"Conveniência de serviço" foi a fórmula usada para justificar algumas das mais rápidas exonerações feitas por José Sócrates.
"Conveniência de serviço" foi a fórmula usada para justificar algumas das mais rápidas exonerações feitas por José Sócrates.Paulo Spranger / Global Imagens

Sócrates foi campeão das substituições aceleradas de titulares de altos cargos

IEFP, Instituto da Segurança Social e PSP tendem a ter lideranças alteradas rapidamente a cada mudança de poder. Todos os primeiros-ministros que tomaram posse neste século fizeram mexidas de altos cargos nos primeiros meses dos mandatos. E não raras vezes mais depressa, e com maior impacto, do que Luís Montenegro.
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Defensor da doutrina de que “é natural que haja substituições de altos cargos de responsabilidade”, devido à execução do programa do Governo e ao exercício de responsabilidades que têm tutelas políticas, Luís Montenegro disse que quem procurasse o que os seus antecessores fizeram no mesmo período que leva de mandato detetaria realidades comparáveis. Aceite o desafio, no que diz respeito aos primeiros-ministros que iniciaram funções neste século, a verdade é que todos fizeram alterações aceleradas nos dirigentes de topo de institutos e outras entidades do Estado. E, alargando o horizonte temporal para os primeiros três meses desde a tomada de posse - para o atual Governo passou pouco mais de um mês, pois foi a 2 de abril -, destaca-se o primeiro Executivo de José Sócrates, decorrente da então inédita maioria absoluta do PS, obtida nas legislativas de 2005.

Enquanto o Governo de Montenegro arrancou as exonerações com a provedora da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, Ana Jorge (e restante equipa), e o diretor executivo do Serviço Nacional de Saúde, Fernando Araújo, seguindo-se o diretor nacional da Polícia de Segurança Pública (PSP), José Barros Correia - único que tem substituto nomeado, com Luís Carrilho a ser escolhido pela ministra da Administração Interna, Margarida Blasco -, à qual se juntou ontem a demissão do presidente das Águas de Portugal, José Furtado, cedendo o lugar ao ex-ministro (e antigo presidente da Câmara de Lisboa) Carmona Rodrigues, Sócrates tomou posse a 12 de março de 2005 e no primeiro mês só deu por finda a comissão de serviço de Branquinho Lobo enquanto diretor nacional da PSP, num despacho do então ministro da Administração Interna, António Costa.

Nos dois meses seguintes, pelo contrário, Sócrates e os seus ministros, sobretudo os titulares das pastas da Saúde, Correia de Campos, e do Trabalho, Vieira da Silva, aceleraram o ritmo de mudança de altos cargos. “Conveniência de serviço” foi a fórmula usada para justificar a exoneração do presidente do Instituto de Segurança Social (ISS), João Ferreira Dias, da presidente do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, Ana Maria dos Reis Botto, e do presidente do conselho diretivo do Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP), Fernando de Almeida Baptista, sucedendo igual destino ao vice-presidente, Octávio Félix de Oliveira.

Também exonerados foram o secretário-geral do Sistema de Informações da República Portuguesa, Domingos Jerónimo, por falta de confiança pessoal e política, sucedendo o mesmo ao coordenador do Programa Polis, João Manuel Pereira Teixeira, com a liderança na entidade que se dedicava à reabilitação urbana a caber a José Manuel Reboredo Pinto Leite, que viria a ser autarca do PS. Na Saúde, Nuno Freitas deixou de presidir ao Instituto da Droga e da Toxicodependência enquanto António Tato e Conde Moreno foram exonerados, respetivamente, da presidência dos conselhos de administração do Hospital de São João e do Hospital de Santa Maria. E, dois meses após entrar em funções, Sócrates nomeou Jaime Andrez para a presidência do Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas e ao Investimento (IAPMEI) e João Marques da Cruz para a do Instituto do Comércio Externo de Portugal (ICEP), cargos até então detidos pelo exonerado Manuel Costa da Silva, que saiu a seu pedido.

Mais contidos foram os seus antecessores. Chegado ao poder, num executivo de coligação PSD-CDS, Durão Barroso aceitou a cessação de funções de João Gomes Cravinho, substituiu todos os governadores civis e ditou o fim da comissão de serviço da presidente da Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo, Margarida Bentes, “em virtude da necessidade de imprimir uma nova orientação à gestão de serviços”, segundo o então ministro da Saúde, Luís Filipe Pereira. Tirando isso, não foi além da exoneração, a seu pedido, do presidente do ISS, Martins Alves, e dos seus homólogos do Instituto Nacional de Habitação, João Maltez, e do Instituto de Gestão de Fundos de Capitalização da Segurança Social, Joel Hasse Ferreira, ex-deputado do PS.

Sucessor de Barroso sem se submeter a votos, o também social-democrata, e até então presidente da Câmara de Lisboa, Santana Lopes, fez poucas mexidas nos primeiros três meses do seu efémero Governo. Deu por finda a comissão de serviço do diretor nacional da PSP, Mário Belo Morgado, Carmen Pignatelli foi exonerada de gestora da Intervenção Operacional da Saúde, Ataíde das Neves deixou de ser, a seu pedido, inspetor-geral do Trabalho e Álvaro Dâmaso cedeu o lugar ao seu vice-presidente, Pedro Duarte Neves, no ICP-ANACOM.

Em 2011, as regras impostas pela troika fizeram-se sentir no arranque do Governo de Passos Coelho, com a quase imediata exoneração de todos os governadores civis, pois as entidades que lideravam foram extintas. Também se procedeu à exoneração de Edmundo Martinho da presidência do ISS, onde já terminara a comissão de serviço, sendo substituído pela centrista Mariana Ribeiro Ferreira. E ainda à cessação de funções do presidente do Instituto dos Vinhos do Douro e Porto, Luciano Augusto Pereira.

Mais interventivo foi António Costa quando tomou posse, em 2015, após a queda do segundo executivo de Passos Coelho. Caíram os conselhos diretivos do IEFP - embora Jorge Gaspar tenha ficado na presidência - e do Instituto do Turismo de Portugal, então liderado pelo deputado e futuro líder partidário Cotrim de Figueiredo, sendo ainda dissolvido, “com fundamento em critérios de mera conveniência”, o conselho de administração do Metro de Lisboa, que era comum à CP, Transtejo e Soflusa.

Figuras de destaque entre os exonerados

A ex-ministra da Saúde Ana Jorge, que continua à frente da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa até a ministra Maria do Rosário Palma Ramalho nomear substituto, não é um caso único entre figuras de destaque afastadas de altos cargos públicos na sequência de mudanças de Governo.

Sucedeu a João Gomes Cravinho, em 2002, optando por cessar funções enquanto presidente do Instituto de Cooperação Portuguesa, seis dias após a tomada de posse do Governo de Durão Barroso, com Martins da Cruz no Ministério dos Negócios Estrangeiros - pasta ministerial que o próprio Cravinho assumiria entre 2022 e 2024, após ser ministro da Defesa nos quatro anos anteriores.

No início de 2016, João Cotrim de Figueiredo teve o conselho diretivo do Instituto do Turismo de Portugal que presidia ser dissolvido num despacho da então secretária de Estado Ana Mendes Godinho. Três anos depois foi eleito deputado único da Iniciativa Liberal, partido que liderou entre 2019 e 2023.

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