Aproposta de Orçamento do Estado para 2025 (OE2025), apresentada pelo Governo na sequência de uma negociação com o PS, acolheu as exigências socialistas quanto ao alívio fiscal inicialmente defendido pela Aliança Democrática (AD), mas a redução na descida do IRC e a alteração da lógica do IRS Jovem não esgotam as alterações que a coligação liderada por Luís Montenegro fez em relação ao programa eleitoral com que o então líder do PSD conseguiu interromper um ciclo de oito anos de governação socialista..Sendo certo que a campanha eleitoral foi dominada pela mensagem de que o alívio fiscal era a chave para assegurar crescimento económico, e para conter a continuação da emigração dos jovens portugueses para países onde conseguem melhores salários, Luís Montenegro também centrou grande parte do seu discurso na recuperação dos serviços públicos, nomeadamente no que toca à Saúde, Educação e Habitação. E esse foco traduziu-se em medidas agora ausentes da proposta de OE2025 elaborada por Miranda Sarmento..Há casos em que isso não foi uma surpresa, com o dos vouchers que seriam disponibilizados aos utentes do Serviço Nacional de Saúde (SNS) deixados à espera de cirurgias e consultas de especialidade por mais tempo do que clinicamente recomendado, custeando o recurso a Unidades de Saúde dos setores privado e social. A medida caiu logo em maio, quando o Governo apresentou o Plano de Emergência para a Saúde, já então a viver a realidade de contar com o apoio parlamentar mais minoritário desde meados dos anos 80, antes de Cavaco Silva obter duas maiorias absolutas consecutivas para o PSD. E mais empenhado no reforço do setor público..No programa eleitoral da AD, e também no programa do XXIV Governo Constitucional, estava o Suplemento Remunerativo Solidário, que não surge na proposta de OE2025. Em causa, como no início do ano foi repetido pela coligação de centro-direita que juntou PSD, CDS, PPM e independentes, estava a substituição de “um conjunto alargado de apoios sociais” por algo destinado a funcionar como um meio de recuperar portugueses em situação vulnerável para o mercado de trabalho. Sobretudo por permitir acumular salários com o Rendimento Social de Integração e outro tipo de apoios..Fora daquilo que foi defendido na campanha eleitoral para as Legislativas esteve o descongelamento da Taxa de Carbono, o fim do mecanismo de gasóleo profissional extraordinário e o abandono da isenção de pagamento de Imposto sobre Produtos Petrolíferos no que toca a biocombustíveis avançados. No total, estas três medidas incluídas na proposta orçamental do Governo implicam uma receita fiscal adicional de 650 milhões de euros, dos quais 525 milhões de euros decorrem da atualização da Taxa de Carbono, criticada por vários partidos da Oposição como um exemplo de imposto indireto que contrabalança o efeito do alívio fiscal nos rendimentos dos trabalhadores e das empresas..Pelo contrário, o documento elaborado por Miranda Sarmento teve de acomodar o impacto de 180 milhões de euros decorrente da eliminação das Taxas de Portagem em autoestradas do Interior e onde não existem vias alternativas, que entra em vigor em janeiro de 2025, resultando da convergência do PS e do Chega na Assembleia da República..Falta de previsibilidade.Ainda assim, as principais diferenças entre o que foi defendido pela AD e a proposta orçamental estão nos impostos diretos. No programa eleitoral, onde se lia que “a redução da carga fiscal é uma prioridade assumida, devendo ser implementada de modo gradual e sustentável”, e no Programa do Governo, deixou-se sempre claro que a taxa de IRC deveria ter uma redução gradual de dois pontos percentuais por ano, até baixar dos atuais 21% para os 15%. Tal ritmo foi sempre apontado como um motor do crescimento económico e um fator de captação de investimento estrangeiro, mas esbarrou nas exigências de Pedro Nuno Santos, com o Governo a optar por um meio termo: a descida no próximo ano será de apenas um ponto percentual, para 20%. Ao DN, o economista João Duque comenta que “menos um ponto percentual não vai atrair muita gente”, mas aponta uma questão mais grave..“Qual é a garantia que no próximo ano não se aumentará um ponto se houver eleições, e o PS ganhar?”, pergunta João Duque, reforçando que “falta previsibilidade” para atrair investidores, “falta compromisso” do principal partido da Oposição e noção de que um processo negocial numa lógica de “tudo ou nada” é, na realidade, uma imposição..Seja como for, naquilo que o economista vê como um sinal de que “este Orçamento do Estado não é assim tão diferente do anterior”, a alteração no IRS Jovem defendida pela AD na campanha para as Legislativas - nas quais conseguiu grande vantagem entre os eleitores mais novos - acabou por ser alterada até se aproximar do modelo em vigor, criado quando o primeiro-ministro era António Costa..A AD advogava a adoção, “de forma duradoura e estrutural”, da taxa máxima de 15% para todos os jovens até 35 anos, à exceção dos contribuintes do último escalão de IRS, mas as críticas dos socialistas quanto à injustiça relativa, e ao “salto” após essa idade, motivaram uma profunda alteração. As isenções fiscais terão a duração de dez anos e o efeito será progressivamente mitigado: no primeiro ano, os jovens beneficiam de 100% de isenção, que diminui para 75% do segundo ao quarto ano de atividade, para 50% do quinto ao sétimo, e de 25% do oitavo ao décimo, com um limite máximo de rendimento anual isento na ordem dos 28 mil euros (55 IAS).