16 anos depois, ainda se fazem buscas para encontrar Maddie

As buscas relacionadas com o desaparecimento de Maddie McCann voltaram às imediações da Praia da Luz. Desde a manhã de segunda-feira que vários elementos das polícias de Portugal, Inglaterra e Alemanha estão na Barragem do Arade a realizar buscas. Não se sabe ao certo o que procuram, mas é esperado que as buscas durem dois a três dias.
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O que está a acontecer?
Desde as oito da manhã de segunda-feira que a Polícia Judiciária (PJ), auxiliada pela Guarda Nacional Republicana (GNR), está a realizar buscas na barragem do Arade, no Algarve. Para já, pouco ou nada se sabe sobre o que terá motivado esta nova ronda de buscas, que envolvem, também, as autoridades inglesas e alemãs. A previsão, segundo disse fonte policial à Lusa, é que as buscas durem "dois a três dias". O local fica a cerca de 50 quilómetros da Praia da Luz, onde Maddie McCann desapareceu em 2007, e terá sido frequentado por aquele que é considerado, desde 2020, o principal suspeito do desaparecimento. Os trabalhos da polícia decorrem numa zona a cerca de um quilómetro do local onde está montada a base logística das operações que envolvem barcos e mergulhadores dos bombeiros, longe dos olhares dos jornalistas. O acesso ao local das buscas foi vedado, mas o aparato mediático é grande e há, até, meios de comunicação social estrangeiros.
No entanto, devido à chuva repentina que caiu na segunda-feira, na Barragem do Arade, as buscas tiveram de ser suspensas. A PJ não confirmou, exatamente, o que foi encontrado, dizendo apenas que não foi retirado nada de relevante da água. Foram também feitas escavações em dois locais distintos. É esperado que pelo menos a polícia alemã emita um comunicado de imprensa no final.

Como surgiu o local das buscas?
As buscas que se iniciaram na segunda-feira surgem na sequência de uma Decisão Europeia de Investigação (as antigas cartas rogatórias) dirigida pelas autoridades da Alemanha a Portugal. Em 2014, as autoridades britânicas já tinham investigado perto desta localização, mas não chegaram a qualquer tipo de conclusão. Em 2008, a barragem já tinha sido alvo de buscas, numa operação financiada por um advogado, que se baseou em teorias de uma vidente. Houve mesmo um saco com ossadas a ser encontrado. Mas, depois de analisadas, verificou-se que eram, apenas, esqueletos de gatos.

Quem é o principal suspeito?
Christian Brückner, 46 anos, é, desde 2020, tido como o principal suspeito neste caso. Tanto quanto se sabe, Brückner terá vivido no Algarve - e perto da zona do desaparecimento - entre 1995 e 2007. Segundo o jornal britânico The Guardian, o alemão terá vindo para Portugal com 18 anos, altura em que se viu envolvido num eventual caso de abuso sexual de uma criança. Voltou à Alemanha em 1999. Entretanto, em 2004 ou 2005 (a data não é clara), terá violado uma idosa americana de 72 anos, na Praia da Luz. No entanto, a investigação foi encerrada um ano depois por falta de provas. A violação seria, então, descoberta mais tarde, após um roubo de uma câmara de vídeo onde estaria gravado o ato. Mas, na altura do desaparecimento da Maddie (3 de maio de 2007), Brückner estaria na zona. Saiu do país pouco tempo depois. Em 2013, foi associado pela primeira vez ao caso. Na altura, a associação foi afastada. Só em 2020 foi considerado pela polícia alemã como o principal suspeito. Em abril do ano passado, a polícia portuguesa corroborou a versão. Em outubro, Brückner foi acusado de três crimes de violação e dois de abuso sexual de crianças em território nacional, cometidos entre 2000 e 2007. Além disso, o registo de propriedade do Jaguar que tinha enquanto vivia no Algarve (juntamente com uma autocaravana) terá sido alterado no dia seguinte ao desaparecimento de Maddie.

Qual o envolvimento do suspeito?
Brückner negou sempre o seu eventual envolvimento e disse, até, que, na noite do desaparecimento, estaria com uma namorada, com quem tinha tido relações, e que iria deixar, naquela noite, ao aeroporto de Faro. O procurador alemão responsável pela investigação diz não ter conhecimento do álibi. Por outro lado, de acordo com a Scotland Yard (polícia metropolitana inglesa), há registos telefónicos que o colocam perto do resort na noite do desaparecimento, além do historial de abusos e casos de violação no Algarve que lhe são imputados pelo Ministério Público alemão. Em 2016, a polícia alemã encontrou, numa autocaravana que estava num terreno do suspeito, peças de roupa de criança, e cerca de oito mil imagens pedófilas. A descoberta aconteceu porque as autoridades investigavam o desaparecimento de Inga Gehricke, conhecida como a Maddie alemã. Entre as roupas encontradas, estavam vários fatos de banho de menina, e as imagens estavam armazenadas em pens USB, colocadas dentro de um saco de plástico, que estava enterrado debaixo das ossadas de um cão que Brückner tivera.
Atualmente, cumpre pena de prisão em Kiel, no norte da Alemanha por dois crimes: a violação da mulher de 72 anos, e tráfico de droga.


Quem é Maddie McCann?
Nascida a 12 de maio de 2003, em Leicester, Inglaterra, Madeleine McCann (mais conhecida como Maddie) é a filha mais velha de um casal de médicos, Kate e Gerry McCann. Além de Maddie, há ainda mais dois filhos, os gémeos Sean e Amelie, nascidos em 2005. A 3 de maio de 2007, Maddie foi dada como desaparecida do aldeamento turístico em que estava de férias, na Praia da Luz, em Lagos. Na altura do desaparecimento, um dos traços mais identificativos da criança estava num dos olhos, que sofria de uma condição chamada coloboma, que fazia com que uma das pupilas tivesse uma fissura, dando-lhe um formato semelhante a uma fechadura, na parte inferior do olho.

Qual o filme dos acontecimentos?
Na noite de 3 de maio de 2007, Gerry e Kate (os pais) adormeceram Maddie e os irmãos, e foram jantar com amigos num bar a cerca de 100 metros do local. Segundo os relatos do caso, Gerry verificou os filhos às 21.10 - e estava tudo bem -, seguiu-se-lhe um amigo, às 21.30, e, às 22.00, foi a vez de Kate McCann se dirigir ao quarto. Encontra a cama vazia, e uns estores abertos. Um amigo avisa, então, a receção do Ocean Club, que, por sua vez, alertou a GNR. A Polícia Judiciária é informada já perto da meia noite. Entretanto, funcionários e hóspedes do aldeamento envolvem-se nas buscas até de madrugada. A PJ fala pelas 12.00 do dia 4 de maio, revelando existir uma suspeita de rapto e a figura de um eventual suspeito. A 6 de maio, a PJ diz publicamente que identificou um suspeito e que, naquela altura, Maddie devia estar viva e ainda na área. Mas, a 8 de maio, uma nova versão - da própria PJ - admitiu não ter certezas quanto ao estado da menina. A 13 de maio, nova contradição, com a Judiciária a assumir que não tinha, afinal, qualquer suspeito em vista.

Os pais foram interrogados?
Em setembro de 2007, a PJ interroga Gerry e Kate McCann, saindo ambos com o estatuto de arguido e sujeitos a termo de identidade e residência. A suspeita era a de homicídio acidental, causado por negligência ou excesso de calmantes dados à criança (terão sido usados para a colocar a dormir na ausência dos pais). A corroborar os factos, houve ainda vários indícios de fluidos de Maddie a serem encontrados num carro alugado pelos McCann mais de 20 dias depois do desaparecimento.

Houve outros suspeitos?
Sim. O primeiro suspeito do crime apareceu logo nos primeiros dias de investigação. Robert Murat, cidadão inglês, à altura com 35 anos, vivia a cerca de 100 metros do apartamento onde Maddie estava de férias com os pais. A casa em questão - chamada "Casa Liliana" - era propriedade da mãe e foi alvo de buscas da PJ. Foi, também, interrogado durante várias horas. Apesar de, na altura, ter sido constituído arguido, amigos e familiares duvidavam do seu envolvimento no caso. Ainda assim, é afastado da sua filha (da mesma idade de Maddie). O processo é arquivado em 2008. Quando o processo volta a ser reaberto, o inglês é chamado para interrogatório pela PJ, mas enquanto testemunha.
Em maio de 2009, dois anos após o desaparecimento de Maddie, surge um novo nome. Segundo a imprensa britânica, tratava-se de Raymond Hewlett, de 64 anos, um pedófilo britânico, que, à data dos factos, estaria a viver em Tavira, a uma hora de distância da Praia da Luz. De acordo com os media britânicos, o homem - ex-soldado - tinha um passado conhecido de crimes sexuais contra menores, tendo sido condenado por abusos a uma rapariga de 12 anos. Um ano depois, numa entrevista ao jornal Sunday Mirror não apresenta um álibi, mas nega ter morto Maddie McCann. As suspeitas acabam por não ganhar contornos judiciais e Hewlett morre em 2010, com um cancro na garganta. Em 2013, já depois de o processo ser reaberto, a polícia britânica divulga retratos robô de um homem que considera prioritário identificar no âmbito da investigação. Ainda assim, a divulgação não levou a quais avanços. Meses mais tarde, em maio de 2014, as autoridades identificam um ex-funcionário do Ocean Club, que falecera em 2010, chamado Euclides Monteiro. Os investigadores acreditam que o homem seria o elo de ligação entre cinco casos de abuso sexual a crianças estrangeiras no Algarve, em 2004, havendo também suspeitas de que tivesse envolvimento no caso de Maddie McCann. Mais uma vez, as suspeitas acabaram por cair por terra (os próprios pais de Maddie acabam por dizer r que os relatos eram "especulação pura"). À altura dos factos, Euclides já não trabalhava no Ocean Club.

A investigação foi encerrada?
Em 2022, as autoridades do Reino Unido anunciaram que a investigação ia terminar no final do ano, depois de terminado o financiamento. As autoridades britânicas acreditam na tese de rapto e, até junho de 2021, o custo aproximado era de 14 milhões de euros. Em abril, o Ministério Público de Faro constitui Brückner como arguido. Em maio, o procurador alemão Hans Christian Wolters referiu que a investigação contra o suspeito estava "em curso" e que tinham sido encontrados factos que o apontavam como principal suspeito.

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