Da nacionalidade à etnia. “Se a ideia é divulgar, que se divulgue tudo o que é relevante”

Qual a sua perspetiva sobre os projetos de Chega e IL, que querem incluir, no RASI, respetivamente, a etnia e a nacionalidade, de quem comete crimes? Servirá para delinear políticas mais apertadas?Sou a favor de que não faz sentido, em termos estatísticos, esconder ou omitir, seja o que for. Se a ideia é divulgar, divulgue-se tudo o que é relevante. A etnia é relevante. Mas há aqui um parêntesis. Tem de haver total transparência na questão estatística do tratamento da criminalidade. É importante sabermos as nacionalidade ou as faixas etárias, isso é importante. Porquê? Temos evoluído muito na parte da criminologia. Em Portugal, temos excelentes profissionais da área de criminologia, temos licenciaturas em criminologia com grandes currículos, e temos a psicologia. Precisamos de ter os profissionais destas áreas a analisarem estas tendências, a analisarem os números, a analisarem a estatística com rigor para que sejam produzidos resultados que possam abordar qualquer tipo de fenómeno, independentemente da cor, da raça, da religião. Não importa. No fundo, tenho de ter a estatística correta para que, do ponto de vista da psicologia, da criminologia, das ciências policiais, possa estudar fenómenos e criar as respostas mais indicadas e mais assertivas a qualquer tipo de fenómeno. Portanto, para mim faz sentido. Agora, ressalvo: não vejo mal em que a estatística completa possa ser de alguma forma classificada para a opinião pública. Não vejo mal nenhum nisso poder ser classificado, não constando oficialmente e textualmente no RASI, por exemplo. Quem tem a tarefa em Portugal de liderar a investigação criminal, liderar a segurança interna, tem de ter acesso a toda a informação que permita estudar fenómenos e criar as respostas mais assertivas, corretas, proporcionais e justas para qualquer tipo de fenómeno. Não podemos tentar aumentar dados. Já é tempo de, em Portugal, atribuirmos à criminologia a importância que tem, bem como à psicologia criminal, à sociologia ou às ciências policiais. Não podemos ter investigadores a trabalhar com estatísticas inexistentes para depois se criar este ruído de que uns acusam, os outros defendem, outros protegem, outros omitem, outros mentem, e andamos aqui a criar falsas perceções e falsas narrativas. Se tivermos acesso aos dados completos, até podemos desmistificar situações. Ou não. Temos de ter os melhores profissionais a analisar estas situações de forma limpa, objetiva, a criar e a estudar soluções nas ciências policiais.É por isso que a Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais (DGRSP) já divulga as nacionalidades?Pode ser porque têm uma importância primordial na, vou-lhe chamar, análise da vida do preso por causa das questões de reinserção social. Claramente que será importante ter muitos fatores em conta na vida de um ser humano quando estamos a falar da sua reinserção social pós um período de encarceramento. É importante perceber determinados detalhes da sua vida ou da sua cultura, bem como questões sociológicas que sejam importantes. Imagino que possa ser por isso. Faz-me sentido..Chega quer dados sobre etnia e nacionalidade nos relatórios de segurança interna.E a nacionalidade das vítimas também deve ser incluída?Claro que sim. Torno a dar a mesma resposta. Mas se vamos revelar por revelar não faz sentido. Mais vale classificar. Se vamos revelar porque faz parte de todo um processo de estudo, fará sentido. Se, por exemplo, conseguirmos perceber que grande parte das vítimas de furto são mulheres estrangeiras, os furtos ocorrem à noite em zonas movimentadas, já sabemos que provavelmente é uma boa solução, lançar uma campanha nos aeroportos a dizer: “protejam-se à noite, tenham cuidado”. Ou seja: podem analisar-se estes fenómenos e tentar, de alguma forma, criar aqui qualquer metodologia que sirva para alertar as pessoas.É importante fazer a distinção entre os estrangeiros que cometem crimes? Se são imigrantes ou não, por exemplo?É importante perceber-se se são ‘equipas’ de criminosos transnacionais, se estão a residir em Portugal, ou se são ‘turistas’, porque hoje em dia é fácil atravessar fronteiras para cometer crimes e regressar no mesmo dia.Que dados podem ser relevantes de incluir nestes relatórios, no seu entender?Importa perceber para que serve o RASI. É o quê?Um manual de estatística ou do que correu mal no ano passado? Se a resposta for: precisamos do RASI, que até engloba pareceres do Serviço de Informações de Segurança (SIS), para se ter uma noção real, líquida e limpa da criminalidade em Portugal, a vários níveis, é importantíssimo. Se for só para eu saber, não vale a pena. Em termos estatísticos, sou sincero: não quero saber se 10% da criminalidade foi cometida por brancos, negros ou amarelos. Isso não me diz nada. Quero é perceber a relação entre fenómenos. Isto é, se determinado tipo de crime aumentou e porquê, se é típico de algum país em particular. Por exemplo, a violência doméstica aumentou, qual a nacionalidade dos casais? Temos de olhar para isto com honestidade intelectual e ter noção de que há culturas em que a relação homem-mulher não é a mesma que numa cultura ocidental. Se estão em Portugal e isso acontece e há violência doméstica, temos de ter noção do porquê. Outro exemplo: ouvimos falar, durante muitos anos, da excisão genital feminina. Em São Tomé e Príncipe é normal, mas cá é crime. Não é por lá ser cultural que cá se tolera isso. Combateu-se esse fenómeno, mas fez-se isso com conhecimento e mentalizando os hospitais para a necessidade de denunciar esses casos. Ou seja: se temos todas estas ciências ao nosso dispor, temos de lhes dar os dados para criar soluções e apoiar. Tem de haver grupos de trabalhos nas forças de segurança e nos ministérios que se dediquem a analisar os dados e a criar soluções..Inclusão das nacionalidades de autores e vítimas de crimes depende da AD

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