedindo que o navio cumprisse a missão". O comandante tentou demovê-los, mas sem sucesso, disse ainda Gouveia e Melo.

Recorde-se que os militares que recusaram embarcar no Mondego alegaram que não havia condições de segurança. "Vão-se agarrar a tudo o que puderem para se justificarem. E quem vai avaliar, ou não, essa justificação serão, em caso criminal, os tribunais civis com militares envolvidos", afirmou.

"O comandante, os oficiais e os militares que ficaram acharam que o navio tinha condições para cumprir a missão", apesar de se reconhecer "problemas". "Os navios militares podem operar de forma muito degradada", explicou. "É raro um navio ter todos os sistemas operacionais", acrescentou.

"Nunca tive dúvidas da minha linha de comando", enfatizou.

De acordo com o relato que o comandante fez ao seu comando superior, "o navio estaria em condições de cumprir a missão".

Ainda assim, o grupo de militares recusou-se a embarcar no navio, falhando assim a missão. "O ato em si tem uma gravidade que já não se pode meter debaixo do tapete".

O Presidente da República "é o meu chefe supremo". "Tenho que o respeitar e tenho que obedecer. No entanto, penso pela minha cabeça"

Nas declarações à SIC, Gouveia e Melo fez saber que mandou fazer uma "verificação, através de outros organismos da Marinha", enviando para a Madeira, onde se encontrava o navio, uma equipa técnica especializada para averiguar se o navio "estaria ou não em condições, face às avarias que tinha".

"A resposta que tive é que sim, ia para o mar com limitações, mas sem pôr a guarnição em risco. Essa resposta vai ter de certeza um impacto na avaliação" do caso, considerou.

Foi ainda confrontado sobre as declarações do Presidente da República, que nas primeiras reações disse que a prioridade é o reforço dos navios e depois referiu que os militares apresentaram um conjunto de razões para fundamentarem a sua posição, nunca dando a relevância à disciplina como tem feito Gouveia e Melo.

"Não tenho que achar nada das declarações do senhor Presidente da República. É o meu chefe supremo. Tenho que o respeitar e tenho que obedecer. No entanto, penso pela minha cabeça", começou por comentar.

Sendo comandante militar, disse que tem de fazer um determinado conjunto de ações, "com a liberdade" que lhe é "concedida pelo estatuto de comandante".

"Os recursos são sempre escassos"

Sobre em que o ponto está a operacionalidade real da Marinha Portuguesa - independentemente da polémica do NRP Mondego -, Gouveia e Melo admitiu que "os recursos são sempre escassos".

"Neste caso, falo de recursos materiais, recursos financeiros e recursos humanos", referiu.

"A Marinha tem 33 navios. De acordo com o relato que o meu sistema de manutenção me disse hoje à tarde, tenho 15 navios de prontidão em 48 horas. Ou seja, eu posso disponibilizar 15 navios para missões em prontidão de 48 horas, e mais três em prontidão de cinco dias", avançou.

Nesse sentido, Gouveia e Melo afirmou que "uma Marinha que tem uma prontidão entre 40 a 50% é uma Marinha que tem alguma capacidade", indicou. "Todas as Marinhas do mundo têm prontidões que não são 100%", disse ainda.

"A nossa Marinha tem a prontidão que tem face aos recursos que tem. Com os recursos que nos dão, fazemos o máximo que podemos", destacou Gouveia e Melo. "A minha obrigação e a dos meus militares é fazermos o melhor e o máximo", declarou.

Por fim, sobre o impacto da polémica que envolve o navio Mondego perante os parceiros internacionais, nomeadamente a NATO, Gouveia e Melo disse: "Estamos permanentemente em missão, não é um ato em si que mancha tudo o que fazemos".

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