Cavaco vai ter de aprovar adoção gay e mudança na lei do aborto que vetou

Os diplomas devolvidos ao Parlamento pelo ainda Presidente da República serão reconfirmados pela esquerda sem alterações

Cavaco Silva vai ser obrigado a aprovar os diplomas sobre a adoção por casais do mesmo sexo e mudanças na lei do aborto. Os diplomas vetados pelo ainda Presidente da República serão reconfirmados nas próximas duas semanas no Parlamento sem alterações, com os votos da esquerda, o que significa que Cavaco terá de os promulgar num prazo de oito dias, bem antes da entrada em funções de Marcelo Rebelo de Sousa, que toma posse como presidente a 9 de março.

A devolução dos dois diplomas à Assembleia da República foi conhecida ontem, mas os grupos parlamentares que os aprovaram já avisaram de que os vão reconfirmar tal como estão. Pedro Delgado Alves, deputado do PS, disse ao DN que há um prazo mínimo de 15 dias para discussão e votação dos diplomas, contados a partir da data de devolução (oficialmente, 23 de janeiro). Essa discussão e votação pode ser agendada já na conferência de líderes parlamentar de amanhã, mas a sua data de ocorrência remete para a segunda semana de fevereiro, segundo o mesmo deputado socialista. Seja como for: "Recairá sempre no mandato de Cavaco Silva."

O constitucionalista Paulo Otero confirma que depois de reconfirmados os diplomas, "Cavaco Silva terá oito dias para os promulgar. Se não o fizer será uma omissão, estará a violar a Constituição por não cumprir o prazo, mas não há uma sanção se não o fizer". Acredita, porém, que essa aprovação possa ocorrer nas próximas duas semanas. Quanto às opções do PR, estranha o veto político sobretudo no caso da adoção por homossexuais. "É incoerente não ter pedido a fiscalização preventiva do casamento gay e agora vetar a adoção. É permitir o maior e não o que é menor."

Mas mesmo se fosse necessária uma intervenção do presidente eleito, Marcelo Rebelo de Sousa, a legislação seria promulgada. Isto tendo em conta as suas declarações num debate televisivo que ocorreu no dia 4 deste mês, onde quando pressionado por Marisa Matias, Marcelo Rebelo de Sousa garantiu que, se fosse Presidente da República, promulgaria as leis. "Não vejo razão para não promulgar", reconheceu Marcelo.

Críticas e ironia à esquerda

José Soeiro, do Bloco de Esquerda, confirma que os diplomas serão votados a curto prazo. "Falta saber se a discussão será quarta ou quinta-feira." Depois disso, o PR terá de os promulgar, uma vez que não os pode devolver de novo à Assembleia da República.

"Vamos reconfirmar a legislação, porque não há qualquer alteração a fazer e o presidente é obrigado a promulgar", adiantou Isabel Moreira, do Partido Socialista. Se de alguma forma tentasse deixar a decisão para o seu sucessor -mesmo tendo afirmado já que não tem razões para rejeitar os diplomas - "isso significaria o desapossamento das suas funções. Só iria adiar os direitos das pessoas em causa".

Também o Bloco de Esquerda segue a mesma linha. "Serão confirmadas as intenções de caminhar no sentido da igualdade. Não haverá qualquer mudança porque o veto foi apenas político e ideológico." Rita Rato, do Partido Comunista, fala em "disponibilidade total" para reconfirmar e critica "um veto que não é nada argumentativo em termos de técnica jurídica. O PR não pode condicionar a vontade do Parlamento".

Isabel Moreira ironiza mesmo, ao dizer que "este foi o Presidente que, mesmo contra a sua vontade, promulgou os mais importantes passos em matéria de direitos LGBT (Lésbicas, Gay, Bissexual e Transgénero). Só por isso devia ganhar o prémio arco-íris", disse ao DN. Em relação aos argumentos, Isabel Moreira criticou que no caso do aborto haja "um período de reflexão da mulher com acompanhamento de um médico que pode ser objetor de consciência ou a obrigatoriedade de ir a uma consulta de planeamento familiar. Ninguém pode ser obrigado a ter uma consulta, nem na morte. Estas são questões que até o pior aluno do primeiro ano de direito sabe que são inconstitucionais". Rita Rato diz o mesmo. "O direito à informação já existia. Mas a ida a uma consulta era opcional."

No caso da adoção por casais do mesmo sexo, José Soeiro diz que Cavaco usa "argumentos hipócritas", como a falta de estudos ou o superior interesse da criança. "Isso só revela ignorância. Há inúmeros estudos a comprovar que a orientação sexual em nada influencia o desenvolvimento da criança."

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