Cerca de 100 mil pessoas têm epilepsia em Portugal, mais do dobro do que indicavam os dados anteriores, e quase metade não tem um seguimento médico da sua doença neurológica, estima um estudo divulgado esta terça-feira, 30 de setembro.Os resultados do estudo epidemiológico EpiPort, da Liga Portuguesa Contra a Epilepsia (LPCE), apontam para uma prevalência de 9,76 casos por 1.000 habitantes, bastante superior aos 4,4 casos identificados no último estudo, realizado há cerca de 30 anos e apenas na região norte.“Era um número que se mostrava abaixo dos outros países da Europa e mesmo da prevalência global que tinha sido descrita num relatório da Liga Internacional contra a Epilepsia. Parecia que nós tínhamos uma prevalência menor e, de facto, isso não se confirmou. Nós temos uma prevalência 2,2 vezes maior da epilepsia em Portugal”, adiantou à agência Lusa a presidente cessante da LPCE.Segundo Carla Bentes, o novo estudo, que envolveu um inquérito a mais de 10 mil pessoas em todo o território nacional, estima um total de 100.993 casos desta doença neurológica no país.“O que nós vimos não foi que existissem casos não diagnosticados. O que vimos foi que muitos destes doentes não têm seguimento médico, nomeadamente cerca de 43,7%, o que é algo que nos deixa algo alarmados”, salientou a neurologista.Os resultados indicam ainda que 20% dos doentes com epilepsia não tinham uma crise há mais de 10 anos, adiantou Carla Bentes, para quem estes dados aconselham um “maior seguimento e um melhor seguimento destes doentes”.Além disso, o estudo apurou que muitos doentes estão a tomar vários fármacos anticrise epilética, o que “significa que provavelmente existem mais doentes com epilepsia refratária do que aquilo que era pensado”, realçou a especialista.“Será que os doentes com epilepsia refratária estão mesmo todos a ser seguidos ou, pelo menos, a ter uma avaliação num dos cinco centros de epilepsia refratária que existem em Portugal e que foram constituídos exatamente com esse objetivo? Provavelmente não”, admitiu.Em cerca de um terço das pessoas com epilepsia a medicação é insuficiente para um controlo adequado das crises epiléticas. Quando já foram tentados dois regimes de fármacos e as crises persistem é considerada epilepsia refratária, também conhecida por epilepsia fármaco-resistente.Perante as conclusões apuradas, a LPCE, uma sociedade científica criada em 1971, considera ser necessário “repensar a epilepsia e a forma como estes doentes são seguidos em Portugal”, referiu a especialista, que espera que o estudo possa contribuir para que sejam “tomadas medidas para melhorar o seguimento clínico dos doentes”.Carla Bentes alertou também para o “impacto enorme” da doença, que tem consequências neurobiológicas, psicológicas, sociais, profissionais e familiares nos doentes.A epilepsia é uma doença com origem no cérebro e que se caracteriza pela ocorrência de crises que se devem a uma descarga anormal dos neurónios (células cerebrais) de forma súbita e imprevisível.Estas crises são habitualmente de curta duração - alguns segundos a poucos minutos - e a sua frequência varia de pessoa para pessoa. As causas para a epilepsia podem ser genéticas, metabólicas, autoimunes, infeciosas, mas as causas desconhecidas representam ainda cerca de um terço dos casos.O estudo pretendeu estimar a prevalência da epilepsia em Portugal e contou com o acompanhamento de um comité de especialistas que se dedicam ao diagnóstico e tratamento da doença e que validou os resultados dos inquéritos.