TC só vai recuperar protagonismo se a geringonça não funcionar
Sem medidas de austeridade que choquem com a Constituição, os juízes conselheiros vão perder protagonismo na política. Questões como a eutanásia também podem pôr o Palácio Ratton no centro mediático
O Tribunal Constitucional (TC) é sempre de contrapoder, mas para recuperar o protagonismo que teve nos últimos anos só mesmo se a geringonça deixar de funcionar ou em assuntos mais sensíveis na sociedade como a temática da eutanásia. A opinião é de constitucionalistas e politólogos que acreditam que - mesmo com as cinco novas entradas - mantém-se o equilíbrio no Palácio Ratton.
Nas contas finais há seis juízes conselheiros da área da direita, seis da esquerda e um neutro (um juiz de carreira não indicado por via da Assembleia da República.

Mas votam os juízes ou não de acordo com os partidos que os elegem? O politólogo Pedro Magalhães - que tem estudos que refletem sobre a partidarização do TC - explica ao DN que "os juízes não são escolhidos por acaso, pois de alguma maneira escolhem pessoas com uma mundividência e convicção sobre o direito que correspondem às suas preferências".
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Por outro lado, o professor do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa acredita que o TC garante um "equilíbrio entre esquerda e direita" que "torna o tribunal imprevisível".
Desde que o PS está no governo o Tribunal não tem tido tanto protagonismo, uma vez que a política tem sido de repor rendimentos e não cortar. Na anterior legislatura, de Passos Coelho, em período de austeridade e de cortes, o Tribunal chegou a ser encarado pelos comentadores políticos como uma espécie de oposição.
Pedro Magalhães explica que entre 2011 e 2015 conjugaram-se dois pontos: "austeridade do governo que provocou divisões e uma oposição disponível para fazer chegar ao tribunal pedidos de fiscalização que contestassem essas medidas".
Agora o TC não tem protagonismo porque PCP e Bloco de Esquerda só dão a mão ao PS se não houver cortes (que podiam ser potencialmente inconstitucionais). Ora se por pressão (de Bruxelas ou das contas) for exigida mais austeridade, o tribunal até pode ganhar de novo visibilidade, mas antes de chegar a esse ponto, já o governo não existirá, uma vez que o "cimento" da geringonça, depende disso.
Já o constitucionalista Jorge Reis Novais explica que o TC pode perder "protagonismo mediático, mas em termos de função é exatamente a mesma coisa". Para o especialista em Direito Constitucional o tribunal deve "defender os direitos fundamentais das pessoas independentemente da circunstância financeira e foi o que fez". E acrescenta que "não perceber isso foi o erro das pessoas que quase pediram, como Durão Barroso ou Passos, que achavam que o TC podia autossuspender a atividade só por estarmos com constrangimentos económicos".
Quanto à nomeação dos juízes pelos partidos, Reis Novais considera que "não há uma solução melhor", pois esta assegura "a legitimidade democrática de um órgão para contrariar a decisão de outro que a tem também".
Sistema perfeito?
No entender do constitucionalista Paulo Otero a atual forma de nomeação de juízes-conselheiros tem um "pecado original", uma vez que "são os partidos a escolher o presidente do Tribunal Constitucional e não os juízes, que o fazem com indicação prévia partidária".
Paulo Otero defende também que, como acontece em Itália, "o Presidente da República devia escolher alguns dos membros do Tribunal Constitucional". O professor da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa lembra que "só não foi assim decidido em 1982, quando foi criado o TC, para não aumentar os poderes a Ramalho Eanes".
A nova composição
Os especialistas ouvidos pelo DN concordam que o Tribunal Constitucional é sempre potencialmente um órgão de "contrapoder", independentemente da composição. Isto porque contraria a maioria, em nome dos direitos fundamentais.
Quanto ao facto de haver uma juíza-conselheira que usa o Facebook e foi indicada pelo Bloco de Esquerda ou um juíz-conselheiro que critica o atual texto constitucional foi reduzido pelos especialistas como a prova da "pluralidade" do tribunal. "É sempre melhor do que a unicidade, mas também torna as decisões mais difíceis.
Mas há críticas quanto à tipologia dos escolhidos. Pedro Magalhães lembra que "a tendência em Portugal de haver juízes do TC com pouca experiência profissional não é positiva", já que estando a meio da carreira não estão tão "blindados".
Também Paulo Otero acredita que o facto de serem nomeados por partidos influencia sempre as escolhas. O constitucionalista defende que "mesmo que nomeados pela Assembleia da República, o Parlamento podia escolher juízes de carreira, o que evitaria paraquedistas".
Entre os novos escolhidos há desde um constituinte (como é o caso de Manuel Costa Andrade) até Gonçalo Almeida Ribeiro, que se doutorou em Harvard em 2012. Este professor é também colunista do Observador, onde defendeu que a constituição é "longa, programática e defensiva" e que revê-la à luz da lei fundamental de "1976, à qual devemos tanto da nossa liberdade, tornou-se um obstáculo à autodeterminação democrática dos portugueses". E acrescentou que "a superação desse bloqueio constitucional é a derradeira prova da nossa maioridade política."
Há também um amigo de António Costa: o advogado Cláudio Monteiro. E, pela primeira vez, o Bloco de Esquerda indicou um juiz para o TC, Clara Sottomayor. Apresentada como uma juíza de causas, pode ser uma aliada se alguém suscitar a inconstitucionalidade (em caso de ser aprovado) de batalhas que aí vêm como a eutanásia".