Em Portugal pode haver mudança de bandeira como na Nova Zelândia?

Por cá, só poderia ser mudada com uma revisão constitucional
Publicado a
Atualizado a

Os neozelandeses já escolheram a bandeira que poderá vir a substituir a atual, se assim ficar decidido no referendo do próximo ano. Querem tornar o símbolo nacional menos parecido com o australiano e eliminar a representação da bandeira britânica. Não é um processo comum e, em Portugal, é mesmo quase impossível de acontecer. A bandeira portuguesa está consagrada na Constituição, pelo que só poderia ser alterada através de uma revisão constitucional. Haverá motivos para isso?

"Jamais. Temos de aceitar a história. Há quem tenha morrido pela nossa bandeira. É sagrada. Respeito-a e defendo-a. É constitucional", diz José Adelino Maltez. Para o investigador de ciência política, não faz sentido discutir símbolos nacionais herdados e assumidos na Constituição, ainda que possa considerar, por exemplo, que a bandeira proposta por Guerra Junqueiro em 1910 (que mantinha o azul e branco) seria, eventualmente, mais atual. "São marcas de identidade. Esta bandeira flutuou em nove sítios onde hoje existem nove bandeiras."

Na leitura do também professor universitário, "qualquer alteração à bandeira seria uma ofensa." No entanto, na Nova Zelândia existem motivos que levaram à procura de um novo símbolo nacional. Depois de lançado o desafio à população, surgiram mais de dez mil propostas para a nova bandeira, das quais foram selecionadas 40 e, posteriormente, quatro. Já há uma preferida, desenhada por Kyle Lockwood, que deverá ir a votação contra a atual no próximo ano.

Por cá, "é quase impossível" surgir uma mudança na Bandeira Nacional, diz o constitucionalista Paulo Otero. "Está consagrado que a bandeira é a adotada pela revolução de 5 de outubro de 1910. Para ser mudada, teria de existir uma revisão da Constituição", explica. Ao contrário do que está previsto acontecer na Nova Zelândia, em Portugal não era passível de ser objeto de referendo.

Segundo Paulo Otero, "há razões jurídicas, que se prendem com a revisão constitucional, e políticas - é a bandeira do Partido Republicano, antecedente do Partido Socialista - para não existir uma mudança em Portugal." Na Nova Zelândia representa "uma forma de ligação à antiga potência administrativa, mas em Portugal isso não acontece. Nem no 25 de abril o tema veio à discussão."

Do ponto de vista simbólico, o designer Carlos Rosa considera que a bandeira não precisa de ser redesenhada. "A carga simbólica do país está lá. Não aconteceu nada de relevante nos últimos anos que justifique uma mudança", afirma o também professor da Universidade Europeia. Já do ponto de vista visual, podem ser levantadas algumas questões: "O vermelho e o verde são cores complementares, parecidas do ponto de vista da luminosidade." Enquanto comunicador, Carlos Rosa considera que a combinação cromática "podia ser revista", não para alterar a cor mas para melhorar a relação entre as duas, através da intensidade.

Nos rankings das bandeiras mais bonitas do mundo, o designer Leonel Brito diz que a de Portugal aparece, geralmente, a meio. "Continua com valores gráficos de outra época: a esfera armilar, o escudo e os castelos são símbolos que já não nos representam bem", afirma. Não se revê na bandeira atual. "Acho que alguns exemplos gráficos do 25 de Abril nos representariam melhor." Mas é "uma discussão infrutífera em Portugal."

Para a designer Joana Monteiro, a Bandeira Nacional "é um símbolo que representa Portugal e não há necessidade de o mudar." "Não é ao mudar a bandeira que se vai melhorar a imagem de Portugal", justifica. A modernização não passa por mudar a bandeira, mas "pela educação para dar valor a símbolos que tantas vezes desprezamos".

Euro aproximou portugueses

Em entrevista ao DN, o historiador Nuno Severiano Teixeira, autor de um livro sobre os símbolos nacionais, disse, em julho, que o Euro 2004 alterou a relação dos portugueses com a bandeira. "Na tradição portuguesa, os símbolos normalmente vêm de cima, são impostos pelo Estado, são incutidos pelas elites." Contudo, com a ideia de Scolari lançada no Euro a relação dos portugueses com a bandeira torna-se mais próxima. "O símbolo é apropriado por cada cidadão. E as pessoas começam a vestir as T-shirts, vão para o futebol com a bandeira."

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt