"Não se pode produzir num dia 450 milhões de vacinas, nem aplicar num dia 450 milhões de doses"

"Relançamento da Europa será verde e digital", declarou Charles Michel, presidente do Conselho Europeu, em apoio às prioridades enunciadas pelo primeiro-ministro português no CCB para estes seis meses de presidência da UE. Luta à covid exige paciência.
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"É preciso ter consciência de que vivemos um momento único. E que não se pode produzir num dia 450 milhões de vacinas, nem aplicar num dia 450 milhões de doses", afirmou António Costa, na conferência de imprensa conjunta com o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, de visita a Lisboa. Com o antigo primeiro-ministro belga ao lado, ambos relembrando que estão habituados a trabalhar juntos há vários anos, o chefe do governo português foi muito pressionado pelos jornalistas a avançar com datas sobre a conclusão do processo de vacinação contra a covid-19, e não deixou de realçar que tudo está já a ser feito em tempo recorde, inimaginável há uns meses, quando a pandemia se iniciou. E elogiou a capacidade de resposta conjunta dos 27 para obtenção da vacina, não "havendo desta vez o guerrear como houve antes pelas máscaras e pelo gel".

Depois da reunião de trabalho, Costa e Michel chegaram para o encontro com os jornalistas já um pouco em cima da hora e a visita aos Jerónimos teve de ser rearrumada para minutos antes do concerto de abertura da presidência portuguesa da UE ali também no CCB. Ambos os locais estão cheios de simbolismo europeu, pois foi nos Jerónimos que em 1985 se assinou a adesão de Portugal à então CEE e foi no CCB, ainda por inaugurar ao público, que em 1992 Portugal iniciou a primeira presidência semestral.

Costa, de gravata e máscara azuis tal como o belga que substitui em 2019 o polaco Donald Tusk, voltou a enumerar as três prioridades desta presidência europeia, a quarta já assumida pelo país: "Recuperação económica, desenvolvimento do pilar social da UE, aumento da autonomia estratégica da Europa."

Tendo recebido a 1 de janeiro o testemunho da Alemanha e tendo de o passar de 30 de junho para 1 de julho à Eslovénia, Costa aproveitou para dizer que estas presidências da UE são uma maratona como que feita com estafetas; e acrescentou ser uma honra ter sucedido à chanceler Angela Merkel.

Sempre sorridente com Costa, pedindo até desculpa à imprensa por não falar português com o à-vontade com que o anfitrião socialista fala francês, Michel, um liberal, declarou estar em sintonia com as prioridades da presidência portuguesa: "O relançamento da Europa será verde e será digital." E em resposta a um eventual conselho que daria a Costa, declarou que este "não precisa - é um político muito experiente". Tratando-o pelo primeiro nome, acrescentou que "António é um político com grande capacidade de atingir os objetivos".

Michel, que pode ser descrito como um campeão do eurotimismo e é filho de um antigo comissário europeu, relembrou que o pilar social, tal como o digital, defendidos por Costa, são decisivos para o projeto europeu, pois a UE "é muito mais do que um projeto financeiro ou do que um projeto económico".

Sempre a enfatizar o sucesso da negociação conjunta das vacinas para todos os Estados-membros, "uma grande decisão", Costa reafirmou, por seu lado, que na vacinação tal como no resto "ninguém deve ficar para trás". E alertou mesmo para o facto de "o medo ser aquilo que mais alimenta o populismo", seja o medo de não ser vacinado seja o medo de a economia digital dar o trabalho antes a um robô seja ainda o medo de o combate ao aquecimento global afetar indústrias. A Europa tem de ganhar a confiança da população e merece-a, foi a mensagem partilhada pelo português e pelo belga.

O Porto acolherá, a 7 de maio, no edifício da Alfândega, uma cimeira social e no dia seguinte o conselho informal de chefes de governo e de Estado tentará uma declaração de compromisso sobre o tema.

Numa presidência atípica, muito condicionada pela covid-19, as perguntas de jornalistas estrangeiros chegaram por zoom. Na organização portuguesa, há quem lamente a ausência dessa parte humana, de repórteres estrangeiros e dignitários de visita a Portugal, que ajudava a promover o país lá fora. Mas Michel elogiou o sol invernal de Lisboa.

Sinal de como os tempos são especiais, passar por um detetor de metais como se fosse embarcar num voo é exigência para entrar no CCB em dia especial, como o é desinfetar as mãos com gel antes de se tirar o cinto.

Sobre o pacote de ajudas económicas, Costa mostrou-se otimista de que tudo vai avançar rapidamente tanto nos parlamentos nacionais como no europeu. Falou ainda, no âmbito do papel da Europa no mundo, da importância da cimeira com a Índia, da ligação a África e das novas relações transatlânticas com os EUA, a partir de 20 de janeiro presididos por Biden. Em foco esteve ainda a necessidade de desenvolver a nova relação com o Reino Unido, uma curtíssima referência ao Brexit, que no início de 2020 ameaçava ser o grande desafio para a Europa.

A par da política, fado, muito fado, no Grande Auditório do CCB, com filas a meio da tarde para levantar convites para ouvir Camané, Ana Moura, Carminho e a guitarrista Marta Pereira da Costa.

Costa fechou o dia com um jantar em São Bento com Charles Michel. Como noutras ocasiões, o primeiro-ministro convidou um chef para mostrar a excelência da gastronomia portuguesa. Desta vez, coube a José Avilez, que cozinhou uma sopa de sapateira e robalo com amêijoas.

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