A Câmara de Setúbal retirou do acolhimento de cidadãos ucranianos a técnica superior de origem russa Yulia Khashin e vai pedir ao Ministério da Administração Interna que proceda a uma averiguação sobre a receção de refugiados por russos alegadamente pró-Putin.."A Câmara Municipal de Setúbal irá solicitar ao Ministério da Administração Interna que adote, de imediato, os necessários procedimentos no sentido de averiguar a veracidade das suspeitas veiculadas pelo jornal Expresso, manifestando total disponibilidade para prestar toda a informação necessária", refere, em comunicado, o município sadino, liderado por André Martins (eleito pela CDU).."Face à situação criada, a Câmara Municipal retirou do acolhimento de cidadãos ucranianos a técnica superior citada na notícia até ao total e inequívoco esclarecimento desta situação", acrescenta o comunicado, salientando que, depois de tomar conhecimento de afirmações proferidas, há duas semanas, pela embaixadora da Ucrânia em Portugal relativamente à Associação dos Emigrantes de Leste (Edintsvo), questionou formalmente o próprio primeiro-ministro, António Costa..O pedido, indica a autarquia, foi feito "no próprio dia, por ofício", pedindo que o chefe do Governo se pronunciasse sobre as declarações e "esclarecesse com a maior brevidade possível se o Alto Comissariado para as Migrações mantinha a confiança nesta associação, não tendo obtido resposta até ao momento"..A tomada de posição da liderança do município surge na sequência da notícia divulgada pelo Expresso de que refugiados ucranianos estão a ser recebidos na autarquia por russos pró-Putin..A autarquia reconhece que "Igor Khashin colabora, regularmente, há vários anos, com várias entidades da administração central, entre as quais o Instituto de Emprego e Formação Profissional, o Alto Comissariado para as Migrações e o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, tendo prestado esta colaboração já este ano em instalações de alguns destes serviços em Setúbal, no contexto do acolhimento de refugiados da guerra da Ucrânia"..A Câmara de Setúbal afirma ainda que "são cumpridos todos os requisitos técnicos inerentes a um atendimento social" e que a "recolha de informação só é feita com autorização expressa por escrito dos próprios", tratando-se de "um procedimento reconhecido e utilizado pelas entidades que, em Portugal, fazem este tipo de trabalho"..A autarquia refere ainda que "repudia com a veemência toda e qualquer insinuação de quebra de sigilo no tratamento de dados de cidadãos ucranianos acolhidos nos seus serviços"..Segundo revelou hoje o jornal Expresso, pelo menos 160 refugiados ucranianos já terão sido recebidos por Igor Khashin, antigo presidente da Casa da Rússia e do Conselho de Coordenação dos Compatriotas Russos, e pela mulher, Yulia Khashin, funcionária do município setubalense..De acordo com o Expresso, Igor Khashin, líder da Associação dos Emigrantes de Leste (Edintsvo), subsidiada desde 2005 até março passado pela Câmara de Setúbal, e a mulher terão, alegadamente, fotocopiado documentos de identificação dos refugiados ucranianos, no âmbito da Linha de Apoio aos Refugiados da Câmara Municipal de Setúbal..De acordo com o Expresso, Igor Khashin e a mulher terão também questionado os refugiados sobre os familiares que ficaram na Ucrânia, mas a Câmara Municipal de Setúbal garante que "nunca foi feita tal pergunta"..O jornal Expresso refere ainda que Igor Khashin é um dirigente associativo com dupla nacionalidade, que se apresenta como "gestor de projetos", e que as associações a que terá estado ligado estavam nos sites da Ruskyi Mir e da Rossotrudnichestvo, instituições estatais criadas pelo Kremlin para divulgar a cultura e o mundo russos, mas que, segundo fontes citadas pelo jornal, "podem servir de cobertura a elementos dos serviços secretos" da Rússia..O PSD admitiu entretanto pedir a demissão do presidente da Câmara Municipal de Setúbal, André Martins (CDU), na sequência deste caso.."Estamos a ponderar a possibilidade de pedirmos a demissão do presidente da Câmara de Setúbal. No dia 20 de abril questionámos a maioria CDU na Câmara de Setúbal sobre este assunto e apelámos a que a situação fosse alterada, até por uma questão de sensibilidade das pessoas que fugiram da guerra, para que não fossem recebidas por russos", disse à agência Lusa o vereador do PSD Paulo Calado.."A confirmar-se o que vem hoje no jornal Expresso, o caso é ainda mais grave, porque os ucranianos estão a ser recebidos por russos pró-Putin", acrescentou o autarca social-democrata, considerando que se trata de uma "questão de Estado" que deve ser investigada pelas autoridades portuguesas..O deputado e vereador socialista do PS na Câmara de Setúbal, Fernando José, também considera que houve "falta de sensibilidade" da maioria CDU e defende que se trata de uma situação que tem de ser revista rapidamente.."É uma situação que tem de ser revista e alterada com caráter de urgência", disse Fernando José à agência Lusa, adiantando que houve associações de ucranianos que se disponibilizaram para fazer o trabalho de ligação com os refugiados, mas que "não obtiveram resposta do município"..O PSD já anunciou que vai pedir a audição parlamentar do presidente da Câmara de Setúbal e da embaixadora da Ucrânia, e solicitar esclarecimentos, por escrito, ao gabinete do primeiro-ministro..A Iniciativa Liberal requereu hoje a audição parlamentar urgente do presidente da Câmara de Setúbal para esclarecer as notícias "extremamente graves" de que o acolhimento de refugiados naquela autarquia está a ser feito "por pessoas ligadas a organizações russas"..Em declarações aos jornalistas nos passos perdidos do parlamento, a deputada da Iniciativa Liberal (IL) Joana Cordeiro referiu que o partido "está a acompanhar com extrema preocupação" as notícias que têm chegado "pela comunicação social do acolhimento que está a ser feito na Câmara de Setúbal aos refugiados ucranianos", referindo-se à edição do Expresso que refere que "esse acolhimento está a ser feito por pessoas ligadas a organizações russas que defendem o regime de Putin".."Isto é extremamente grave e temos que apurar o que se passa e por esse motivo a IL vai convocar com caráter de urgência o presidente a Câmara de Setúbal, André Valente Martins, à primeira comissão para que explique o que se está a passar na câmara de Setúbal", anunciou..André Valente Martins, do Partido Ecologista "Os Verdes", foi eleito pela lista da CDU (PCP/PEV/ID) nas últimas eleições autárquicas. Para os liberais é importante perceber "se de facto nesta altura o PCP está a favor da paz ou está a favor do agressor"..A IL vai ainda pedir a audição do presidente da Associação de Ucranianos em Portugal para esclarecer "se esta situação se passa no resto do país"..O PCP sustentou hoje que o trabalho desenvolvido com imigrantes no município de Setúbal, liderado por um autarca eleito pela CDU, "caracteriza-se por critérios de integração", rejeitando exclusões ou "sentimentos xenófobos" no acolhimento a refugiados..Numa curta resposta enviada à agência Lusa, o PCP refere que "o trabalho com imigrantes que há muito se desenvolve no município de Setúbal caracteriza-se por critérios de integração e amizade entre os povos onde não prevalecem nem exclusões nem sentimentos xenófobos"..O partido argumenta que num momento em que "se impõe um reforço do apoio aos refugiados, em particular aos ucranianos, esta conceção humanista é ainda mais importante"..A Associação dos Ucranianos em Portugal disse hoje que há "por todo o país" elementos pró-Putin nas organizações que estão a acolher refugiados ucranianos, alertando trata-se de um fenómeno que se repete em toda a Europa.."Desde que os refugiados começaram a chegar a Portugal, em março, começámos a receber alertas de que tinham sido recebidos por pessoas de elementos pró-russos que se faziam passar por elementos de organizações internacionais e até ucranianas", contou à Lusa o presidente da Associação dos Ucranianos em Portugal, Pavlo Sadoka, garantindo que as denúncias chegaram "de norte a sul do país"..Nestes encontros, os ucranianos acabados de fugir da guerra temiam pela sua segurança assim como dos familiares e amigos que tinham ficado no país, acrescentou Pavlo Sadoka..A Associação dos Ucranianos em Portugal alertou "há mais de um mês, os serviços secretos portugueses (Serviço de Informações de República Portuguesa) para a presença de agentes infiltrados nas organizações que estavam a dar apoio aos refugiados e a recolher informações sobre as suas famílias", disse.