Chega quer dados sobre etnia e nacionalidade nos relatórios de segurança interna
O projeto de resolução do grupo parlamentar do Chega, submetido à Assembleia da República, recomenda ao Governo "que disponibilize dados relativos à nacionalidade, naturalidade, etnia e à permanência em território nacional de suspeitos e/ou condenados pela prática de crimes, bem assim como das vítimas, no Relatório Anual de Segurança Interna [RASI] e nas publicações relativas a estatísticas do Ministério da Justiça sobre crimes registados pelas autoridades policiais".
O documento, com a data de 21 de janeiro e ao qual o DN teve acesso, é assinado pelos deputados do grupo parlamentar do Chega André Ventura (presidente do partido), Pedro Pinto, Cristina Rodrigues, Vanessa Barata, Madalena Cordeiro e Manuel Magno.
Neste projeto de resolução, o partido quer que o Governo de Luís Montenegro proceda ainda "à identificação, em quaisquer inquéritos de vitimação e de delinquência autorrevelada que venha a determinar, dos dados relativos à nacionalidade, naturalidade, etnia e à permanência em território nacional de suspeitos e/ou condenados pela prática de crimes".
Para a inclusão destes indicadores nos relatórios de segurança interna, o Chega recomenda que o Governo "encete as diligências administrativas, regulamentares ou legislativas indispensáveis para garantir que a recolha de dados sobre a criminalidade registada pelas forças e serviços de segurança assegure a possibilidade de posterior tratamento individualizado dos dados relativos à nacionalidade, naturalidade, etnia e à permanência em território nacional de suspeitos e/ou condenados".
A iniciativa do Chega surge porque o partido considera que, atualmente, a forma como o RASI "é construído e apresentado e o tipo de dados que são vertidos no mesmo não são de molde a refletir com fidedignidade a atividade criminal que visam contabilizar". Deputados do partido defendem que situação "se deve, em particular, ao facto de não mencionarem a nacionalidade dos suspeitos nem qual a sua situação no que toca à permanência em território nacional".
A mesma situação acontece, segundo partido, "com os dados divulgados pelas publicações de estatísticas da Justiça sobre crimes registados pelas autoridades policiais, da responsabilidade da Direção-Geral da Política de Justiça (DGPJ)".
No texto do projeto de resolução, o Chega faz referência ao artigo 9º, nº 1, do regulamento 2016/ 679 do Parlamento Europeu e do Conselho, "relativo à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados", dando conta que "é proibido o tratamento dos dados pessoais que, entre outros, revelem a origem étnica ou racial do indivíduo". "Entre estes figuram, segundo cremos, os dados relativos à nacionalidade do indivíduo e os referentes à sua permanência em território nacional", diz o grupo parlamentar do Chega.
Os deputados do partido consideram, porém, que um artigo do regulamento, mais concretamente o nº2, "prevê exceções à referida proibição", referindo-se à alínea g: "dificilmente se poderá negar que garantir a segurança pública e definir a política criminal do Estado constituem 'interesse(s) público(s) importante(s)', para os efeitos daquela disposição do RGPD [Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados"
"Por outro lado, os dados que constam do RASI são todos anonimizados e a sua utilização naquele relatório é proporcional ao objetivo visado, a saber, a descrição das práticas criminais e da sua distribuição pelo território nacional, com o propósito de sustentar a definição de objetivos, prioridades e orientações em matéria de prevenção da criminalidade, investigação criminal, ação penal e execução de penas e medidas de segurança", lê-se no documento do Chega.
Defende ainda o grupo parlamentar que "o facto de o RASI transmitir apenas um lado da realidade da criminalidade em Portugal, o das estatísticas do sistema de justiça criminal, não permite levantar o véu que impende sobre as chamadas cifras negras, ou seja, a criminalidade não participada".
O Chega considera que há mais dois instrumentos, já referidos, para apurar a realidade da criminalidade do pais, os inquéritos de vitimização e os inquéritos de delinquência autorrevelada. "Permitem colmatar esta lacuna no conhecimento da realidade criminal", indica o projeto de resolução.
Também nos inquéritos de vitimação e de deliquência autorrevelada recomendam a utilização de dados sobre a nacionalidade e a situação quanto à permanência em território nacional.
"Só com este tríptico é possível traçar o panorama fiel da criminalidade que, em cada ano, ocorre em território nacional", defendem.
Os deputados do Chega consideram que, com esta iniciativa, "o Chega propõe soluções para reduzir o conjunto substancial de crimes que ficam fora do radar das estatísticas do sistema de justiça criminal", o que, segundo defendem, fomenta "uma imagem destorcida da criminalidade em Portugal, que tudo tem de artificial e forçada".
Por fim, o documento termina com o Chega a considerar "imperativo avaliar a dimensão daquela realidade, associada ao aumento da imigração, que não 'passa' para o RASI, ou que nele é retratada de forma a criar uma perceção diferente da realidade, mais amenizada, para contento dos cidadãos nacionais e para funcionar como isco para turistas".
IL defende dados sobre a nacionalidade no RASI e nas Estatísticas da Justiça. Montenegro revelou abertura
O objetivo dos liberais é o de "esvaziar o discurso populista", trazendo ao debate político dados concretos, não baseados em "perceções", explicou ao DN fonte do partido.
No primeiro debate quinzenal de 2025, que decorreu na semana passada, o primeiro-ministro, Luís Montenegro, demonstrou ter abertura relativamente à proposta da IL,mas disse que antes de qualquer alteração, irá consultar o Conselho Superior de Segurança Interna.
"Presumindo que essa recomendação possa ser aprovada, vou levá-la a discussão no Conselho Superior de Segurança Interna que tem competência para apreciar, dos pontos de vista técnico e operacional, a capacidade de poder recolher e tratar estes dados", afirmou Montenegro no Parlamento sobre o projeto de resolução da IL.
EUA e Reino Unido têm relatórios sobre dados de criminalidade de imigrantes
Estados Unidos e Reino Unido são dois exemplos de países que têm relatórios que detalham a nacionalidade e etnia dos cidadãos detidos.
Os britânicos já compilam estes dados desde 2006, que são publicados pelo próprio governo, sendo que os dados relativos ao período entre abril de 2022 e março de 2023 indicam que a o número de detenções na comunidade negra "é 2,2 vezes superior" em relação a caucasianos, pois registaram-se 20,4 detenções por cada 1000 cidadãos negros, enquanto entre os caucasianos é de 9,4 por cada 1000 pessoas.
Já nos Estados Unidos, há várias entidades que publicam relatórios sobre criminalidade, mas são os dados online do FBI, no denominado Crime Data Explorer - que permite avaliar vários itens, entre os quais as detenções por género, idade e etnia. Tendo em conta os dados disponíveis dos últimos cinco anos, 65% do total dos detidos nos Estados Unidos eram caucasianos, enquanto 27% eram negros ou afro-americanos.
Com Leonardo Ralha