A Maternidade Alfredo da Costa (MAC), que integra a Unidade Local de Saúde São José, em Lisboa, foi o local escolhido pelo Ministério da Saúde para assinalar o 46.º aniversário do Serviço Nacional de Saúde (SNS), este ano. Porquê? Porque “em silêncio, mas com dedicação e eficácia” tem conseguido “responder, até nos piores momentos, com a mesma generosidade e disponibilidade que o fazem nos tempos fáceis”, justificou a ministra da Saúde no seu discurso durante a cerimónia que ocorria um dia depois de mais um encerramento das três urgências de Ginecologia-Obstetrícia da Península de Setúbal. Ana Paula Martins não fugiu ao tema, começando por dar o exemplo da MAC, que “tem cumprido sempre”, e depois criticando quem não o faz, dizendo que há “outros que sempre colocaram o interesse maior do cuidar em oposição à crítica menor”. A ministra reconheceu ainda que “muitas outras instituições também têm sabido cumprir o seu dever” e que “muitos CA têm sabido ter liderança em momentos complexos e de enorme exposição”, mas há outros que não o fazem. “Importa sublinhar que este saber cumprir devia ser seguido por todos e não só por alguns”.Não é a primeira vez que se dirige aos gestores do SNS, mas, da primeira vez, o presidente da Associação Portuguesa dos Administradores Hospitalares (APAH) criticou as suas palavras. Agora, e após ter sido contactado pelo DN para comentar o discurso que assinala o aniversário do SNS, Xavier Barreto assume: “Acompanho a Sr.ª ministra nos elogios que faz, nomeadamente à administração da ULS São José e da MAC, e as críticas, de que nem todos cumprem”, disse. Acrescentando: “A APAH tem sido muito crítica de algumas nomeações por parte do Governo, que são muito mais políticas do que técnicas, e, portanto, acompanho a crítica de que algumas pessoas provavelmente não estão à altura do lugar que ocupam, mas tal deve-se, geralmente, ao facto de serem uma nomeação política e não técnica. E esta questão deve ser motivo de reflexão para os políticos, não para os administradores hospitalares de carreira”. . Xavier Barreto confessa ao DN que não ouviu todo o discurso de Ana Paula Martins, mas considera que as suas palavras não “parecem ser uma declaração de ataque a todas as administrações. Elogia quem tem de elogiar”. Depois deste discurso, a ministra chamou ao seu gabinete os três conselhos de administração das Unidades Locais de Saúde da Península de Setúbal, para uma reunião de urgência, e com o objetivo de discutirem os encerramentos simultâneos das urgências de Ginecologia-Obtetrícia - os quais tinha prometido que terminariam, a partir de 1 de setembro, com a contratação de mais médicos. Só que tal já foi quebrado este fim semana, com novo encerramento por médicos prestadores de serviço escalados não terem comparecido. Fontes do setor explicaram ao DN que, “certamente, a ministra estaria a referir-se às administrações destes três hospitais, e de outros, que não têm conseguido manter as urgências a funcionar, sobretudo na área de Ginecologia/Obstetrícia, e que, agora, ainda estão piores”. Contudo, sublinham, “não podemos esquecer que duas das três administrações foram já nomeadas por esta ministra, nomeadamente os presidentes dos conselhos de Administração das ULS de Almada, que integra o Garcia de Orta, Pedro Azevedo, e da ULS Arco Ribeirinho, que integra o Hospital do Barreiro, Ana Teresa Marques Teixeira. E se não conseguem mudar a situação, alguma coisa não está bem”. Do grupo destes três administradores faz ainda parte Luís Pombo, à frente da ULS Arrábida, que integra o Hospital de Setúbal, e se mantém no cargo desde janeiro de 2024, depois de ter sido nomeado pelo então ministro, Manuel Pizarro. .Comissão propôs criação de Centro Materno Infantil no Garcia de Orta para resolver problemas na Margem Sul . As nomeações feitas por este governo foram também relembradas pelo presidente da APAH, que diz: “O que vemos no discurso na MAC é uma ministra a assumir a responsabilidade de que alguns não cumprem, e se não o fazem terão de existir consequências”. Por outro lado, sublinha Xavier Barreto, é “preciso perceber exatamente o que é que aconteceu para que as três urgências da região de Setúbal voltassem a fechar em simultâneo”. “Não é a primeira vez que um prestador de serviço falha, possivelmente não será a última, mas quando o próprio ministério diz que vão ser contratados mais médicos parte-se do princípio que as falhas deixarão de existir. E não foi o que aconteceu”, frisa.Urgência Regional é "solução para a Península de Setúbal"Na opinião de Xavier Barreto, as urgências de Ginecologia/Obstetrícia da Margem Sul necessitam de “uma resposta consistente e sólida e foi esta a ideia com que fiquei que iria acontecer a 1 de setembro”, mas “não foi assim”. Recorde-se que a própria ministra disse que a partir desta altura haveria uma urgência aberta 24 horas, prometeu também a criação de um Centro Materno Infantil a funcionar no Garcia de Orta, mas tal também não avançou. Para o presidente da APAH a única solução é a “criação de uma urgência regional, onde os médicos dos três hospitais, Garcia de Orta, Setúbal e Barreiro, façam as suas horas de urgência num só hospital. Não é ter os médicos do Garcia de Orta a fazerem urgência com mais prestadores de serviço. É construir-se uma urgência com os médicos destes três hospitais, para que não haja falhas. É um modelo semelhante ao que existe no Porto há muitos anos. Não percebo porque é que não se consegue avançar com esta solução se até há sindicatos dispostos a discuti-la”. .Obstetrícia. Urgência do Garcia de Orta continua "sem equipa" e “só está aberta com médicos a fazerem mais turnos de 24 horas”. À hora do fecho desta edição, ainda não havia novidades sobre a reunião que decorria no Ministério da Saúde com as administrações das unidades da Península de Setúbal. Mas, de manhã, a ministra reconhecia que “46 anos depois, o SNS atravessa um período especialmente exigente, onde gostaria de relevar o desafio relacionado com os recursos humanos. Este será o maior desafio do SNS nos próximos 10 anos”, afirmou, assumindo que “os desafios relacionados com os recursos humanos exigem medidas a curto, médio e longo prazo”.