aO apagão energético e o consequente caos nas comunicações – com forte impacto na emergência médica, transportes, trânsito e abastecimento de combustível - que Portugal viveu esta segunda-feira, pode repetir-se, acreditam responsáveis do sistema de proteção civil e segurança ouvidos pelo DN, que defendem um sistema de back up via satélite para as comunicações de emergência.Em primeiro lugar, porque nem todas as entidades do sistema estão devidamente apetrechadas com meios técnicos para comunicar num cenário como este, e depois porque as comunicações de emergência são apoiadas num sistema, o SIRESP (Sistema Integrado de Redes de Emergência e Segurança de Portugal), que também falha quando as antenas de comunicações deixam de ser alimentadas por energia, seja por uma rutura como a que aconteceu, seja por um incêndio que destrói os cabos, o que também já aconteceu várias vezes, nomeadamente nos trágicos incêndios de 2017.Como resultado do crash das comunicações, por exemplo, o INEM (Instituto Nacional de Emergência Médica) “perdeu as ligações ao SIRESP, assim que a operadora Vodafone acusou problemas”, disse ao DN Rui Lázaro, presidente de um dos sindicatos do INEM, o STEPH. Para comunicarem, “alguns técnicos do INEM foram por sua iniciativa e com os seus telemóveis para quartéis de bombeiros, que tinham rede SIRESP ativa, para tentarem ajudar a resolver o problema”, acrescentou aquele dirigente. O INEM diz que esse é o protocolo previsto. “Isto provocou um atraso na ativação das ambulâncias. Mais de 100 ocorrências de triagem atendidas não tiveram resposta e mais de 400 não foram sequer atendidas”, continua Rui Lázaro.O pico das chamadas em espera e desligadas registou-se pelas 14h e, em comunicado, o INEM garantiu hoje que aquelas 100 chamadas foram entretanto já devolvidas e que as suas “aplicações próprias, de atendimento telefónico, triagem e processamento das chamadas mantiveram-se sempre operacionais”.O dirigente sindical considera “impensável” que, depois do apagão que o INEM viveu há cerca de um ano também por falha de comunicações internas, continue a manter apenas um contrato em exclusividade com uma operadora, não garantindo redundância de redes. “Hoje em dia qualquer pessoa já pode ter dois cartões de redes diferentes no seu telemóvel, mas o INEM que é a entidade responsável em caso de emergência está dependente de uma apenas, isto é impensável”, critica aquele dirigente sindical. “Temos de ter um sistema de back up por satélite. Estão à espera de quê? Do terramoto?”, questiona Rui Lázaro.SIRESP sem presidente há mais de um anoComo garantir então alternativas de comunicações num cenário de crash das operadoras? “A alternativa mais eficaz é apostar nas comunicações por satélite”, diz uma fonte policial ouvida pelo DN. E, no caso do INEM, já terão sido adquiridos telefones satélite, um por cada distrito, mas, segundo Rui Lázaro “não se sabe deles e não estavam a uso na situação de Matosinhos, por exemplo, em que não se conseguiu enviar uma viatura para ajudar uma mãe e um bebé”.No caso de comunicações por satélite para serviços do Estado como um todo, o adequado seria através de um satélite europeu ou mesmo português, o que tem custos elevados, admitem especialistas em segurança ouvidos pelo DN. Mas também há soluções bem mais baratas, da ordem dos 400 euros, como a que é prestada pela empresa Starlink do empresário Elon Musk e fornece acesso a dados ilimitados.Outra alternativa bem mais antiga e rudimentar, mas que se tem revelado resiliente em situações em que o digital falha são as redes de UHF/VHF. É, por exemplo, o sistema de comunicações em caso de emergência que usa a Câmara Municipal de Lisboa, mas também a GNR (Guarda Nacional Republicana) nos seus jipes que fazem a cobertura do território nacional.Segundo o DN soube, a generalidade das esquadras da PSP não têm geradores para carregar os rádios que usam nas suas comunicações internas e tiveram de recorrer também à estrutura dos bombeiros, que tiveram de apoiar não só o INEM, mas também a polícia durante o apagão.Segundo as informações recolhidas pelo DN, o SIRESP só foi reposto esta terça-feira na zona do Porto, Aveiro e Braga, mais de 24 horas após o apagão. Nos últimos anos houve um investimento em perto de uma dezena de antenas no Siresp, que, por sua vez, precisam de geradores e grupos de geradores, que têm de estar próximos das antenas. Medida que não terá corrido bem.Recorde-se que o SIRESP está sem presidente há mais de um ano, desde que o brigadeiro-general deixou o cargo em março de 2024, sem que o ministério da Administração Interna ainda tivesse avançado com um substituto. Na semana passada, o Governo suspendeu a extinção da empresa que gere o SIRESP, que, segundo as intenções do executivo anterior, passaria para a secretaria-Geral do MAI, decidindo atribuir a esta entidade uma indemnização compensatória de até 19,5 milhões de euros para que continue a funcionar em 2025, justificando a decisão com a proximidade de eleições legislativas.O Estado tinha contratado por 75 milhões de euros, o fornecimento de serviços pelo SIRESP durante cinco anos (2023 a 2027), uma média de 15 milhões anuais, significando uma redução de encargos para menos de metade do que estava a ser despendido. Segundo os cálculos do Tribunal de Contas, desde o início do contrato em 2006 até 2019 (14 anos) o SIRESP custou ao erário público uma média de 37 milhões de euros por ano.Enquanto alguns questionam a resiliência do SIRESP, a empresa controlada pelo Estado garante, no seu relatório de 2024, que “o Estado tem hoje um sistema de comunicações de emergência e segurança mais resiliente, robusto e seguro”, ao cabo de dois anos de modernização e transformação, com uma “refundação da infraestrutura e dos serviços de comunicações “missão crítica” que a empresa presta a quase 50.000 utilizadores e a 182 entidades (públicas e privadas) nas áreas da emergência e segurança de Portugal, numa lógica de serviço público e de salvaguarda da soberania do Estado”. Funções que eram asseguradas por entidades externas, passaram para a esfera do Estado e otimizou-se a gestão e controlo das operações da rede por parte da Siresp, S.A., considera a empresa..Apagão. MAC teve ventiladores em risco, consultas e cirurgias adiadas e receitas voltaram ao papel.Com mais centrais de arranque o apagão teria durado três horas e não 11.O dia depois do apagão: “Isto foi um avisozinho, não foi?”