Tutti Frutti. Luís Newton vai pedir suspensão de mandato de deputado. Vereador da Câmara de Lisboa já o fez
PAULO SPRANGER / Global Imagens

Tutti Frutti. Luís Newton vai pedir suspensão de mandato de deputado. Vereador da Câmara de Lisboa já o fez

Ângelo Pereira, vereador na Câmara de Lisboa, também já pediu a suspensão de funções, o que foi "aceite de imediato", anunciou o presidente da autarquia. Entre os 60 arguidos do processo Tutti Frutti estão dois deputados do PSD, o presidente da Junta de Freguesia da Estrela, Luís Newton, e Carlos Eduardo Reis.
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O deputado do PSD Luís Newton anunciou esta terça-feira que vai pedir a suspensão do mandato como parlamentar, apesar de dizer ainda desconhecer a acusação do processo Tutti Frutti.

"Fui eleito para a Assembleia da República com muita honra pelo partido onde milito desde sempre, o PSD. Sei que o mandato que me foi conferido é meu a partir do momento em que estou deputado, mas a minha lealdade, hoje e sempre, é para com o meu partido e para com o Governo em funções", refere, em comunicado.

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O deputado considera que tal deve orientar o seu sentido de responsabilidade política: "Nem a minha presença na Assembleia da República pode desviar a atenção do excelente trabalho governativo que tem vindo a ser desenvolvido pelo PSD e pelo primeiro-ministro em prol de todos os portugueses, nem a minha ausência pode significar uma admissão de culpa", diz.

"Assim, não preciso de ponderar muito. Irei pedir a suspensão do meu mandato como deputado na Assembleia da República", anuncia.

Ângelo Pereira considerou "absurda" a acusação que lhe é imputada

Também o vereador na Câmara Municipal de Lisboa, Ângelo Pereira (PSD), já pediu a suspensão de funções, no seguimento da divulgação da acusação Tutti Frutti, o que foi "aceite de imediato", anunciou o presidente da autarquia, Carlos Moedas.

Ângelo Pereira é responsável, entre outros, pelos pelouros do Desporto, Higiene Urbana e Proteção Civil.

Num comunicado, o vereador indica que pediu a suspensão do mandato "para requerer a abertura da instrução", por estar convicto da "total ausência de responsabilidade penal a este respeito".

Ângelo Pereira considerou "absurda" a acusação que lhe é imputada no processo, relativa a uma viagem à China enquanto foi vereador em Oeiras.

"A única acusação que me é imputada é uma alegada prática do crime de recebimento indevido de vantagem do montante de 598,02 euros referente a uma viagem de um evento realizado na China, pela empresa parceira organizadora do evento e em que participei na qualidade de vereador da Câmara Municipal de Oeiras", afirmou o social-democrata num comunicado, sublinhando não ter sido acusado dos factos constantes do processo relativos ao concelho de Lisboa.

Segundo o vereador -- reeleito presidente da distrital de Lisboa do PSD em abril de 2024, para um mandato de dois anos -, a empresa pagou a deslocação à China a nove pessoas e, por estar em representação da Câmara de Oeiras (distrito de Lisboa), "no limite, seria este município a suportar tal viagem e nunca" o próprio.

Em causa, acrescentou, estão "factos ocorridos há mais de 10 anos".

"Esta acusação, a única que me é apontada, é injusta, imoral e absurda porque a deslocação foi feita ao município de Oeiras, não me competindo, naturalmente, suportar as despesas para cumprir as minhas funções", insistiu.

Ângelo Pereira é vereador do Desporto, da Higiene Urbana, da Segurança, da Estrutura Verde e da Proteção Civil, entre outros pelouros, no executivo liderado pelo social-democrata Carlos Moedas, que anunciou hoje ao final da tarde ter recebido o pedido de suspensão de mandato, "aceite de imediato".

Na nota distribuída aos jornalistas que se encontravam nos Paços do Concelho, aguardando as declarações de Moedas, Ângelo Pereira referiu ter pedido a suspensão de funções "para requerer a abertura de instrução", por estar "convicto da total ausência de responsabilidade penal a este respeito".

"Mantenho a minha posição em relação àquilo que sempre disse nestes casos: quando um vereador é acusado deve suspender as suas funções. Mas aqui o pedido veio do vereador e da coragem do verador para poder defender-se", afirmou Carlos Moedas.

O presidente da Câmara de Lisboa afirmou ainda que o vereador "não é acusado de corrupção". "O senhor vereador não está acusado no chamado [processo] Tutti Frutti. Está acusado em relação a uma viagem que fez em 2015 e que deveria ter sido paga, na altura, pelo município. É essa a informação que eu tenho", disse.

Sobre o pedido de suspensão de funções do vereador, o presidente da autarquia considerou ainda importante "dar o exemplo" nestas matérias e fez um apelo: "Peço celeridade à justiça porque pode causar grandes injustiças se não houver celeridade nestes casos".

"Espero que outros partidos também sigam o mesmo exemplo que estou a dar", afirmou o autarca, sem deixar de criticar a demora da justiça neste caso. Falou num "processo que está há mais de 10 anos [investigação começou em 2016, há nove anos]" e "que tem posto a vida destas pessoas de uma maneira injusta". "Penso que é grave quando vemos a lentidão da justiça", afirmou.

O Ministério Público deduziu acusação contra 60 arguidos no âmbito do processo 'Tutti Frutti' por crimes de corrupção, prevaricação, branqueamento e tráfico de influência.

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De acordo com a acusação, a que a Lusa teve acesso, entre os 60 arguidos estão dois deputados do PSD, o presidente da Junta de Freguesia da Estrela, Luís Newton, e Carlos Eduardo Reis.

MP acusa Guilherme Aguiar de mercadejar o cargo de vereador em Gaia

O Ministério Público (MP) acusou José Guilherme Aguiar de "mercadejar" o cargo de vereador na Câmara de Vila Nova de Gaia, em prol dos negócios do empresário e deputado do PSD Carlos Eduardo Reis, no processo "Tutti frutti".

A acusação do MP, a que a Lusa teve acesso, refere que o vereador com o pelouro do Desporto, eleito em 2013, "tomou, desencadeou e espoletou decisões favoráveis aos interesses" do também arguido Carlos Eduardo Reis em contratos-programa para empreitadas de quase um milhão de euros em complexos desportivos de três clubes do concelho, tramitados inicialmente pela extinta empresa municipal GAIANIMA.

Como contrapartida, diz o MP, Carlos Eduardo Reis "aceitou praticar todos os atos necessários de apoio político e em sede de campanha eleitoral" para as autárquicas de 2013, "tendo, inclusivamente, realizado o pagamento de estudo/sondagem a pedido e em benefício" de Guilherme Aguiar, antigo militante do PSD, que se desvinculou do partido em 2013.

"José Guilherme Aguiar bem sabia que violava os deveres de prosseguir o interesse público, de legalidade, de isenção, de imparcialidade, de lealdade e de respeitar os princípios da transparência e da concorrência e as regras estruturantes da contratação e da gestão financeira públicas, o que aceitou e fez a troco do apoio patrimonial e não patrimonial recebido de Carlos Eduardo Reis", diz a acusação.

Contactado pela Lusa, o arguido disse não ter sido notificado da acusação, desconhecendo os factos que lhes são imputados.

O autarca, que está acusado de um crime de corrupção passiva, considera, contudo, a acusação "no mínimo, surpreendente" e baseada em "ilações" do MP, acrescentando que "não terá qualquer" efeito na sua vida política.

A Lusa contactou o município de Gaia, mas a autarquia não quis comentar a acusação.

O MP conta que, a partir de meados 2012, Carlos Eduardo Reis "iniciou a atividade de empresário e delineou uma estratégia que passava pela construção/requalificação de complexos desportivos, com a colocação de relvado sintético" em campos de três clubes de Gaia: Canelas 2010, Oliveira do Douro e Pedroso.

Ainda em fase anterior à assinatura dos contratos-programa, foi o então presidente da GAIANIMA Ricardo Almeida, também arguido, "quem decidiu, em concertação de esforços e mediante plano delineado com Carlos Eduardo Reis, que seria a sociedade comercial da qual este era sócio gerente, a AMBIGOLD, que iria ser futuramente contratada pelos clubes para a realização dos trabalhos".

Quanto ao presidente da GAIANIMA, entre fevereiro de 2011 e fevereiro de 2013, o MP diz que "tudo fez" para que a empresa municipal e a autarquia ficassem "comprometidos com o estabelecido nos contratos-programa, de forma a acautelar a posição contratual da AMBIGOLD", traduzindo-se na atribuição "de um benefício ilegítimo" à sociedade.

"Na prática, logrou Ricardo Almeida concretizar a contratação da AMBIGOLD pelos clubes, assim beneficiando Carlos Eduardo Reis enquanto sócio gerente daquela, para a realização de trabalhos de empreitada, que iriam ser pagos mediante a entrega de fundos camarários", frisa a acusação.

Segundo o MP, em agosto de 2012, Carlos Eduardo Reis manteve Guilherme Aguiar, à data vereador do Desporto da câmara de Matosinhos, "a par dos contactos que encetou com Ricardo Almeida e aconselhando-se".

Como em 13 de fevereiro de 2013 foi extinta a GAIANIMA, não foi entregue "qualquer quantia" aos clubes.

Em setembro de 2013, Guilherme Aguiar é eleito vereador e o MP sustenta que acedeu a "mercadejar o cargo".

"O que José Guilherme Aguiar fez, desbloqueando pagamentos e acompanhando todos os passos que eram tomados pelas entidades públicas em causa e, ainda, encetando contactos com os clubes desportivos contratados pela AMBIGOLD, nas vestes de vereador autárquico do Desporto, de forma a garantir que aqueles continuavam a manter a relação contratual com tal sociedade, em violação dos deveres que sobre o mesmo recaíam", frisa o MP.

Presidentes de junta, deputados e vereadores entre os 60 acusados

Quatro atuais presidentes de Junta de Freguesia em Lisboa, um dos quais deputado, um outro parlamentar, dois vereadores na capital e um em Vila Nova de Gaia estão entre os 60 acusados no caso Tutti-Frutti.

No total, os 60 arguidos, maioritariamente ligados ao PSD e ao PS, respondem por 463 crimes de corrupção ativa e passiva, prevaricação, tráfico de influência, branqueamento, burla qualificada, falsificação de documento, abuso de poder e recebimento indevido de vantagem, algum dos quais na forma agravada.

O ex-deputado social-democrata Sérgio Azevedo (2011-2019), líder do grupo do PSD na Assembleia Municipal de Lisboa de 2013 a 2017, está acusado pelo Ministério Público (MP) de 51 crimes: 11 de corrupção ativa, oito de corrupção passiva, 13 de prevaricação, dez de branqueamento, seis de tráfico de influência, dois de falsificação de documento e um de burla qualificada.

Em causa está, nomeadamente, a celebração de contratos entre juntas de freguesia de Lisboa e a Ambigold, empresa da qual é sócio, tal como o atual deputado do PSD Carlos Eduardo Reis, a quem o MP imputa 21 crimes: cinco de corrupção ativa, seis de prevaricação, cinco de tráfico de influência, quatro de branqueamento e um de abuso de poder.

O presidente da Junta de Freguesia de Santo António, Vasco Morgado (PSD); da Estrela, Luís Newton (PSD); do Areeiro, Fernando Braamcamp (PSD); e da Penha de França, Ana Sofia Oliveira Dias (PS), estão, por sua vez, entre os autarcas acusados.

Vasco Morgado responde por 27 crimes - 17 de corrupção passiva, sete de prevaricação, e três de branqueamento -, enquanto Luís Newton, igualmente deputado no parlamento, está acusado de dez: cinco de corrupção passiva e outros tantos de prevaricação.

De entre os autarcas em funções, Fernando Braamcamp é aquele a quem o MP imputa mais crimes - 39, todos de corrupção passiva, relacionados com contratações de serviços a diversas empresas.

Já Ana Sofia Oliveira Dias responde por um único crime de corrupção passiva agravado.

A lista de autarcas inclui ainda Ângelo Pereira, vereador com diversos pelouros no atual executivo da Câmara Municipal de Lisboa liderado por Carlos Moedas (PSD), e Inês Drummond, vereadora pelo PS na mesma autarquia e antiga presidente da Junta de Freguesia de Benfica.

O primeiro está acusado de um crime de recebimento indevido de vantagem, por uma viagem paga à China quando era vereador na Câmara Municipal de Oeiras; e a última de quatro de prevaricação, por adjudicações à Ambigold quando era autarca em Benfica.

Esta última empresa está também no centro de um acordo entre José Guilherme Aguiar, atual vereador socialista na Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia, e Carlos Eduardo Reis, datado de 2012 e relacionado com obras de instalações desportivas.

A contratação dos serviços da Ambigold pela Junta de Freguesia de São Domingos de Benfica (Lisboa) justifica ainda a imputação de dois crimes de corrupção passiva a Rodrigo Gonçalves, à data presidente da autarquia e atual conselheiro nacional do PSD.

No despacho, a que a Lusa teve acesso, o MP pede ainda a perda de mandato e futura inelegibilidade (proibição de concorrer a eleições) de 13 autarcas, entre presidentes, ex-presidentes e membros de executivos de juntas de freguesia e câmaras municipais.

A investigação da denominada operação Tutti-Frutti começou em 2018, tendo o ex-presidente do Município de Lisboa, Fernando Medina (PS), chegado a ser constituído arguido e agora ilibado pelo próprio MP.

As suspeitas que pendiam sobre a deputada social-democrata Margarida Saavedra, cuja imunidade parlamente chegou a ser levantada, foram igualmente arquivadas.

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