Uma médica com uma filha de 15 meses que amamenta pede um horário flexível como prevê o Código de Trabalho para pais de crianças menores de 12 anos. A entidade empregadora recusa e é obrigada a pedir um parecer à Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego (CITE). A comissão dá razão à mãe, em nome da conciliação da vida profissional com a familiar. Casos como este constituem 85% dos pareceres da estrutura e, diz a presidente da CITE, Joana Rabaça Gíria, não há meio de as empresas "interiorizarem que a conciliação é fundamental para a igualdade de oportunidades", além de "gerar produtividade"..No ano passado, a CITE emitiu 747 pareceres e o horário flexível dominou as situações apresentadas, o mesmo acontecendo já neste ano em que analisaram 321 casos. Mas os dados definitivos só estão trabalhados até 2016, ano em que emitiram 688 pareceres, dos quais 655 (95%) corresponderam a solicitação obrigatória por entidade empregadora. E destes 84,5% são referentes à recusa em conceder regime de horário flexível. A comissão não faz o acompanhamento do cumprimento dos seus pareceres, que são vinculativos. A última palavra cabe aos tribunais..O caso da médica é exemplar no que diz respeito à recusa em atribuir um horário flexível a quem tem filhos menores de 12 anos. Trabalha no setor da saúde, um dos que têm atividade laboral permanente e com muitas recusas em conceder esse direito aos pais, seja homem ou mulher. Mas, sublinha a presidente da CITE, a prática é ser o sexo feminino a pedir a mudança de horários. No seu entender, sinal de uma mentalidade que é preciso mudar, já que a legislação portuguesa salvaguarda os direitos da conciliação e da igualdade de oportunidades.."A informação existe, o que falta é uma interiorização; em primeiro lugar dos conceitos, quer da conciliação, quer dos horários, quer dos tempos de trabalho necessários para que essa conciliação seja possível; em segundo, de atitude. Ainda subsistem casos em que se for o homem a pedir flexibilidade de horário ou para faltar ao trabalho para ir com a criança ao médico ouve: "A tua mulher não trata disso?" É um exemplo académico mas existe. Falta uma interiorização a todos os níveis, quer dos próprios trabalhadores e trabalhadoras quer das entidades empregadoras, de que a conciliação entre a vida profissional e a vida familiar é fundamental", defende Joana Rabaça Gíria..No caso da paternidade, horário flexível significa adequar os tempos laborais às exigências familiares, desde que contenha um ou dois períodos de presença obrigatória, com duração igual a metade do período normal de trabalho diário. Na prática, o trabalhador poderá fazer até seis horas consecutivas de trabalho e até dez horas de trabalho em cada dia e desde que cumpra o horário semanal..A médica em causa tem uma filha menor. O emprego do marido obriga-o a deslocar-se frequentemente ao estrangeiro. Têm o apoio dos avós maternos e avó paterna, ainda que esta resida longe. Para acompanhar a filha, a assistente pediu um horário de segunda a sexta-feira entre as 08.00 e as 18.00 e um único fim de semana mensal..A entidade empregadora justificou a "recusa de forma absoluta", "na medida em que exigências imperiosas de funcionamento do serviço assim o impõem", sublinhando: "O seu funcionamento é ininterrupto, incluindo fins de semana e feriados, o que necessariamente implica a aplicação do regime de trabalho por turnos" e que a alteração impossibilitaria "o atendimento 24 horas, o que acarreta grave risco para os utentes"..Explicações não justificáveis para a CITE: "O empregador deve proporcionar à trabalhadora condições de trabalho que favoreçam a conciliação da atividade profissional com a vida familiar e pessoal, nos termos do Código do Trabalho e da Constituição da República Portuguesa."