Ricardo Robles: "Esta é uma cidade cada vez mais para ricos e menos para lisboetas"

O vereador do Bloco de Esquerda para as áreas da Educação e dos Direitos Socais, e que tem sido um dos mais ativos críticos do regime de arrendamento urbano, defende uma intervenção articulada das autarquias e do Estado para regular o mercado. Em Lisboa podem ser proibidos novos alojamentos locais em certas freguesias.
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Em Lisboa já é mais económico comprar casa do que alugar. Este indicador, tendo em conta que o mercado imobiliário está em alta, diz-nos que viver na capital está a tornar-se uma coisa para ricos?

O problema da habitação tem-se vindo a agravar em Lisboa. Os preços continuam a aumentar brutalmente e isto está a criar uma crise social. Encontrar casa, seja para arrendar seja para compra, apesar de o crédito para a habitação estar mais acessível, continua a ser proibitivo. A tendência é ir para fora da cidade procurar uma casa. E isto abre problemas gravíssimos, do ponto de vista ambiental, da economia da cidade. Voltamos a ter movimentos pendulares. Falei há pouco tempo com uma médica que me disse que antes os médicos queriam todos vir para Lisboa e agora já não querem, porque não conseguem arrendar casa. Isto cria um efeito de bola de neve insustentável. O município e o próprio Estado central têm de fazer uma intervenção muito grande.

O alargamento, para dez anos, dos prazos de transição dos antigos contratos para o novo regime protege os atuais inquilinos?

Temos estado sempre em total oposição ao regime de arrendamento urbano. A lei que Assunção Cristas criou [em 2012, quando era ministra] gerou uma crise gravíssima do ponto de vista social. Estas pequeníssimas alterações permitiram prolongar por alguns anos a situação dos arrendatários, mas continuamos a ter um problema grave.

O valor das rendas está nos 9,62 euros/metro quadrado, o dobro da média nacional, mas em 2017 celebraram-se mais de 28 mil contratos. A questão é quem fica de fora?

Totalmente. Esta é uma cidade cada vez mais para ricos e menos para lisboetas e para quem quer viver na cidade, para trabalhar, morar, estudar.

Com um mercado fortemente inclinado para o aluguer de curta duração, como se renova a população residente da cidade?

Houve aqui uma tempestade perfeita, um cocktail explosivo. Tivemos a lei de Assunção Cristas, a liberalização total do alojamento local também no governo PSD-CDS e, por outro lado, cada vez maior interesse turístico na cidade, que é um aspeto positivo mas cria estes impactos negativos fortíssimos. Este cocktail explosivo está a criar um problema grave de habitação e para a própria cidade, para a sua sustentabilidade. A Câmara de Lisboa tem de ter um papel forte, por exemplo, através das quotas para o alojamento local. No centro histórico, há zonas onde os preços se tornaram proibitivos.

E já existe uma ideia sobre que percentagens destinadas a alojamento local seriam razoáveis?

A câmara está a desenvolver neste momento esse estudo sobre as cargas máximas em algumas zonas. Na minha opinião, já atingimos e ultrapassámos esses limites em algumas freguesias, como Santa Maria Maior, São Vicente , Misericórdia e Santo António. Há outras zonas onde a margem para crescimento deste tipo de oferta de alojamento faz sentido. Aí a sobrecarga não existe. A capacidade de as autarquias locais definirem essas regras é importantíssima.

Em certas zonas devem ser proibidos novos alojamentos locais?

Sim. É esse o sentido para o qual temos de caminhar. Barcelona, que é um bom exemplo das consequências das más práticas, onde não queremos chegar, onde a sobrecarga do turismo criou problemas graves do ponto de vista do direito à habitação, criou coroas. Na primeira coroa, a coroa vermelha, existe a proibição da abertura de novos alojamentos locais. Noutras zonas da cidade, a amarela, a verde, já é possível.

Quando é que serão anunciadas estas zonas restritas para Lisboa?

As questões dos mapas de carga máxima para o alojamento local e turismo estão previstas serem implementadas depois de a legislação permitir que o município tenha capacidade para o fazer. Aguardamos que o Parlamento aprove esta legislação e depois avançaremos.

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