Deste episódio do Podcast Soberania, retira-se que, entre os três maiores partidos políticos nacionais - PSD, PS e Chega - as preocupações com a defesa nacional e europeia são comuns. Os meios e o ritmo para se aumentar o investimento é que provoca algumas divergências. Ainda assim, tendo em conta as intervenções dos deputados do PSD, Bruno Vitorino, do Chega, Pedro Pessanha e do ex-deputado Diogo Leão, haverá disponibilidade para definir uma estratégia e valorizar os pontos de acordo. João Annes, do Observatório de Segurança e Defesa da SEDES - que com o OSCOT é parceira do DN neste podcast - atribuiu, no final do programa, as “palavra-chave” que, no seu entender, mais definiram os pontos de vista dos convidados. “Credibilidade”, para Bruno Vitorino, “previsibilidade” para Diogo Leão, e a expressão, “acordar para a realidade”, implícita na opinião de Pedro Pessanha. VEJA AQUI O EPISÓDIO COMPLETO NO YOUTUBE.Para Bruno Vitorino, “a guerra na Ucrânia, a nova administração Trump e, mais recentemente, o conflito da Índia e do Paquistão, cujas consequências desconhecemos, prova que temos mesmo de perceber que, sendo nós um país pequeno, é o sistema de alianças e de organismos internacionais, onde temos o nosso papel na União Europeia, na ONU, mas também na NATO, o mais importante para mantermos a credibilidade. E a credibilidade tem a ver também, e muito, com o cumprimento das missões internacionais, mas também muito com o cumprimento das metas a que estamos obrigados, como o compromisso dos 2% do PIB para a despesa na defesa nacional e que o governo AD antecipou para 2029” - era para 2030.. Diogo Leão usou o termo “previsibilidade” na resposta a uma questão colocada sobre se a Lei e Programação Militar (LPM) não deveria ser revista de forma a adaptar as futuras aquisições de equipamentos às novas ameaças. “Onde estão as capacidades de guerra eletrónica? As capacidade anti drone, as capacidades de mísseis antinavios? É preciso vontade política para alterar decisões e compromissos financeiros previamente assumidos”, sinalizou João Annes.O antigo deputado membro da Comissão de Defesa Nacional (CDN) e atual candidato ao parlamento pelo PS, sublinhou que “a lei de programação militar é fundamental, tem sido um instrumento primordial para adquirir e construir capacidades militares, dando uma previsibilidade muito grande do ponto de vista financeiro, para além de que representa um compromisso na Assembleia da República extremamente alargado e obriga - o que é um fator sempre positivo - os diversos governos, seja qual for a cor partidária, a cumprir aquilo que está efetivamente programado”. Portanto, conclui Diogo Leão, “a previsibilidade é algo que é relevante em política, especialmente quando falamos de matérias de soberania e de defesa nacional”.Não obstante, salienta que, no programa do PS, é proposta “a criação de um mecanismo anual extraordinário para a aquisição de meios militares, uma dotação do Orçamento de Estado anual para fazer a necessidades prementes, urgentes e importantes de equipamentos que não constam da LPM ou que constam mas estão escalados no tempo para quadriénios posteriores.Da parte do Chega, que defende no seu programa eleitoral a antecipação já para 2026 da meta do 2% do PIB para a Defesa, o tempo urge, admite que se chegue aos 3% e não acredita num futuro de paz. “Estamos a falar de 8 mil milhões de euros (em 2024 foram 4,5 mil milhões). Se este investimento for bem direcionado, podemos catapultar de uma forma significativa a nossa economia. Acho que isto é uma questão de soberania”, assevera Pedro Pessanha, ex-oficial dos Fuzileiros, que preside à Comissão de Defesa Nacional. . “Na Ucrânia, temos homens entrincheirados e ao mesmo tempo, drones de 20 mil euros que dão cabo de uma fragata de um bilião (mil milhões). É este o paradigma da nova realidade. Acho que isto é uma prioridade e não é pelo facto da Guerra da Ucrânia. Há mentes sonhadoras que acham que quando a guerra na Europa terminar, vamos voltar atrás, vamos voltar em termos de paz. Isso acabou. As pessoas que pensam assim ou vivem numa realidade paralela, ou então não sabem o que é que estão aqui a dizer. Há uma nova realidade dentro deste contexto complexo geopolítico que estamos a assistir neste momento e, portanto, vamos ter que nos reinventar e vamos ter que nos repensar para o futuro, porque as ameaças vão continuar a existir”, concluiu. Outro momento do debate resultou de alguns números sobre o investimento na defesa que o DN recolheu e apresentou. Na semana passada, o governo anunciou que em 2024, Portugal tinha superado a percentagem do PIB gasto em defesa em relação ao que estava previsto, tendo fechado o ano com 1,58%. O último relatório da NATO apontava para os 1,46%, embora esse valor tivesse sido depois atualizado para 1,55” do PIB. Segundo informação oficial do ministério da Defesa Nacional(MDN), estes 1,58% do PIB representam um total de quase 4,4 mil milhões de euros (4.481.540). Deste valor, porém, 31% não são despesas diretamente para os serviços sob tutela do MDN, como as Forças Armadas. . Esse valor fica em 3,069 milhões de euros e o restante valor distribuído pela GNR (253 milhões); pelo Fundo Comum da NATO, do ministério dos Negócios Estrangeiros (26,5 milhões); pela Caixa Geral de Aposentações, do ministério das Finanças (974 milhões), pelos Serviços e Fundos Autónomos, como o Instituto de Apoio Social das Forças Armadas, e as Entidades Públicas Reclassificadas , como o Arsenal do Alfeite.De acordo com a informação reportada pelo governo à NATO, do total da despesa, Portugal gasta 19,5% em equipamento, já muito perto da meta de 20% da NATO e mais do dobro do que era há dez anos, em 2014. No entanto, só a Bélgica e a Bulgária gastam menos do que nós em equipamentos. Outro dado interessante sobre Portugal é que 58,6% da despesa é com pessoal, percentagem só superada pela Itália, com 59,4%. Para operações e manutenção são atribuídos 17,9% o bolo total e só seis países da NATO gastam uma percentagem menor. Quanto ao efetivo que está registado no relatório da NATO, referente ao ano passado, em 2014 tínhamos 30 mil militares e em 2024 caímos para os 24 mil. Uma queda de 21% em dez anos. Este decréscimo também aconteceu noutros 11 países da NATO, mas só a Bélgica ultrapassou Portugal com 30% menos militares em 2024 do que em 2014.. No entanto, em Portugal, depois de uma década de descida constante (com exceção para o ano de 2016 em que houve um aumento de 28.300 para 29.800 militares, mais 1500 ),em 2024, houve uma recuperação de 2600 militares, para um total de 24 mil.Bruno Vitorino aproveitou para assinalar o “bom caminho” que estava a ser trilhado pelo governo e não resistiu a uma nota de campanha eleitoral: “perdemos muito tempo no governo anterior, onde quando tivemos um aumento do valor global do PIB, não acompanhámos essa percentagem de investimento na área da defesa nacional. E esse foi o grande problema e foi o que nos trouxe a estes números que agora trouxe aqui”.Diogo Leão, claro, contestou: “No ano passado, num orçamento que ainda foi preparado e aprovado pelo Partido Socialista, estamos a falar de um aumento de cerca de cerca de 2 mil milhões de euros, é muito considerável a quase duplicação do orçamento em menos de dez anos. Portanto, não podemos dizer que houve um desinvestimento. Pelo contrário, há uma trajetória de investimento constante”, afirmou. Num sinal de paz, lembrou que o PS vê “com bons olhos a antecipação que o PSD propõe” (de a meta dos 2% ser atingida em 2029), sublinhando “há um consenso o mais alargado possível em relação a estas matérias” e que “o Partido Socialista e o PSD têm tido uma postura responsável desse ponto de vista”.Nenhum dos partidos falou sobre o que seria preciso sacrificar, por exemplo, nas despesas sociais, para aumentar o orçamento da defesa. Embora admita que tem de haver “cedências”, Pedro Pessanha prefere não falar “onde iríamos buscar” as verbas para alcançar o nível de investimento que o seu partido deseja. Insiste que “investindo na defesa, se for bem direcionado, gera emprego, gera riqueza”, acrescentando que “a perceção, da ameaça e o envolvimento da opinião pública é fundamenta”. “Temos de saber explicar e não é fácil saber explicar, de facto, aos nossos concidadãos que a melhor forma de termos paz é estarmos efetivamente estar preparados para a guerra. E para isso temos de investir”, concluiu.Bruno Vitorino considera “muito difícil” atingir “os objetivos do Chega a curto prazo, mesmo com um amplo consenso nacional, porque aí sim, era preciso mexer noutras áreas, era preciso começar a cortar, e muito, noutras áreas”, não acreditando que se atinjam “esses números só com crescimento económico”Diogo Leão pensa que tudo devemos fazer para tentar acomodar o nosso Estado social, as nossas despesas sociais, como temos feito inclusivamente em crescimento das dotações na saúde, na educação, que são fundamentais”.. Coube a João Annes as conclusões, sintetizando as mesmas na três palavras-chave que, no sue entender, considerou mais importantes das intervenções dos três políticos: “a credibilidade que precisamos ter, a previsibilidade de que necessitamos para conseguirmos executar e uma visão clara da realidade e das ameaça”. Deixou ainda um apelo: que esta conversa “inspire a todos e aos grupos parlamentares na próxima legislatura. Contamos convosco para ajudarem os vossos partidos políticos a não cederem a essas tentações de lutas partidárias, porque em matéria de defesa nacional, neste momento toda a nossa soberania e a nossa liberdade estão à distância de um clique. Não está à distância de um obus, nem de um drone”.Pedro Pessanha ainda surpreendeu mesmo no final, ao colocar em cima da mesa dois livros cuja leitura recomendou. O recentemente publicado “Afeganistão, testemunhos de 16 anos da presença das Forças Nacionais Destacadas Lusas ( 2005 a 2021)” e “O Trunfo é Espadas”, uma obra das Edições Marinha que conta a história das espadas dos oficiais navais e as espadas de honra da Armada, e foi escrito, precisamente, por Diogo Leão, a quem Pessanha pediu um autógrafo. Que lhe foi concedido.