“Gostaríamos muito que nos tivessem dado tempo para nos pronunciarmos sobre a lei de estrangeiros", diz juíza
“Tal como uma lei não se faz num dia, um dia para emitir um parecer sério sobre uma matéria tão sensível, relevante e impactante na jurisdição administrativa e fiscal, não nos pareceu um procedimento adequado”, diz ao DN Eliana de Almeida Pinto, juíza-secretária do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais (CSTAF).
“Não tenho memória de nos ter sido dado um prazo tão curto para elaborar uma pronúncia”, lembra a juíza desembargadora.
A Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias deu um dia ao órgão de gestão e disciplina dos juízes desta jurisdição para se pronunciar sobre a lei de Estrangeiros, aprovada na especialidade por aquela Comissão na sexta-feira passada, dia 11 de julho, com os votos a favor do PSD, Chega, IL e CDS, (restringindo o reagrupamento familiar ou os vistos para quem entrou ilegalmente no país), com votação final marcada para esta quarta-feira, 16 de julho.
Eliana de Almeida Pinto recorre a um exemplo recente: “Nas últimas duas semanas, fomos notificados para vários pareceres e, em todos eles, o prazo concedido foi de 10 dias”. Por isso, a resposta foi clara: em tão curto prazo de tempo, o Conselho não emitiria parecer, seguindo as pisadas do Conselho Superior de Magistratura, a que foi dado exatamente o mesmo prazo.
Eliana de Almeida Pinto refere que o artigo 103, nº 1 alínea b) do regimento da Assembleia da República determina que a Comissão Parlamentar pode requerer informações ou pareceres para o bom exercício das suas funções. Por outro lado, o artigo 124, nº 3 do mesmo regimento determina que as propostas de lei devem ser acompanhadas de estudos e apareceres que as fundamentem. Ora, foi neste quadro que o CSTAF recebeu um pedido da primeira comissão. Contudo, no que diz respeito à proposta de lei 2 / XVII / 1ª, que procede à criação da Unidade Nacional de Estrangeiros e Fronteiras, bem como a proposta de lei nº3/XVII/1ª que altera a lei 23/2007 de 4 de junho (que aprova o regime de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional) o pedido de parecer veio com caráter de urgência, para ser emitido em um dia útil. “Este prazo não tornou possível a pronuncia deste Conselho Superior, recordando que a primeira comissão tem por hábito conceder, no mínimo, 10 dias”.
Não querendo emitir juízos de valor, a magistrada diz ser “uma evidência” a impossibilidade de avaliar e analizar a matéria.
É um procedimento ilegal? Eliana de Almeida Pinto distingue procedimento legal de procedimento adequado: “tecnicamente, ao enviar proposta de lei para parecer, a comissão assegurou o procedimento em termos legais, mas não este não é o procedimento adequado nem o normal nestes casos”, refere a Juíza desembargadora, que recorda o impacto desta legislação no dia-a-dia dos tribunais administrativos. “Somos nós que vamos aplicar a lei”.
Ao dar apenas um dia, procurava-se realmente um parecer, ou a comissão presidida provocou deliberadamente uma impossibilidade? Uma pergunta a que a juíza diz não responder.
Porém, concluiu: “Este Conselho gostaria muito de ter tido a oportunidade de elaborar um parecer, quer por ser legislação impactante no nosso trabalho, quer pela experiência que temos nesta matéria, podendo assim dar um contributo para o enriquecimento da legislação”. O Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais está disponível para emitir parecer “caso nos seja pedido e dado um prazo de dez dias”, sabendo, porém, que este processo legislativo está fechado.