Na próxima semana, advogados e solicitadores escolhem quem vai estar à frente da Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores (CPAS) para o triénio 2026-2028. O pleito está marcado para os dias 26, 27 e 28 de novembro, com a disputa entre dois candidatos ao cargo. O DN entrevistou ambos. Victor Alves Coelho, que tenta a reeleição para a presidência, onde está desde 2022, e Oliveira Gomes, que tenta pela terceira vez ser presidente. De forma resumida, Coelho afirma ao jornal que quer continuar o trabalho que está a realizar na CPAS, enquanto Gomes ressalta exatamente o contrário, que é hora de outra visão assumir a direção da previdência destas duas classes profissionais. Portanto, a disputa é entre a continuidade ou mudança, e caberá aos quase 45.000 inscritos, entre advogados e solicitadores.E o que pensam os candidatos sobre os temas centrais da CPAS? O DN questionou sobre a possível integração da Caixa com a Segurança Social, defendida pela antiga bastonária da Ordem dos Advogados Fernanda de Almeida Pinheiro e que está pendente no Parlamento, uma livre escolha dos regimes, as propostas para os jovens e os principais desafios da CPAS atualmente, bem como as propostas para colmatar estes desafios.Razões para a candidaturaVictor Alves Coelho: “Decidi recandidatar-me, juntamente com toda a minha equipa, porque não foi possível levarmos àvante todas aquelas que eram as medidas a que nos propusemos no mandato de 2023 a 2025. Como sabe, até porque fui público, a senhora bastonária da altura, Fernanda de Almeida Pinheiro, teve uma visão completamente diferente da minha e procurou junto da Assembleia da República, dos diversos grupos parlamentares, que fossem levadas avante propostas, basicamente no sentido da livre opção aos advogados, mas, em última análise, a integração das CPAS na Segurança Social.”Oliveira Gomes: “Desta vez, tal como sucedeu também nas anteriores, conhecendo eu, portanto, o estado atual da CPAS, quer do ponto de vista financeiro, quer do ponto de vista demográfico, quanto à sua sustentabilidade, é principalmente este fator que me preocupa. Entendemos que esta direção não está preocupada com a questão demográfica, nem está preocupada com alargar a nossa base contributiva. É hora de mudar, até porque esta direção está lá há muitos anos, o senhor Victor Alves Coelho compõe a direção da CPAS há mais de dez anos.”Integração com a Segurança SocialVictor Alves Coelho: “Nós tivemos, desde o início do nosso mandato, muitas reuniões também com os grupos parlamentares, houve várias propostas que foram apresentadas e, desta vez, foi solicitado à CPAS que elaborasse uma série de pareceres sobre cada uma das propostas. Todas essas propostas foram recusadas, aliás, em boa verdade, foram recusadas em duas legislaturas sucessivamente, mas daí resultou uma recomendação ao Governo no sentido de ser constituída uma comissão de avaliação sobre o regime. Esse grupo técnico não avançou os trabalhos ainda até a final, não conseguiu fazê-lo dentro do prazo que estava predeterminado, que terminaria em finais de junho, entretanto meteram-se as férias, etc. Nós estamos à espera que haja um despacho de prorrogação do prazo do grupo técnico..Oliveira Gomes: “Para a integração da CPAS, tal como aconteceu com os bancários, no regime geral da Segurança Social, foi nomeada até uma comissão de trabalho, mas ainda não há relatório sobre isso. E parece-me que cada vez se encontra mais desacreditada essa questão. Também pelo facto de o próprio Governo não estar muito interessado, porque isto também teria de ser negociado, se fosse o caso, garantindo todos os direitos e pensões em pagamento que nós temos. Seria um processo muito complexo. E nós verificámos já, com o sistema bancário, quando os bancários foram integrados, não houve problemas e muitos deles perderam direitos. E, portanto, nós também não queremos que isso possa vir a acontecer connosco. De forma que essa opção de integração, não está na minha opinião, atualmente em cima da mesa. Eu até concordaria com a possibilidade, se o Governo garantisse todos os direitos aos reformados e aos contribuintes, a igualdade de circunstâncias, que não houvesse desvalorização das suas carreiras contributivas, nem das pensões a pagar, que fossem criados mecanismos de cumprimento daquilo que são os nossos direitos que estão estatutariamente consagrados no nosso regulamento interno. Se houvesse uma assembleia geral de advogados que aceitasse, de facto, essa situação, pois também não era uma coisa que me surpreenderia, uma aceitação total dessa situação.”Um regime de escolhaVictor Alves Coelho: “Neste momento não existe em Portugal nenhum cidadão que tenha essa opção e, portanto, seria estranho que os advogados pudessem ter. Por outro lado, o regime da CPAS, como o regime da Segurança Social, são regimes de repartição intergeracional. Os beneficiários que estão no ativo e que pagam as suas contribuições, com esse valor são pagas as pensões de reforma, os subsídios de sobrevivência, os subsídios de invalidez e os demais apoios. O que se passa é que alguém que fosse hoje beneficiário da CPAS, se quisesse transitar ou pudesse transitar para o regime da Segurança Social pública, não levaria consigo o valor correspondente à carreira contributiva que já tinha nas CPAS, porque esse dinheiro é utilizado para o pagamento das pensões.A livre opção, em teoria, é um benefício, é uma benesse que se concede a alguém, mas, na realidade, na prática, primeiro, nada disto foi estudado. As pessoas que transitassem, o que é que faziam? Começavam uma nova carreira na Segurança Social. Em que termos é que a Segurança Social nos iria receber? Por outro lado, um obstáculo que desde o início coloca em crise qualquer hipótese desse tipo, é aquela questão de ser um sistema de repartição. Se eu tenho 40 mil beneficiários na sua quase totalidade que pagam as suas contribuições e com elas eu pago as pensões e os subsídios. Se saírem, vamos imaginar, ainda que seja 20% desses beneficiários, deixa de haver dinheiro para suportar aquelas pensões que, entretanto, já foram atribuídas. Ora, isso inviabiliza qualquer sistema de repartição e, portanto, se viesse a ser decidida uma coisa desse tipo, o que iria acontecer?”Oliveira Gomes: “A liberdade de escolha dos regimes não é possível. E porquê? Porque, de facto, o nosso regime de previdência, tal como a Segurança Social, vive assente na responsabilidade intergeracional. Isto é, os jovens, eu, quando contribuí, paguei as contribuições dos reformados. Eu reformei-me este ano, por exemplo, embora continue no ativo, a trabalhar. Mas, os jovens, eu espero que, tal como eu fiz perante os outros, em que assumi durante 30 e tal anos essa minha responsabilidade, que os outros agora façam o mesmo por mim. E, portanto, se de repente fosse dada a livre opção aos advogados, no sentido de que o regime de contribuição não fosse obrigatório para a CPAS... e eu compreendo que até possa haver colegas que, além de advogados, também possam ser trabalhadores por conta de outrem, no sentido de também fazer simultaneamente descontos para a Segurança Social. Ou então, mesmo noutras situações concretas, de a pessoa querer não contribuir para a CPAS e optar só por outro regime de Segurança Social. Como digo, isto iria resultar numa sustentabilidade apenas a curto prazo da nossa Caixa de Previdência, e não é isso que nós queremos..DesafiosVictor Alves Coelho: “Para nós, é a sustentabilidade. Na nossa direção temos o objetivo de melhorar a solidariedade, melhorar os apoios. Foi feito, durante estes últimos tempos, um grande alarido relativamente à questão da sustentabilidade das CPAS, procurando que as pessoas acreditassem que a CPAS era insustentável. Não é verdade, mas nós temos de ter consciência, e temo-la, de que qualquer sistema de repartição tem dificuldades, em termos futuros, que decorrem fundamentalmente da evolução demográfica que existe. E a isso nós não poderemos fugir. Mas é um problema da Segurança Social, como é um problema das CPAS, sendo que na relação entre beneficiários ativos que fazem as suas contribuições e pensionistas, por velhice, de reforma, os ativos das CPAS são muito superiores aos da Segurança Social. A Segurança Social, nos últimos números que nós tínhamos apontava para 1,8 ativos por pensionista, nas CPAS tem algo muito perto de sete por pensionista.Oliveira Gomes: “A sustentabilidade da CPAS preocupa-me muito. Nós temos aqui um cenário, a partir do relatório de estudos de sustentabilidade que é publicado pela própria Caixa de Previdência, que no ano 2039 o rácio de contribuintes ativos vai ser de 2,6 por pensionista. Para se ter uma ideia, por exemplo, em 2009,o rácio era de 11,9. Em 2019 já era de 7,4. Nesse sentido, temos advogados da década de 1990 que estão a caminho de se reformar dentro dos próximos cinco ou 10 anos. E, portanto, se a nossa base de contribuintes não for suficientemente larga, acima de cinco ou seis por cada pensionista, começamos a ter problemas. Nós, neste momento, já estamos na base de cinco contribuintes ativos para apenas um pensionista, mas o que vem aí é pior.SoluçõesVictor Alves Coelho: “Vamos continuar nessa senda e vamos esperar, como já se verifica, que haja uma maior percentagem de beneficiários a efetuar voluntariamente os pagamentos das contribuições. Os pagamentos das contribuições, para ter uma ideia, no próprio mês em que são emitidas, eram pagas, ou era paga uma percentagem na casa dos 78%, pouco mais, não chegava aos 79%. Depois, durante o próprio ano, eles iam regularizando e estabilizava ali por volta dos 80%. Depois, ao fim de cinco anos, também iam pagando e ficava nos 90%. Digamos que há ali uma margem de 10% que não se conseguia recuperar. Hoje, no próprio ano, já temos uma percentagem de cobrança muito perto dos 84%, o que significa que temos a expectativa de que este número melhore e comece a aproximar-se, no próprio ano, dos 90%. Por outro lado, estamos a incentivar os beneficiários a poderem subir de escalão, a perspetivar a pensão a que vão ter acesso e a não ficar no 5.º escalão, porque o 5.º escalão, evidentemente, com o valor que tem, dará necessariamente lugar a uma pensão muito baixa no futuro, com todos os problemas que daí decorrem. E aquilo que nós estamos a perceber é que isto tem estado a ser bem recebido pelos beneficiários. Claro, depende das suas capacidades de poderem subir, evidentemente, mas eles estão a analisar essa sua situação e está a haver alguma recetividade nesse sentido. Em termos de medidas de fundo, diferentes daquelas que tínhamos, não podem ser muitas, porque nós tínhamos uma visão muito abrangente para a CPAS, preconizávamos uma série de medidas que tocavam em vários pontos e essas mantêm-se.Oliveira Gomes: “Uma das nossas estratégias e do nosso manifesto eleitoral é abrir a base contributiva a outros juristas, nomeadamente advogados, mas de língua portuguesa, nomeadamente o Brasil. Sabemos que existe cerca de um milhão de advogados no Brasil, mas também procuradores da República, juízes, nós inclusivamente no nosso regime de Caixa de Previdência também temos alguns juízes, pessoas que também... inclusive os jornalistas, que eram licenciados em Direito, receberam descontos que, não sendo agora advogados, continuam ainda a fazer descontos para a nossa Caixa de Previdência. Portanto, nós entendemos que devemos alargar a nossa base contributiva, recorrendo também a juristas, advogados de países de língua portuguesa, nomeadamente Angola, Moçambique, Brasil, que queiram aderir, obviamente, à nossa Caixa de Previdência, porque, comparando a nossa Caixa de Previdência com o regime da Segurança Social, nós temos rácios, ainda hoje, muito melhores do que aqueles que tem a Segurança Social atualmente. Acho que isso é uma coisa perfeitamente viável e, para nós, nunca será viável aumentar a idade da reforma, como outras direções já defenderam.amanda.lima@dn.pt.João Massano é eleito o novo bastonário da Ordem dos Advogados.João Massano: "a minha prioridade como bastonário vai ser unir os advogados"