Cidades. O futuro passa por “mais tecnologia, bem utilizada, ao serviço das pessoas”
"A inovação tem sido sempre utilizada para servir o poder, e nunca para servir as pessoas deste mundo”. A frase é de Massamba Thioye, responsável pelos projetos do Global Innovation Hub (Centro de Inovação Global) da ONU. Criado aquando da 26.ª Cimeira do Clima das Nações Unidas, em 2021, em Glasgow (Escócia), este órgão procura promover transformações inovadoras para garantir um futuro com menos emissões poluentes, garantindo também a resiliência climática das cidades.
Em Lisboa para o evento Building the Future (organizado pela Microsoft), onde foi orador, Massamba Thioye afirma que mais do que inovar é necessário, sobretudo, colocar a tecnologia e a inovação ao serviço das pessoas. “A inovação tem uma agenda predefinida. E é urgente perceber-se como pode servir a população mundial”, diz Massamba Thioye.
Além disso, defende o responsável, é necessário também “repensar a forma como interagimos e vivemos com o meio ambiente”. A questão é “desafiante”, diz, “mas esse deve ser o caminho”. “É necessário pensar nas pessoas, mas também na sustentabilidade e no meio ambiente. Então, alinhados com as metas do clima e com a biodiversidade, devemos utilizar os recursos naturais dentro dos limites do planeta. E isto é um desafio”. Porquê? “Atualmente, não conseguimos satisfazer as pessoas. E o problema é que as cadeias de valor que utilizamos não estão ainda no ponto de servir as pessoas: não se enquadram nas características que gostaríamos de ter, porque não estão, de todo, alinhadas com as necessidades do ambiente”, alerta. Ou seja: pensar no futuro das cidades e das interações é, ao mesmo tempo, repensar as formas e os veículos de desenvolvimento. Por exemplo, “o 5G é sinónimo de conectividade”. “Se fosse disponibilizado em todo o lado, para toda a gente, era uma ferramenta capaz de ajudar e mudar completamente a forma de desenvolvimento do Sul global, porque, convém não esquecer, esta região não pode seguir o caminho do Norte global”, diz Massamba Thioye. Este é, aliás, um dos objetivos da iniciativa Starlink, da empresa norte-americana SpaceX, que lança vários satélites de baixo custo e alto desempenho. A intenção é criar um novo sistema de comunicação em rede, fornecendo internet de alta potência, mesmo a regiões mais remotas da Terra. Isto, defende a empresa, permitirá, entre outros exemplos, levar serviços em rede a certas zonas, ajudando-as a desenvolverem-se mais rapidamente - algo que, sem este recurso, podia não ser possível.
Mas Massamba Thioye vai mais longe, dando até perspetivas de uma utilização diferente no que toca ao 5G: “Se houver em todo o lado, em vez de se construírem escolas em cada aldeia, talvez possamos ir mais longe, ao levar assistentes virtuais para certos locais, dando aos alunos a possibilidade de um ensino e-learning [à distância] de boa qualidade. O mesmo se aplica, por exemplo, à Saúde e a consultas à distância. É este o poder da tecnologia digital: pode ajudar a satisfazer necessidades, de forma mais limpa, poupando deslocações e outro tipo de custos.”
“Mais do que cidades inteligentes, precisamos de cidades sábias”
Esta conectividade acaba por ser, quase, o culminar do conceito de cidade inteligente. No fundo, cidades mundiais em que os dados e a tecnologia servem para melhorar serviços, gerir recursos de forma mais eficiente e criar melhores infraestruturas.
Segundo o Índice Mundial de Cidades Inteligentes e Sustentáveis elaborado pelo Centro de Globalização e Estratégia da IESE Business School, da Universidade de Navarra, em Espanha, Portugal tem duas cidades (Lisboa e Porto) que se encaixam neste conceito. Divulgado no passado dia 21, este ranking de 183 cidades (que mede fatores como a tecnologia, a mobilidade e transportes e o capital humano) posiciona a capital em 76.º lugar; a Invicta fica em 105.º. O primeiro lugar é ocupado por Londres, no Reino Unido.
Apesar dos contextos diferentes entre cada país, o responsável do Centro de Inovação Global considera que “mais do que cidades inteligentes, precisamos de cidades sábias”. Isto quer dizer: “Se se utilizar a tecnologia de uma forma pouco consciente e pouco sábia, criam-se problemas e não soluções. E sabemos que há vários problemas relacionados com a tecnologia digital. Se não se usar de forma correta, isso pode criar ainda mais confusão no contexto citadino. É por isso que é necessário retirar o melhor de cada função e tecnologia utilizada nas cidades inteligentes, que precisam ser, também, sábias para que problemas possam ser evitados. Deve haver mais tecnologia, bem utilizada, ao serviço das pessoas.”