Paulo, Marta, Carla e Carlos apaixonaram-se pelo socorro em emergência. Primeiro, como “um bichinho interior”. Depois, como “algo mais profundo”, que foi crescendo através da formação, da prática, do conhecimento adquirido e pelo lado humano de cada situação. Mas não só. Também pela aprendizagem interior e individual que cada um faz para se aguentar na profissão, que, afinal, foi a que escolheram para si. Mesmo que tenha sido só por alguns anos, porque, quando se sai, “continua-se a sentir a falta do terreno, sonha-se com isso”, mas “há outras prioridades”, confessa Carlos, ‘o Azevedo’, como era conhecido na base do INEM de Lisboa. Para Paulo, Marta e Carla, que atuam em bases no Norte, o INEM continua a ser a sua “missão”, “um amor profundo” ou “o orgulho no que se faz”. Apesar do desgaste físico, pelas lesões que contraíram, pelas doenças que vieram a descobrir ou pelas incapacidades atribuídas pelas juntas médicas, ou psicológico, que também já os atirou para as crises de ansiedade, para o burnout, para as baixas médicas por tempo sem fim ou para os comprimidos diários. Ainda assim, dizem, preferem continuar a lutar por “melhores condições” do que “desistir”..Paulo tem 54 anos. No final de 2024, completa 23 anos e seis meses como técnico do INEM, agora na base de Rio Tinto como elemento de ambulância. “Se me fizerem uma TAC à coluna, vão ver que, provavelmente, está toda destruída”, diz em tom de brincadeira, mas vai “continuar, se calhar, até quando tiver que ir buscar algum doente já de muletas ou de andarilho”. Marta, de 47 anos, mulher de Paulo, começou nas telecomunicações do INEM, fez formação e passou para as ambulâncias, mas o diagnóstico de fibromialgia atirou-a para o CODU (Centro de Orientação de Doentes Urgentes). Hoje, tem dias melhores e dias piores, “devido à doença e conforme o stress”, mas não pensa em sair. Carla, de 42 anos, começou nas ambulâncias, mas em 2021 passou para a área da certificação da formação. Uma queda em serviço provocou-lhe a “rotura do tendão supra espinhal” e a partir daqui “os esforços tornaram-se muito dolorosos”. Não quer sair do INEM, mas confessa que já pensou nisso..Sobre a greve de há duas semanas, todos dizem o mesmo: “Foi muito pensada”, “nunca tinha acontecido”, “somos ignorados há demasiado tempo”, “gostávamos que o nosso trabalho fosse reconhecido” e “ter outras condições para o fazer”. Com a greve foram anunciadas 11 mortes suspeitas de poderem ter ocorrido por falta de socorro atempado, que estão a ser investigadas pela Inspeção-Geral das Atividades em Saúde (IGAS) e pelo Ministério Público, mas se há responsabilidades, estas, “não são dos técnicos”. E esperam que o poder político tenha acordado para a importância do “nosso trabalho” e para “as reivindicações que há muito pedimos”. .Mas se há algo para que esta greve veio alertar, dizem, “foi para as fragilidades que existem nos departamentos do Estado”. “Não foram definidos serviços mínimos. Como é possível?”, comenta Paulo. Ou melhor, foram definidos três minutos antes do turno da tarde/noite do dia 4 de novembro, precisamente no dia em que havia uma greve da Administração Pública em simultâneo. A ministra da Saúde pediu à IGAS que investigasse responsabilidades nesta matéria, na gestão da greve e do seu impacto. E se houver responsabilidades da sua equipa, “saberá interpretar os resultados”, disse-o há dias no Parlamento. Para os técnicos de emergência, e independentemente de todas as investigações, nada mudará no socorro emergente ao país se a atitude “não mudar”, porque “não há socorro sem técnicos”..“Dentro das ambulâncias, os técnicos também choram”.Paulo Macedo fala com o DN antes de entrar ao serviço em mais um turno noturno. Não consegue explicar como nasceu o “bichinho interior” que sente ao trabalhar na emergência pré-hospitalar. Começou na Cruz Vermelha, como voluntário, onde adquiriu “conhecimentos”, mas o concorrer ao INEM e fazer formação para técnico de emergência já foi uma opção sua. Ao fim de tantos anos, reconhece que “é uma profissão esgotante”. “Não tanto do ponto de vista físico, porque mesmo com a minha idade continuo a subir três, quatro ou cinco andares, para socorrer um doente, e a trazê-lo na maca ou em cadeiras de rodas, mas pelo desgaste psicológico. É o que nos afeta mais”, assume..A sua sorte é que em casa tem a mulher, Marta, com a mesma profissão, e “nunca evitamos falar sobre os assuntos que nos tocam, já percebemos que nos ajuda”, embora reconheça que, neste momento, seja ele quem tem mais desabafos, sobretudo quando “o turno mete chamadas com crianças, idosos ou com pessoas que ainda vivem em condições deploráveis. Ou quando mete ferimentos graves ou paragens cardiorrespiratórias que terminam mal”. Sabe que tem de se aguentar, porque “à frente do doente não se chora”, mas quando se termina o serviço “entramos na ambulância e, aí, sim. Os técnicos do INEM também choram”..Momentos que mais tarde travam o sono ou aparecem em sonhos, que levam ao desespero de tanto se pensar neles. E foram tantos momentos destes que há dez anos o obrigaram a parar. “Tive um esgotamento e entrei em baixa psiquiátrica”, confessa. O tempo de baixa não se lembra ao certo, recorda apenas que terá sido “um ano ou pouco mais”. “Comecei por estar fechado num quarto escuro, dormia todo dia, toda a noite, sob o efeito de medicação. Depois, não conseguia sair de casa, sempre a pensar no mesmo. Tinha tido uma fase de situações muito complicadas, cheguei a ter os psicólogos do INEM a ligarem-me para saber como estava”, conta..Deixou-se andar, sempre a acreditar que não era preciso pedir ajuda. “Acontece muito, serem os próprios técnicos a achar que vestiram a camisola e que têm de cumprir até ao fim para ajudar os outros”, justifica..Na altura, teve algum acompanhamento dos psicólogos do instituto, mas, hoje, considera que “o acompanhamento psicológico dado aos próprios técnicos não é linear. Os psicólogos do INEM também têm de responder às situações que aparecem e acabam por ter imenso trabalho, não são muitos em todo o país”. No caso dele, foi o seu esforço que o fez “conseguir voltar e a seguir em frente”, assumindo sem medo que todas as manhãs ainda toma “um medicamento”, para aguentar as situações e atenuar as crises de ansiedade, porque “não temos de lidar só com a gravidade dos casos, mas com insultos e agressões”. Antes, quando isto acontecia “o coração começava a bater muito depressa e era uma pressão enorme”, hoje já sabe como manter a calma..Por isso mesmo, quando lhe perguntamos se aos 54 anos não pensa em sair, responde: “Não há hipótese.” “Quando alguém precisa de ajuda continuo a ir a correr. Às vezes a minha mulher diz que até tem vontade de me bater, porque não sei ficar quieto”. Por isto também, reforça que “a greve não foi feita de ânimo leve” e que “se fosse outra classe nem sequer havia notícia, era uma greve às horas extraordinárias”. “Todos nós temos de fazer horas extras obrigatórias por lei, são 150 ao ano, mas chega a maio e já as fizemos. A partir daqui, quem quisesse poderia não fazer mais, mas as horas extras são necessárias para o trabalho normal, o que indica falta de pessoal”, argumenta. Mas para se conseguir mais técnicos e manter os que lá estão “é preciso uma valorização salarial e mais condições de trabalho”. Paulo não entende como “esta profissão não é considerada de desgaste rápido, todos os estudos feitos o comprovam”. “Transportamos todos os dias pessoas de vários andares, alguns com peso excessivo, com monitores às costas, garrafas de oxigénio e em cadeiras de rodas. Isto provoca traumas nos braços, nos punhos, nas mãos, até nos joelhos, porque temos de fazer compressões e imobilizar pessoas”. Para não falar do “stress e da pressão que estamos sujeitos em pensar rápido e tomar decisões rápidas”. Para o futuro, Paulo só espera que “este trabalho seja reconhecido”..Marta Moreira e Paulo Macedo integram a estrtura do INEM no NorteFoto André Rolo.“Tenho muito orgulho no que faço e nem penso em mudar”.Marta Moreira escuta Paulo, o marido, a contar a sua história. Ela está há 11 anos no INEM e já teve de deixar o socorro nas ambulâncias para se dedicar só ao atendimento no CODU, mas como diz: “Não há emergência sem CODU e tenho muito orgulho no que faço”. Antes de integrar a estrutura do INEM, trabalhava na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, onde “não estava propriamente satisfeita com o que fazia. Era um trabalho rotineiro e quando surgiu um concurso para a área das telecomunicações do INEM pensei que era a altura ideal para mudar. Concorri e fiquei. Fui gostando da dinâmica e depois decidi fazer a formação para técnico d emergência e, aos 36 anos, descobri que era aquilo que gostava de fazer”..As dores nos ossos apareceram ao fim de alguns anos. “Tinha dores de não aguentar agarrar em pesos, andar com garrafas de oxigénio, monitores, aspiradores e nem para carregar com pessoas. Houve dias em tinha mais dores do que alguns dos doentes que ia buscar”. O serviço de rua tornou-se “doloroso”. Foi ao médico e começou a fazer exames, passando a ser seguida em várias especialidades até que lhe diagnosticaram fibromialgia e teve de deixar “as ambulâncias”..A doença nunca foi associada à profissão, mas Marta diz saber que “foi por causa da profissão”. Não a incomoda estar “do outro lado, no atendimento, na triagem rápida, porque os momentos de compensação, aqueles em que se sente que se ajudou o outro, também existem. “Temos muitas chamadas que atendemos, sobretudo as que envolvem crianças, que a única vontade que temos é de saltar para lá do fio do telefone”, conta. Há uma que não esquece. “Foi logo no início de estar no CODU. Recebo a chamada de uns pais com um bebé de uma semana e meia, que não respirava. Quando percebi, o meu coração quase parou. Tive de me manter calma e comecei a dar indicações aos pais, mas só tinha vontade de saltar para o outro lado. Os pais foram fazendo tudo o que disse até chegar o socorro. Quando comecei a ouvir o bebé a chorar do outro lado, foi um alívio. Não me lembro de ficar tão contente com o choro de um bebé. Salvou-se mais uma vida”..Reconhece que sentada ao telefone, às vezes em teletrabalho, devido à doença, “não há tanta liberdade de ação” como na rua. “Somos muito controlados, chegando ao ponto de termos de pedir autorização para ir à casa de banho ou para tirar 15 minutos de pausa, para descansar ou até para uma refeição. Acabam por ser muitas horas sentada, na mesma posição, e quem liga para o CODU não está propriamente bem. Há quem esteja ansioso, doente e há quem esteja frustrado ou nervoso começando a chamada aos berros ou aos insultos”, desabafa. Ao técnico, cabe-lhe “manter a calma, mas isto associado ao próprio barulho na sala do CODU é muito desgastante”. “E há dias que parecem estar predestinados, se o turno começa com uma chamada destas é assim o tempo todo. Imagine quando temos de fazer um turno de oito horas e mais outro a seguir. Como se costuma dizer não mata, mas mói”. No fim, confessa, precisa “do silêncio de um quarto às escuras”..A fibromialgia atirou-a já várias vezes para a baixa, até a nível psicológico. No início da doença ainda teve “algum acompanhamento dos psicólogos do INEM”, que ligavam para saber como estava e para dar algum seguimento, mas “durou pouco tempo, nunca mais ninguém o fez”. Considera, por isso, que deveria haver “um departamento só para apoio aos profissionais”..Marta e o marido chegam a ter dias em que um entra ao serviço e o outro vai dormir ou tempos em que não conseguem folgar na mesma altura. “É cada vez mais difícil tentar conjugar a vida profissional com a pessoal”, comentam. E esta é, precisamente, uma das reivindicações da classe, mas para Marta uma coisa é certa: “Independentemente das condições e de não poder fazer rua, visto a camisola e não penso em mudar”..Apesar do desgaste, há situações que compensam.“Estive três meses a cumprir turnos sentada numa cadeira sem funções atribuídas”.Carla Soares tem 42 anos e 16 de INEM, para onde entrou depois de fazer formação para técnica de emergência pré-hospitalar, na altura ainda com outra designação. “A designação de TEPH surge em 2016 com a alteração da carreira”, explica ao DN. Ao longo dos anos, foi aprendendo “a trabalhar a maturidade emocional para conseguir lidar com as situações sem grandes consequências”, mas hoje “ainda me custa falar ou relembrar certos momentos”. “Quem está no INEM tem de gostar muito. Não é pelo ordenado, que agora é público, nem pelas condições de trabalho, é mesmo pelo amor a uma causa, a uma missão que tem de ser cumprida”, assegura. E foi isto que “me levou a aguentar muitos anos e muitas situações, até de pressão profissional por ser dirigente sindical”..Conta mesmo que, nestes anos, teve “vários processos disciplinares e queixas na Autoridade do Trabalho”. “Foi sempre tudo arquivado e não vejo outra razão para isto senão o facto de estar ligada ao sindicato, porque a nível profissional não tinham onde pegar”. E o tempo mais difícil no INEM foi aquele em que passou “turnos de oito horas sentada numa cadeira sem funções atribuídas”. “Seguramente, estive assim mais de três meses”. Quando perguntamos, se não se queixou à própria direção do INEM, responde: “Claro, a resposta era sempre a mesma. ‘Tens de ter calma, tens de levar as coisas de outra forma’”. Até que, um dia, fez uma exposição à ministra Marta Temido e foi quando “me tentaram resolver o problema e me colocaram como terceiro elemento na ambulância”..Carla tinha regressado de baixa prolongada e a junta médica tinha-lhe atribuído um grau de incapacidade, devido a uma queda em serviço. “Caí e fiz uma lesão no ombro, mas deixei andar, e se calhar não fui bem acompanhada. O trabalho de rua começou a tornar-se doloroso. Tive de ir para a baixa e descobri que tinha uma lesão grave num tendão do ombro. Estive quase um ano sem conseguir trabalhar e quando regressei trazia limitações. Foi um dos momentos mais difíceis da minha vida, não só tinha de me adaptar a esta situação como tinha de lidar com o facto de não ter funções atribuídas. Tive crises de ansiedade dentro do gabinete de psicologia do INEM”, conta. O que ajudou, de algum modo, foi a solidariedade dos colegas, que “me tentavam acalmar, mas eu já não sabia o que fazer”..Surgiu o burnout. “Passava noites sem dormir, era uma pessoa que tinha muitas atividades, mesmo fora do serviço, e deixei tudo. Era do trabalho para casa e mais nada”. Depois da exposição à ministra, atribuíram-lhe um lugar em ambulância. “Passei a ser o terceiro elemento, dava apoio aos colegas, embora com limitações, até ao momento em que tive mesmo de sair”, porque, argumenta, “os serviços também não estão preparados para se ajustar às incapacidades que as pessoas vão adquirindo”..Em 2021, em plena pandemia, surgiu um concurso interno para o gabinete de formação, concorreu e ficou. Tudo ficou mais calmo em relação à pressão que sofria por ser dirigente sindical. “Não andava na rua, não tinha tanta noção do que estava a acontecer e do que estava a falhar. Agora, sou só associada do sindicato”, explica. Está na área de certificação para a formação, o que exigiu também um caminho de adaptação, mas acha que conseguiu. “Gosto do que faço, o serviço é incrível e faz-me super bem”, mas as complicações voltaram depois de ser mãe pela segunda vez. “Tenho um bebé de quase um ano e outro com quatro anos, ora fica um doente, ora outro, acabo por faltar. Esta semana vieram ter comigo e perguntaram-me se não era melhor eu pensar em mudar de serviço. Pedi que me propusessem isso por escrito, e disseram-me que era apenas uma sugestão, isto desgasta”, desabafa..“Estas situações só fazem com que eu olhe para os meus filhos e fique ansiosa só de pensar que vão adoecer. O problema não é ter de lidar com a doença deles, é eu ter de dizer que não posso ir trabalhar. Há dias ouvi o presidente do INEM a dizer que não se pode perder nem mais um técnico, mas se estas situações de pressão se mantiverem, porque no INEM há pessoas que gostam de ter os amigos por perto, mais gente vai sair. Não sou só eu que passo por isto”, alerta..Carlos Azevedo, dentro da ambulância, é hoje operacional da Proteção Civil, mas assume que o INEM ainda está presente..“Sinto falta do terreno, mas há outras prioridades”.Era conhecido como P1, e explica porquê: “É o código para chamadas graves e não havia um turno em que eu estivesse que não houvesse uma situação destas”. Carlos Azevedo, ou o ‘Azevedo’ - “como ainda hoje sou tratado” -, tem 39 anos e iniciou a sua vida na área da emergência pré-hospitalar, em 1999, como voluntário numa corporação de bombeiros. Mas começa por dizer: “Sempre acreditei no INEM, a minha corporação teve sempre muita gente a trabalhar no instituto”..Um dia, em 2015, decidiu mesmo candidatar-se a um concurso para integrar o grupo de técnicos de emergência. “Não pensei que entrasse, quando cheguei para fazer a primeira prova havia cinco mil pessoas, o que não se vê agora. E achei, sou louco por estar aqui, mas não fiquei mal posicionado na prova, passei à outra fase e entrei”. Foi colocado na base de Lisboa, junto à Avenida de Roma, e sentia-se “preparado para todas as situações”. “Tinha até alguma frieza. E gostava muito do que fazia na rua, até sinto falta”, sublinha. Mas, ao fim de um tempo, começou a sentir “um desgaste enorme. Tinha de fazer vários turnos extras, as escalas chegavam a ser alteradas na véspera ou no próprio dia, quando já estávamos quase a entrar de turno, para se preencher os buracos e não deixar ambulâncias paradas. E tudo isto começou a complicar muito a minha vida”, conta.. Ele era dos que queria mais da profissão. Queria fazer formação e não conseguia, apesar de ser obrigatório. “Posso dizer-lhe que quando lá estava foram publicados vídeos de atualização de técnicas de trauma à população, que não foram testadas pelos técnicos. Não havia tempo. Sentia cada vez mais que o nosso trabalho estava a ser esquecido”, diz. .Começou a pensar em sair pois “num mês era capaz de ter quatro dias de folga” e “com família e filhos pequenos era complicado”. Chegou a pandemia e “eram turnos atrás de turnos”. “Não podia ser. Tinha de fazer alguma coisa pela minha vida. Tinha de dar mais qualidade de vida à minha família. Quando vi que havia um concurso para técnicos para a Autoridade Nacional da Proteção Civil não pensei. Concorri e entrei”..É onde está desde julho de 2021, na sala de operações a coordenar meios operacionais, aéreos e viaturas. “O INEM ainda está presente, mas ganhei muito mais em qualidade de vida, em tempo para mim e para a família”, assume. Só gostava que a saída tivesse sido de outra forma, mas se, por acaso, tivesse dúvidas abandonar a profissão, o que se passou 15 dias antes de deixar o instituto tinha sido determinante. “Estava a duas semanas de sair para a Proteção Civil, quando surgiram os fogos em Ourém. Fui chamado à pressa para ir com uma equipa. Tive de deixar o meu carro, na altura ainda o estava a pagar, numa zona a que chamamos quinta, e onde eu e os meus colegas deixávamos [as viaturas] quando nos deslocávamos para longe. Mas houve um incêndio na zona que se estendeu àquele espaço. As viaturas do INEM arderam e os nossos carros também. Houve um inquérito interno e ainda fui tratado como ‘culpado’, por ter deixado ali o carro”..Carlos emociona-se ao falar do assunto. “Foi uma situação muito difícil para mim e para a família”. No dia em que fala com o DN, terminava o trabalho final do curso que tirou na Lusófona. Há outras prioridades além do INEM. .O que reivindicam os técnicos?.O INEM tem 724 Técnicos de Emergência Pré-Hospitalar (TEPH). Faltam-lhe 762 para atingir os 1486 que há dez anos foi considerado o número ideal para funcionar de forma adequada. Mas o sindicato que representa a classe diz que fazem falta mais 350 para dar resposta às necessidades atuais. Ao todo, cerca de 1100 novos técnicos. Isto porque em dez anos saíram cerca de 500 técnicos, devido às condições de trabalho. Os TEPH recebem ao final do mês 920 euros e reivindicam a revisão da carreira, para que seja valorizada de acordo com o nível de exigência que comporta; a revisão do índice remuneratório, que é “demasiado baixo” para uma atividade de 365 dias durante 24 horas; a revisão do sistema de avaliação, já que “o atual “tende a beneficiar quem está em cargos de chefia”; a adoção de medidas que permitam conciliar a vida profissional com a pessoal, como mais apoio no acesso à habitação quando estão deslocados; e a responsabilização dos dirigentes “pelas ilegalidades cometidas” nos últimos anos.